Valor econômico, v. 17, n. 4238, 19/04/2017. Especial, p. A14

OAS negocia delatar ministro do STJ

 

Maíra Magro
André Guilherme Vieira

 

Nas negociações para um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR), a OAS pretende entregar pelo menos um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de outros magistrados, apurou o Valor.

A empresa já indicou mais de 20 delatores para o acordo, incluindo o ex-presidente, Léo Pinheiro, o dono do grupo, Cesar Mata Pires, além de dois filhos.

Se as negociações avançarem, será a primeira citação a um ministro do STJ nas delações da Operação Lava-Jato. Até agora, o Judiciário é o único poder que permanece intacto na operação, que já atingiu em cheio o Executivo e o Legislativo.

A OAS tem pressa para concluir as negociações por duas razões: precisa resolver a situação penal de seus executivos e encontrar uma solução para a situação financeira do grupo, atualmente em recuperação judicial.

Recentemente, a OAS teve o acordo de leniência rejeitado, no âmbito administrativo, pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União. Um acordo de leniência com o Ministério Público é visto como alternativa para que a empresa possa contratar e tomar empréstimos com bancos públicos no Brasil e no exterior. Mas para que a leniência possa sair, é preciso fechar o acordo de delação das pessoas físicas.

Apesar da pressa da empresa, na Procuradoria-Geral da República (PGR) as delações de executivos do grupo ainda figuram na posição intermediária de uma fila de acordos em negociação. Como a OAS chegou tarde - depois de Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, que já fecharam seus acordos -, o caso não é visto como prioridade neste momento em que a Lava-Jato continua cheia de novas revelações.

Em agosto do ano passado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, suspendeu as negociações com Léo Pinheiro. Ele ficou irritado com o vazamento de informações envolvendo uma citação ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Antonio Dias Toffoli, que, segundo procuradores, não traria qualquer indício de crime. A avaliação foi que o vazamento teria sido feito com a intenção de forçar o Ministério Público a aceitar o acordo nas condições de interesse dos investigados.

Desde então, a OAS teve que apresentar outros fatos que justificassem a retomada das negociações. Foram redigidos novos anexos, com resumos dos crimes e pessoas a serem delatadas.

Para serem aceitas, as delações também terão de trazer novidades em relação aos fatos já narrados pelas empreiteiras que fecharam acordos primeiro. Esse seria um dos motivos para incluir o Judiciário. Investigadores suspeitam que as irregularidades narradas pelo empresariado também contavam, em muitos casos, com a participação de magistrados.

Atualmente, Léo Pinheiro já figura em uma investigação no STF envolvendo o ministro do STJ Benedito Gonçalves. O inquérito foi motivado por uma troca de mensagens encontradas no celular de Léo Pinheiro pela Polícia Federal.

O caso corre em segredo de Justiça. Segundo fontes, a delação do ex-presidente da empreiteira poderia contribuir para elucidar o caso.

As colaborações da OAS incluirão ainda relatos de irregularidades cometidas no exterior. Um dos países mencionados será o Chile, onde o grupo já é alvo de investigações pelo Ministério Público local por supostos repasses de dinheiro via caixa dois durante a campanha presidencial de 2013.

Além da pressa para fechar a leniência, Léo Pinheiro corre contra o tempo para tentar reduzir sua pena. Ele já foi condenado em segunda instância, pelo Tribunal Regional Federal (TRF) a 4ª Região, a 26 anos e sete meses de prisão pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Desde setembro, o empresário está preso preventivamente por ordem do juiz Sergio Moro. Outros executivos do grupo também já foram condenados em segunda instância.

Na primeira rodada de negociações, a OAS já havia delatado fatos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como detalhes sobre o tríplex no Guarujá (SP), pessoas envolvidas na campanha da ex-presidente Dilma Rousseff, além dos senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e José Serra (PSDB-SP).

 

 


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Palocci busca advogados especializados para fechar colaboração premiada

 

André Guilherme Vieira

 

Para fechar delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF), o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil nos governos do PT, Antônio Palocci, terá de confirmar a hipótese investigativa da Operação Lava-Jato, e confessar que atuou como operador de propinas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conforme apurou o Valor.

As negociações ainda não começaram, mas o ex-ministro já busca advogados especializados no tema.

De acordo com duas fontes ouvidas pela reportagem, será necessário que ele revele também, juntamente com a entrega de evidências de comprovação, indícios de práticas ilícitas sobre as quais teria conhecimento envolvendo bancos e instituições ligadas ao mercado financeiro. A Lava-Jato já conduz em Curitiba, em caráter sigiloso, uma investigação que poderá responsabilizar diretamente diretores e executivos de instituições bancárias por falhas nos sistemas de compliance. Tal omissão teria facilitado o assalto de políticos aos cofres da Petrobras por meio da atuação de doleiros, de acordo com uma das linhas de investigação.

Réu em duas ações penais na Justiça Federal do Paraná e alvo de diversas acusações feitas pelos delatores da Odebrecht, Palocci viu nos crescentes embates entre delegados e procuradores, que brigam pela primazia para fechar delação premiada, uma oportunidade para barganhar o melhor acordo possível para si. O ex-ministro responde criminalmente pelas supostas corrupção na contratação das 29 sondas do pré-sal e atuação em operação de compra de imóvel, pela Odebrecht, para abrigar uma nova sede para o Instituto Lula, na Vila Clementino, em São Paulo.

Acossado por diversas frentes de investigação, Palocci solicitou ao advogado que atua como correspondente de sua defesa em Curitiba, Alessandro Silvério, que procurasse o criminalista Marlus Arns, que tem experiência em delação premiada e mantém boa interlocução com os delegados da Lava-Jato.

A consulta de Palocci a Arns, por intermédio de Silvério, ocorreu na terça-feira da semana passada, em Curitiba. Arns disse que não poderia assumir mais uma causa. Ele também defende o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Palocci, então, autorizou seu advogado a procurar outros criminalistas do Paraná. Um dos nomes sugeridos foi o de Adriano Bretas, que atuou na delação premiada do doleiro Alberto Youssef.

O atual titular da defesa de Palocci nega que o ex-ministro tenha iniciado conversas informais, com PF ou MPF, para tratativas envolvendo um acordo de delação premiada.

"Não tive notícia a respeito de reunião dele com a Polícia Federal. Estou em Brasília e irei à Curitiba para me inteirar disso. Se ele realmente tiver intenção de negociar delação, aí eu vou deixar a causa", disse o criminalista José Roberto Batochio.

O ex-ministro é refratário à ideia de acusar diretamente o ex-presidente Lula. No entanto, a perspectiva de condenação com o cumprimento em regime fechado o levou a considerar a hipótese de se tornar delator, disseram pessoas próximas a Palocci. Os advogados de Lula têm negado, de forma reiterada, que o ex-presidente tenha cometido ilícitos envolvendo a Petrobras, ou que tenha se beneficiado de propinas ou benesses em quaisquer circunstâncias.


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Procuradores vão cruzar relatos para apurar omissões de empreiteiras

 

Murillo Camarotto

 

Procuradores da força-tarefa da Lava-Jato vão usar os depoimentos dos executivos da Odebrecht para identificar eventuais omissões por parte dos delatores de outras empreiteiras investigadas na operação. Caso eles tenham deixado de citar crimes considerados graves, poderão ter o acordo de delação anulado.

O Valor apurou que a força-tarefa já identificou algumas omissões, mas ainda não há diagnóstico preciso sobre a gravidade do que deixou de ser dito. Essa espécie de "acareação" entre as delações também poderá dificultar a atualização dos acordos de leniência de empresas como Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, procedimento chamado de "recall" pelos investigadores.

Segundo um procurador, a atualização dos acordos dessas empresas deverá passar pela apresentação de novos delatores. "Será mais fácil um novo colaborador assinar o acordo do que um antigo atualizar o que falou. Esses, a depender das omissões em relação ao que foi dito pela Odebrecht, estão na berlinda".

A divulgação oficial dos depoimentos da Odebrecht não deve atenuar o clima de apreensão permanente causada no mundo político por conta dos vazamentos de informações da Lava-Jato. Além do "recall" das delações, das empreiteiras, os depoimentos dos publicitários João Santana e Duda Mendonça podem vir à tona a qualquer momento, acrescentando mais lenha às labaredas que consomem Brasília.

A tendência é que os depoimentos de João Santana e Mônica Moura, já homologados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), causem um grande estrago no PT, que já foi campeão de citações na delação da Odebrecht.

Responsável pelas campanhas petistas à Presidência da República em 2006, 2010 e 2014, Santana e sua mulher foram presos em fevereiro do ano passado, sob acusação de terem recebido no exterior recursos desviados da Petrobras. Após pagar fiança, o casal foi solto seis meses depois.

Condenado a mais de oito anos de prisão pelo juiz Sérgio Moro, o marqueteiro resolveu contar o que sabia. Segundo o Valor apurou, o Ministério Público Federal (MPF) foi bastante exigente para aceitar a delação, o que leva a crer que os relatos de Santana terão grande impacto.

A atualização das delações de outras empreiteiras também é motivo de preocupação. Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa se comprometeram com o MPF a buscar internamente novos casos de corrupção para serem acrescentados aos acordos já celebrados. A delação premiada da Odebrecht surgiu como nova fonte de pesquisa para as empresas, visto que em diversas ocasiões elas atuaram em grupo.

A Andrade, por exemplo, já encaminhou novas histórias ao conhecimento dos procuradores e que os relatos foram aceitos. Com isso, o número de delatores da empresa, 11, deverá aumentar. A expectativa é que os novos depoimentos possam ser agendados em breve, devido à conclusão do mutirão da Odebrecht.

No caso da Camargo Corrêa, a expectativa é que a Lava-Jato queira resgatar suspeitas de corrupção apuradas pela Operação Castelo de Areia, de 2009, que havia identificado indícios de irregularidades em pelos menos 12 obras em São Paulo. A operação foi invalidada pela Justiça.

A retomada da delação do ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, também é aguardada com ansiedade. O acordo do executivo foi suspenso em agosto do ano passado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, devido ao vazamento de um dos assuntos tratados na fase prévia à delação. Pinheiro era íntimo dos políticos mais influentes do país.

Além das novas delações, as próximas semanas devem ser marcadas pelos desdobramentos dos depoimentos da Odebrecht. Com os pedidos de inquérito autorizados pelo ministro Edson Fachin, do STF, a Lava-Jato voltará às ruas com toda intensidade para colher as provas do que foi falado pelos 78 executivos da Odebrecht. A Polícia Federal informou que já está a postos para tocar campainhas às 6 da manhã.