Sem presença do PSDB, Temer critica abuso de autoridade

Eduardo Barretto e Junia Gama 

01/06/2017

 

 

Investigado, presidente diz que Brasil passa por ‘conflito institucional’

-BRASÍLIA- Alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Michel Temer aproveitou a posse do novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, ontem, para atacar o “abuso de autoridade” no Brasil e dizer que o país passa por “grande conflito institucional”. A cerimônia foi visivelmente esvaziada, com a presença de poucos parlamentares. A ausência de nomes do PSDB simbolizou a relação difícil com o governo.

Sem citar nomes, Temer afirmou que quem abusa da autoridade viola a lei, aderindo, assim, a um discurso do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, que, na véspera, fizera reunião para sinalizar uma pacificação da sua relação com o Planalto. Renan é autor da polêmica proposta sobre o crime de abuso de autoridade em tramitação no Congresso.

— Sempre vejo a história do chamado abuso de autoridade. Como se abusar da autoridade fosse abusar do fulano de tal que, transitória e episodicamente, ocupa um cargo de autoridade. Não é isso. Quem tem autoridade no Brasil é a lei. Portanto, abusar da autoridade é violar a lei. Daí é que você abusa da autoridade. Toda vez que alguém ultrapassa os limites legais é que está, aí, sim, abusando da autoridade — declarou Michel Temer, apelando para que haja rapidez na “recuperação da institucionalidade do país”.

No último dia 17, O GLOBO mostrou que Temer deu aval para a compra de silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha na cadeia. O presidente foi gravado pelo delator Joesley Batista, dono da JBS, em conversa no Palácio do Jaburu, à noite, fora da agenda oficial. Na semana que vem, Temer será julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no processo que pode lhe cassar o mandato. O novo ministro da Justiça, que antes comandava a Transparência, já foi integrante dessa Corte.

Também na posse, Temer pediu “paz” entre os poderes:

— Vamos deixar o Judiciário trabalhar sossegado, vamos deixar o Legislativo trabalhar em paz, vamos deixar o Executivo, convenhamos, trabalhar em paz.

Um pouco antes do discurso em que citou o abuso de autoridade, também no Palácio do Planalto, o presidente usou o lançamento do Plano Safra para reafirmar que permanecerá no cargo. Temer repetiu o que fez a ex-presidente Dilma Rousseff um ano atrás, quando lançou um Plano Safra, pouco antes da abertura do processo de impeachment, defendeu seu mandato e citou sete vezes o que qualificou como “golpe”.

— Nós vamos continuar nessa trilha. Ninguém vai impedir que nós tenhamos um impedimento dessas políticas públicas que nós estamos levando ao efeito — encerrou Temer, em uma fala confusa, atrelando sua permanência no Planalto à continuidade dos benefícios.

À exceção do ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, cujo gabinete fica no andar acima do de Temer, líderes tucanos não foram.

“VAI TER TROCO”

Apesar de ter mantido apoio ao governo, o PSDB demonstra desconforto com a relutância do presidente em discutir cenários futuros de uma saída para a crise. Chamou a atenção ainda a presença do ex-senador José Sarney que, apesar de não ter nenhum cargo, foi colocado no palco das autoridades, ao lado de Temer.

Um ministro do PMDB falou sobre o momento delicado com o PSDB. Ele relatou que a cúpula tucana foi avisada de que, se houver debandada, o partido não terá apoio algum dos peemedebistas na eventual sucessão presidencial.

— Se o PSDB for o fator desestabilizador do governo, vai ter troco lá na frente. Eles podem esquecer o apoio do PMDB na Câmara e no entorno de Temer para emplacar um nome — pontuou esse ministro.

 

O globo, n. 30614, 01/06/2017. País, p. 4