Atuação de base na Câmara ameaça reformas de Temer

Igor Gadelha e Daiene Cardoso

07/04/2017

 

 

 

Congresso. Derrotas impostas pelos deputados na análise de projetos do Planalto na Casa alertam o governo sobre futuras votações de mudanças trabalhistas e previdenciárias

 

 

O comportamento da base aliada na Câmara dos Deputados acendeu alerta para as futuras votações das principais reformas que o governo pretende aprovar neste ano, a da Previdência e a trabalhista.

Nas últimas três semanas, o Palácio do Planalto sofreu derrotas e enfrentou dificuldades para aprovar matérias impopulares na Casa.

Parlamentares dizem que esse cenário decorre da combinação de alguns fatores: a agenda impopular do governo e seus possíveis efeitos na reeleição dos deputados em 2018; problemas na articulação política na Casa e na comunicação do Planalto, além da falta de atendimento às reivindicações por cargos na administração federal.

A primeira dificuldade do governo foi registrada no dia 22 de março, com o projeto que regulamenta a terceirização. A proposta foi aprovada com um placar apertado de 231 votos a 188, menos do que os 308 votos mínimos necessários para aprovar uma emenda à Constituição, como a da reforma da Previdência.

Desde então, o governo foi derrotado ao ver aprovada, por 245 a 179, uma emenda do PT à Medida Provisória do Cartão Reforma, que obriga a União a destinar 20% do valor do programa à área rural. O governo queria manter esse porcentual em 10%, mas perdeu.

Na semana passada, o Planalto também não conseguiu alcançar os votos mínimos necessários para aprovar em segundo turno uma emenda à Constituição autorizando universidades públicas e institutos federais a cobrar por cursos de extensão e pós-graduação lato sensu (especializações).

A proposta recebeu 304 votos favoráveis e 139 contrários.

O governo vem enfrentando ainda dificuldade para aprovar o projeto que cria o Regime de Recuperação Fiscal para Estados falidos. Temendo derrota, ontem o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), adiou a votação para a próxima semana.

Deputados relatam que a agenda governista e seus efeitos em 2018 aliada à falta de uma boa articulação política são o principal fator desse novo cenário da Casa – que tem ameaçado a ideia de governo congressual que Temer costuma defender.

“Matéria indigesta não vota se não tiver interlocução. O governo só tem um articulador, que é o próprio (presidente) Michel (Temer). Os outros estão acomodados. Quantas vezes você viu um ministro articular com a bancada do seu partido aqui na Câmara?”, disse Danilo Forte (PSB-CE). “Ou descem do pedestal e afinam agenda com o Congresso ou vai ser derrota.”

 

Redes. Há relatos ainda do aumento da pressão do eleitor via redes sociais. “A maior tarefa é convencer a população”, disse o líder Efraim Filho (DEM-PB). Para o líder, há resistência do eleitorado às reformas e cobrança imediata de seus posicionamentos na internet. “As pessoas não estão informadas, não estão convencidas”, concluiu.

Deputados também dizem que a Câmara tem resistido nas medidas impopulares porque muitas vezes o Senado não as leva adiante e deixa o ônus apenas com os deputados. “Todas as broncas começam por aqui.

Você se desgasta e o Senado vai lá derruba, muda tudo ou senta em cima”, afirmou Joaquim Passarinho (PSD-PA).

Ele citou como exemplo o pacote anticorrupção, aprovado pela Câmara no fim de 2016 e que está parado no Senado, e a própria terceirização, quando deputados tiveram de votar o tema duas vezes: em 2015 e em março deste ano. Passarinho vê atuação tímida dos articuladores do Planalto. “Hoje você tem líder do governo e mais de dez vice-líderes, mas eles não aparecem no plenário aqui para defender o governo.

Se os líderes dos grandes partidos não estão defendendo o governo, como os outros parlamentares vão defender?” Além do líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o Palácio do Planalto criou a função de líder da maioria, posto ocupado atualmente pelo deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES). Tem ainda um deputado na liderança do Executivo no Congresso Nacional, no caso, André Moura (PSC-SE).

Nos bastidores, deputados relatam falta de sintonia entre os três. Procurados ontem, Aguinaldo, Lelo e Moura não foram encontrados para falar sobre o assunto.

 

Cargos

Um articulador do Planalto admitiu que a articulação “desandou um pouco” em virtude da falta de espaços para contemplar todos os partidos da base. O PTN cobra a presidência da Funasa para continuar na base. O PMDB quer mais espaço no segundo escalão.

 

EMBATES

Cartão Reforma

Governo foi derrotado na Câmara com a aprovação de emenda do PT à Medida Provisória do Cartão Reforma, que obriga a União a destinar 20% do valor do programa à área rural.

 

Terceirização

O projeto que regulamenta a terceirização foi aprovado na Câmara com um placar apertado de 231 votos a 188, sendo a primeira dificuldade do governo.

 

Uber

Interlocutores do presidente dizem que o texto que regulamenta o serviço do Uber aprovado nesta semana pelos deputados, se não for modificado pelo Senado, deve ter vetos de Michel Temer.

 

Universidades

A Câmara rejeitou a PEC que permitia às universidades públicas cobrar pelos cursos de extensão e de pós-graduação lato sensu (especializações).

_______________________________________________________________________________________________________________________

Ministro minimiza clima de insatisfação no Congresso

Carla Araújo e Tânia Monteiro

07/04/2017

 

 

 

 

Titular da Secretaria de Governo diz confiar na reforma da Previdência; Temer afirma ter ‘apoio fechado’ do Parlamento

 

 

O ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, minimizou ontem insatisfações na base aliada no Congresso e disse haver “muita confiança” na aprovação da reforma da Previdência, um dos principais pontos da agenda econômica do presidente Michel Temer.

Ao tentar destacar que a base está alinhada, Imbassahy afirmou que as votações recentes que desagradaram ao governo, como a que pode inviabilizar o serviço do Uber, são projetos com temas próprios de debate no Congresso. Interlocutores do presidente dizem que o texto aprovado nesta semana pelos deputados, se não for modificado pelo Senado, deve ter vetos de Temer.

Aliado do Planalto, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), minimizou as dificuldades.

“Até agora aprovou tudo”, disse. Segundo ele, o projeto de recuperação fiscal dos Estados não foi votado anteontem porque a votação começou tarde e a obstrução da oposição estendeu muito a sessão. Para ele, mesmo a emenda da MP do Cartão Reforma e a PEC das universidades não foram derrotas.

“Uma emenda o presidente veta e a PEC não era do governo.” Abandono. Em entrevista à Rádio Bandeirantes, Temer falou da relação com o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e sua investida para se aproximar da bancada do partido. “Não me sinto abandonado, não. Nós já propusemos coisas dificílimas no Congresso Nacional que tiveram aprovação muito expressiva”, disse, citando a PEC do Teto.

“Quando nós resolvemos cortar na própria carne, ou seja, estabelecer um teto para os gastos públicos, isso é uma emenda à Constituição que demandava 308 votos, nós tivemos 366 votos na Câmara dos Deputados, e tivemos igual porcentagem no Senado Federal”, disse o presidente. “Nós temos tido o apoio fechado do Congresso.”  Carla Araújo

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45097, 07/04/2017. Política, p. A4.