Cautela com o dinheiro

Bruno Rosa

Liane Thedim

Luciana Casemiro

19/05/2017

 

 

Com turbulência nos mercados, analistas sugerem aplicações conservadoras e redução de gastos

O furacão que varreu os mercados financeiros no Brasil ontem, diante da revelação de que o empresário Joesley Batista, do grupo JBS, gravou o presidente da República, Michel Temer, dando aval para comprar o silêncio do deputado Eduardo Cunha (PMDB), trouxe apreensão para investidores e consumidores. A Bolsa despencou, o dólar disparou e os juros, agora, tendem a cair menos. Nessas horas, alertam especialistas em finanças pessoais, o mais importante é o investidor manter a calma e buscar aplicações mais conservadoras. As incertezas com a economia, que ampliam o risco de desemprego, pedem cautela também na hora de consumir e ainda mais rigor para fazer uma poupança para casos de infortúnio. E quem tem planos de compra em moeda estrangeira, como uma viagem ao exterior nas férias, por exemplo, terá que se planejar.

Muitos brasileiros estão, neste momento, resgatando recursos das contas inativas do FGTS. A Caixa Econômica Federal já liberou mais de R$ 24 bilhões. Para Fernando Souza, especialista em finanças, o ideal é aumentar a reserva de emergência financeira. Ele diz que esse é um bom destino para os recursos das contas inativas do FGTS, cujo calendário de pagamento vai até julho deste ano.

— Quem está com medo de perder o emprego tem de segurar o dinheiro. É importante aumentar a reserva financeira nesse momento e evitar gastos desnecessários. As empresas tendem a segurar os grandes investimentos, pois ninguém sabe ainda o real impacto da crise atual e até quando vai durar — afirma ele.

 

NÃO É HORA DE MUDAR APLICAÇÕES

Para quem já tem aplicações, Sérgio Caetano Leite, sócio da RJI Corretora, diz que a calma é a melhor atitude para o momento atual, de incertezas.

— Não é hora de vender, de sair dos investimentos. Também não é hora de contratar dívida. Se ia trocar o sofá, a menos que ele esteja furado e não dê mais para usar, adie essa compra. As ações vão cair e voltar, os juros vão subir e voltar, é preciso ter calma — orientou Leite.

Quem tem dinheiro disponível para um novo investimento — como, por exemplo, dos recursos das contas do FGTS — especialistas sugerem as aplicações mais conservadoras, como poupança, fundos de renda fixa e CDBs (os Certificados de Depósito Bancário). Myrian Lund, planejadora financeira da Lund Finanças e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), disse que, com o aumento da taxa de juros futuros no mercado financeiro, o cliente deve optar por fundos de renda fixa DI ou CDBs:

— Essas opções são as que colocam o investidor na zona de conforto. Por isso, são mais indicadas para quem pode precisar dos recursos a curto prazo. De olho no investimento de longo prazo, devese optar por fundos de renda fixa com títulos prefixados, como os que são atrelados à inflação e a outros índices. Esses fundos estão sujeitos às oscilações do mercado, como o aumento de juros futuros que estamos vendo. Então, sair nesse momento pode acarretar em perdas financeiras.

Especialistas lembram que a caderneta de poupança só vale a pena se os fundos de renda fixa DI ou os CDBs estiverem com um rendimento abaixo de 85% do chamado CDI (que é atrelado à taxa Selic). Por isso, o ideal, dizem, é recorrer a uma pesquisa de taxas com o gerente do banco.

Ontem, o Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas da Bolsa, caiu 8,79%, o maior tombo em nove anos. A cotação da moeda americana chegou a superar os R$ 4 nas casas de câmbio. O dólar comercial e o euro subiram mais de 8%,a R$ 3,39 e R$ 3,76, respectivamente.

Quem já marcou uma viagem ao exterior nas férias de julho e ainda não comprou moeda estrangeira deve se programar. Segundo Myrian, quem tem passagem comprada deve adquirir dólar ou euro logo. Isso porque, explica, a incerteza na economia vai trazer mais volatilidade aos mercados, o que pode elevar novamente a cotação da moeda americana.

— Com essas altas, a cotação das moedas não vai descer tão fácil. Por isso, para quem vai viajar a curto prazo, o ideal é comprar logo moeda estrangeira. O que vamos ter daqui para frente é volatilidade, por conta da incerteza. Agora, quem vai viajar mais para o fim do ano ainda tem tempo. Pode comprar moeda aos poucos como forma de diluir o risco — destacou Myrian.

 

PARA VIAGEM, COMPRA DE DÓLARES AOS POUCOS

Já Alexandre Fialho, diretor da corretora Cotação, afirma que, quem tem viagem marcada, deve parcelar a compra de moeda:

— O melhor é dividir o tempo que falta para a viagem em três partes e fazer as compras nesses períodos. Isso não garante a melhor cotação, mas, pelo menos, não se vai comprar tudo pela pior.

Os consultores financeiros lembram que é preciso rever os gastos futuros para quem está inseguro com a manutenção do emprego. O planejador financeiro Mauro Calil, fundador do site Academia do Dinheiro, diz que não é hora de movimentos bruscos e recomenda cautela, já que há risco de alta da inflação e do desemprego:

— Atualmente, quem está desempregado não está consumindo mesmo, e quem está empregado está se comportando como se estivesse desempregado. É um momento de consumo básico, sem luxo, em que se deve buscar formar poupança.

O planejador financeiro Thiago Nigro, criador do canal O Primo Rico, do YouTube, diz que é comum o investidor ficar assustado em momentos de crise e reagir com pânico, retirando dinheiro de investimentos mais agressivos.

— Sempre que a gente é guiado pelo medo, faz burrada. Devemos ir contra o efeito manada. Quem tem dinheiro e não vai precisar dele a longo prazo pode se aproveitar e fazer ótimos negócios — afirma ele, que recomenda buscar oportunidades em ações, debêntures e fundos multimercados.

Mas ele não recomenda a compra de ações na Bolsa de Valores como negócio, exceto para quem já está acostumado a correr risco: — Tentar ser esperto nesse momento é um risco. Para quem já está na Bolsa e precisa dos recursos, o especialista Mauro Calil reforça o conselho de “esperar o maremoto passar, se tiver fôlego”:

— Se sair agora, a chance de perder dinheiro é grande.

O globo, n.30601 , 19/05/2017. Economia, p. 27