Petrobras cobra dinheiro do caso tríplex

Gustavo Schimtt e Dimitrius Dantas

08/06/2017

 

 

Estatal pede a Moro ressarcimento de valores desviados em esquema que envolveria Lula e a OAS

-SÃO PAULO- A Petrobras pediu ao juiz Sergio Moro ressarcimento dos valores pelos supostos crimes ligados ao caso do apartamento tríplex que, segundo a Lava-Jato, pertenceria ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em documento protocolado ontem na Justiça Federal de Curitiba, a Petrobras concordou parcialmente com as alegações finais do Ministério Público Federal (MPF). Na sexta-feira, procuradores da LavaJato afirmaram que a estatal sofreu prejuízos de R$ 87,6 milhões, o que seria “correspondente ao valor total da porcentagem da propina paga nos contratos da OAS com a estatal”. Os procuradores pediram que Lula devolva o dinheiro aos cofres da empresa.

Na petição, a Petrobras solicita ainda que seja “fixado um valor mínimo de reparação de danos em favor da empresa”, com a necessária correção monetária e incidência de juros. A estatal, porém, não fala em valores.

“Não obstante e por fim, no que tange ao perdimento dos bens e valores provenientes do crime, requer seja o produto revertido. Assim, é necessário que seja dada a correta destinação do valor, garantindo o ressarcimento da peticionária pelos danos suportados, de forma a minimizar seus prejuízos”, escreveu a defesa da estatal.

Moro está julgando o caso em primeira instância e essa é a última fase para que a defesa e a acusação possam apresentar argumentos para a condenação ou absolvição de Lula antes do julgamento de Moro. A defesa tem até o dia 20 para entregar suas alegações antes da sentença do juiz da Lava-Jato, que pode ocorrer ainda este mês.

O MPF alega que os valores foram repassados a Lula pela OAS por meio da reforma do apartamento tríplex no Guarujá (SP). Ele nega as acusações.

Em depoimento a Moro no dia 10 de maio em Curitiba, Lula admitiu ter visitado o tríplex em fevereiro de 2014 acompanhado da ex-primeira-dama Marisa Letícia. Lembrou, no entanto, que o imóvel nunca foi adquirido e que não há provas que comprovem ser ele o proprietário do apartamento.

COMPRA DE INSTITUTO SAIU DE CAIXA 1

Em outra ação na qual Lula é réu em Curitiba, Sergio Moro ouviu ontem três delatores da Odebrecht como testemunhas de acusação contra o petista. No processo, o ex-presidente é acusado pela LavaJato de receber como propina da empreiteira um terreno onde seria construída a nova sede do Instituto Lula e um imóvel vizinho ao apartamento do petista, em São Bernardo do Campo. Lula também nega essas acusações.

Responsável pelo setor de operações Estruturadas da empresa, o chamado departamento de propina, o delator Hilberto Mascarenhas afirmou a Moro que a Odebrecht comprou um terreno para o Instituto Lula com recursos do caixa oficial. De acordo com Mascarenhas, apesar do dinheiro ter saído da tesouraria da empreiteira, o valor de R$ 12,4 milhões teria sido debitado da planilha especial “Itália”.

Mascarenhas disse ainda que Marcelo Odebrecht determinou que fosse feito o débito na conta Amigo — codinome que fazia referência a Lula — no crédito de R$ 200 milhões que a empresa teria acordado com o PT.

— Os recursos não saíram desse caixa meu. Os recursos saíram do caixa 1 da empresa, comprando um terreno. Mas, como não tinha como debitar ao interessado, foi debitado aqui. Ou melhor, foi reduzido o valor do crédito que eles (PT) tinham —disse o delator. — Você não compra um terreno com recursos em espécie.

Nas delações da empreiteira, ex-executivos já haviam confirmaram aos investigadores que a empresa fazia pagamentos de propina por meio de doações oficiais.

O delator também reafirmou a Moro que os codinomes nas planilhas de propina da empresa intitulados como Amigo, Italiano e Pós-Itália se referem a Lula e aos ex-ministros Antonio Palocci e Guido Mantega, respectivamente.

Além de Mascarenhas, também foram ouvidos ex-executivos Márcio Faria e Rogério Araújo. Faria reafirmou que parte da propina paga ao ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco era transferida ao PT:

— Via de regra, quando os pagamentos eram destinados à diretoria de Serviço a gente pagava o Pedro Barusco. Ele mencionava que metade era para o que ele chamava de casa e o restante ao Partido dos Trabalhadores.

Araújo contou na audiência que sua função era fazer a interlocução da empreiteira com os diretores e gerentes da Petrobras, o que incluía a negociação de propinas. Araújo disse que sempre atuou na Petrobras pela empreiteira e percebeu que, após a chegada do PT ao poder, houve um processo de politização da estatal.

— Quando o PT assumiu, (a Petrobras) ficou mais politizada — disse.

DEFESA DE LULA NEGA CRIMES

Araújo afirmou que fazia acordos de propinas com funcionários da Petrobras, como o ex-diretor da área de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, e o ex-gerente executivo Pedro Barusco, mas negou que já tenha tratado com políticos. Para Araújo, a cobrança de propinas tornou-se a regra do jogo dentro da estatal. Ele relatou pagamentos de vantagens indevidas nos contratos da Refinaria Abreu e Lima, Comperj e nas plataformas P59 e P60:

— Tornou-se uma ação sistêmica. Depois a coisa se infiltrou até para os gerentes de baixo.

Lula responde pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Além dele, outras sete pessoas também são rés na ação.

Em nota, o advogado Cristiano Zanin Martins, responsável pela defesa de Lula, disse ontem que os depoimentos dos delatores da Odebrecht que o petista nunca teve a posse ou propriedade do imóvel atribuído ao Instituto Lula.

Sobre o pedido de ressarcimento feito pela Petrobras, Zanin disse que as 73 testemunhas ouvidas na ação do tríplex afastaram a participação de Lula em qualquer ato ilícito na estatal. Afirmou ainda que a Petrobras foi auditada pelas maiores instituições financeiras e escritórios de advocacia do país e que estes não identificaram qualquer ato de corrupção, muito menos com o conhecimento de Lula.

 

O globo, n. 30621, 08/06/2017. País, p. 10