O maior naco das economias dispensadas está na mudança nas regras de transição. O pedágio de 50% para homens acima de 50 anos e mulheres acima dos 45 anos foi trocado por outro de 30%, em uma escala gradual de idades que termina por chegar à idade mínima de 65 anos apenas em 2038. Com isso, o corte de gastos previstos com esse item, da ordem de R$ 500 bilhões em 10 anos, reduziu-se à metade, segundo Nilson Teixeira, economista chefe do Credit Suisse (Valor, 18 de abril). Além disso, houve acertos para não igualar a idade mínima de policiais, professores e trabalhadores rurais, alterações na regra de cálculo dos benefícios gerais e de pagamentos das pensões por morte, assim como nas regras de acesso ao Benefício de Prestação Continuada.
Os cálculos sobre a potência remanescente da reforma são complexos. Ainda que não tenha fixado um limite claro, o governo implicitamente admitiu que um recuo de 20% a 30% nos ganhos com a proposta original seria aceitável. Por suas contas, ele conseguiu manter essa margem, ao assegurar, se o projeto não for mais mexido, 77% da economia prevista - R$ 630 bilhões ante os R$ 818 bilhões previstos.
As estimativas do setor privado indicam que as economias serão bem menores. Para os economistas do Itaú Unibanco, a contenção de despesas caiu a 57%, ou R$ 431 bilhões dos R$ 755 bilhões originais. Outros bancos colocam a margem de recuo acima dos 30%.
Em períodos de crescimento e normalidade política, a reforma da previdência já é um osso duro de roer no Congresso. Agora, em meio à recuperação da pior recessão da história e ao maior escândalo de corrupção da era republicana, obter uma reforma que pare de pé e ajude a conter a deterioração das contas públicas será um feito.
O risco de novos ajustes na reforma não é desprezível, diante das forças contraditórias desencadeadas pela Operação Lava-Jato. O governo, corretamente, quer e precisa fugir do imobilismo, para tentar desarmar a bomba do déficit público herdado, por meio das reformas, entre elas também a trabalhista e a tributária. A aposta é que quanto mais sinais corretos forem dados para a economia, a recuperação virá mais rapidamente, aliviando parte do enorme peso do descrédito que Congresso e Executivo carregam nas costas. Por outro lado, com a Justiça em seu encalço e desmoralizados, dezenas de parlamentares têm na reeleição a única chance de conservar o foro privilegiado e relutam em assinar em baixo de medidas a curto prazo impopulares.
A conjuntura já desfez os planos ideais do governo. O projeto não sairá como concebido e a votação provavelmente não ocorrerá com a rapidez e a facilidade previstas. A articulação política terá de ser reforçada para escapar de armadilhas como a em que caiu anteontem o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ao colocar em votação e perder o pedido de urgência para a reforma tributária, ao fim de um dia em que o presidente Temer reuniu centenas de congressistas em perorações pelas reformas.
Da forma como ficou a reforma, o déficit da previdência se estabilizará, desde que o salário mínimo apenas acompanhe a inflação, avaliam os economistas do Itaú. O teto de gastos voltará a ser pressionado em um par de anos, mas até lá é possível que alguns impostos tenham sido aumentados. Se o teto ruir, a solvência do Estado voltará a ser colocada em questão. O Brasil é o país emergente mais endividado, com dívida bruta que atingirá 81,2% do PIB este ano, segundo o FMI. Ainda que tudo dê certo, essa dívida continuará crescendo por mais alguns anos. Deixar de contê-la agora com o ajuste da previdência será um desastre anunciado.