Valor econômico, v. 17, n. 4238, 19/04/2017. Política, p. A9

Cresce pressão para aliviar as regras de trabalhadores rurais

 

Raphael Di Cunto
Fabio Murakawa
Marcelo Ribeiro
Edna Simão

 

As concessões feitas pelo governo e o relator, deputado Arthur Maia (PPS-BA), na reforma da Previdência melhoraram o ânimo na Câmara para votação do projeto, com até mesmo parlamentares antes sumariamente contrários dizendo que há possibilidade de aprovar. Muitos, contudo, ainda cobram mais mudanças, como a bancada ruralista, uma das maiores do Legislativo, que quer alteração nas regras para o trabalhador rural.

"Na cabeça deles, eles acham que já cederam muito. Mas até a votação teremos mais tempo para debater", afirmou o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT). Os ruralistas, que somam mais de cem votos em plenário, querem uma distinção para a idade mínima de aposentadoria da mulher e do homem no campo, fixada em 60 anos para o homem e a mulher da agricultura familiar - hoje essa regra já vale para os trabalhadores, mas a mulher se aposenta com 55.

Além disso, cobram que os trabalhadores rurais sejam todos tratados de forma diferente dos urbanos na idade mínima. Pela proposta do relator, já suavizada, os homens terão que trabalhar até os 65 anos e as mulheres, até 62 - o governo queria, inicialmente, unificar tudo em 65 anos. Os ruralistas defendem que a regra seja 60 anos para os homens e 57 ou 58 para as mulheres.

"O homem do campo, que realmente atua na área rural, precisa de um tratamento diferente porque começa a trabalhar mais cedo na idade e também no dia a dia", afirmou Leitão que, apesar das críticas, defende que o parecer "avançou muito" e vai esvaziar o discurso dos que eram contra para manter privilégios.

Líder do PSD e também ligado aos ruralistas, o deputado Marcos Montes (MG) vai na mesma linha e afirma que, na bancada, o apoio foi maciço. "Todo mundo achou que houve evolução muito grande", disse, após reunião de cerca de 20 dos 37 parlamentares da legenda. Montes, contudo, defende que é necessário reduzir o tempo de contribuição do trabalhador rural, que o governo queria elevar para 25 anos, o relator deixou como 20 e os ruralistas querem que seja mantido em 15.

Outro ponto bastante citado é a decisão do governo e do relator de permitir o acúmulo de aposentadorias e pensões, desde que, somadas, não ultrapassem dois salários mínimos (R$ 1874,00). Caso estoure o "teto", o beneficiário terá que escolher o maior pagamento. Hoje, não há limite, mas o governo propunha que qualquer acúmulo fosse proibido.

Apesar disso, o deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), um dos escalados pelo PSDB para liderar as discussões sobre a previdência, diz que trabalhará para que o partido faça um destaque (emenda em plenário) para permitir a soma seja permitida até o teto do INSS (R$ 5.531,31). "A morte de um familiar não pode causar um rombo desses no orçamento familiar. Estão pressionando demais a classe média e obrigando que tenha filhos para sustenta-los no futuro", disse.

Líder do Solidariedade, partido ligado à Força Sindical, o deputado Aureo Lídio (RJ) afirmou que esse também é um dos pontos centrais para a sigla. "Mudou muito, falta bem pouco para o projeto estar justo", disse. Além da permissão de acúmulo até o teto do INSS, o SD quer reduzir a idade mínima do homem e da mulher para 62 anos e 60.

Já o líder do PP, deputado Arthur Lira (AL), afirmou que ocorreram até "concessões demais", como na diferenciação da idade da mulher, que não tinha, na sua opinião, apoio tão expressivo na Casa. "Já teria aprovado até com menos ajustes", afirmou. A bancada feminina, com 42 parlamentares, comemorou a redução na idade, embora defendesse uma diferença maior, de cinco anos, como é hoje.

Outro foco de resistência, os policiais civis e federais pressionaram o governo e conseguiram a redução da idade mínima para 55 anos - que será igualada a dos policiais militares quando ocorrer essa outra reforma (veja Relator abre nova rodada de concessões na PEC da Previdência). O anúncio ocorreu após quebra-quebra na Câmara com uma manifestação de policiais civis, enquanto ocorria a reunião com a bancada da bala. Essa flexibilização, porém, já levou defensores de outros grupos a aumentarem a pressão.


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Para economistas, recuos jogam pressão sobre o próximo presidente

 

Tainara Machado


Com as mudanças propostas pelo relator da reforma da Previdência na Câmara do Deputados, Arthur Maia (PPS-BA), a idade mínima de 65 anos para aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) só deve ser alcançada em 2040. Antes, o prazo de transição era de 15 anos.

A regra de transição para a idade mínima de aposentadoria é uma das principais alterações em relação ao texto original proposto pelo governo, ao lado da redução da idade mínima para mulheres e manutenção de condições especiais de aposentadoria para professores, policiais e trabalhadores rurais. O relatório será apresentado hoje.

Para Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, cerca de 65% da proposta original foi preservada, partindo dos pontos apresentados pelo relator. Para ele, o que mais diluiu o texto em relação à proposta original foi a regra de transição, que ficou mais longa.

Paulo Tafner, especialista em Previdência e professor da Universidade Cândido Mendes, pondera que o texto substitutivo eliminou um problema, que era o brusco corte etário para a regra de transição, que gerava uma descontinuidade muito grande ao excluir quem tinha menos de 45 anos, no caso das mulheres, e de 50 anos, no dos homens, da transição.

Kawall avalia que o saldo geral ainda é positivo, mas critica a opção por preservar desigualdades entre homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais, além de regras diferenciadas para professores e policiais, por exemplo.

Outro reflexo das mudanças propostas é que a redução do escopo da reforma vai "constranger o próximo presidente a enterrar a política de valorização do salário mínimo" para garantir que o teto de crescimento da despesa possa ser cumprido no curto prazo, diz. Em 2019, vence a lei que estabelece como reajuste do piso a inflação do ano anterior e a variação do PIB de dois anos antes.

Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, também considera que a reforma apresentada pelo relator aumenta a pressão sobre o próximo presidente e a importância da eleição do ano que vem. "O próximo presidente vai ter que voltar a discutir previdência nos Estados", diz. Ela esperava mais firmeza do governo. "Mas boa reforma é aquela aprovada."