Título: De Franco, a face heroica da tragédia
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 19/01/2012, Mundo, p. 18

Eu não sou o herói. Não fiz mais do que o meu dever" Gregorio de Falco, chefe da Guarda Costeira de Livorno

Sua frase "Volte a bordo!" já estampa camisetas na Itália. Nas ferramentas sociais da internet, ele é exaltado como herói. Os jornais da Itália agradecem seu gesto. No entanto, Andrea Gori, porta-voz da Guarda Costeira da cidade de Livorno, afirmou ao Correio que o colega Gregorio de Falco — chefe da Capitania dos Portos da cidade situada na Toscana — estranhou a reação da opinião pública. "Ele cumpriu com seu trabalho e está assustado", disse. Na madrugada de sábado, Gregorio protagonizou a conversa telefônica mais ouvida em todo mundo. Nela, Francesco Schettino, comandante do transatlântico Costa Concordia, reclama que "é noite" e se recusa a retornar ao navio em pique. Sem disfarçar a ira e a indignação, Gregorio grita: "Volte a bordo, p...! (...) O que você quer fazer? Quer ir para casa?".

Para Gori, qualquer pessoa na função de Gregorio teria feito o mesmo. "Como dizemos aqui na Itália, ele é um homem feito de um pedaço só, um homem de mármore", brinca. "Gregorio sempre tem uma palavra por todos. Se alguém está com problemas, ele sempre tem interesse pelos colegas." O porta-voz conta que conheceu o colega em 2009 — Gregorio já tinha 16 anos de Guarda Costeira. O jornal Il Corriere della Sera elogiou a postura do funcionário do governo e traçou um paralelo entre ele e Schettino. "Dois homens, dois marinheiros provenientes da Campânia (região sul), duas histórias, uma que nos humilha e outra que tenta nos redimir. Obrigado, comandante De Falco, nosso país precisa de pessoas como você", escreveu. O principal diário do país considerou que os dois homens encarnam "as duas almas da Itália".

O Correio tentou entrar em contato com Schettino, mas foi informado por Gori que o amigo estava auxiliando nas buscas ao redor do Costa Concordia. Avesso à publicidade, Gregorio foi breve ao falar com jornalistas. "Eu não sou o herói. Não fiz mais do que o meu dever. Meu trabalho é ajudar, é por isso que eu gritei naquela noite", disse. Até as 19h de ontem, 16.488 pessoas curtiam a página Gregorio De Falco, no site de relacionamentos Facebook. "Não é um herói, mas ele fez o telefonema cheio de paixão, habilidade e senso de responsabilidade", escreveu um internauta. "Nesses dias, encontrar um homem, um oficial da Marinha como De Falco, me faz crer que nem tudo está perdido. Obrigado, comandante, o senhor é uma honra para toda a Itália", postou outro.

O jornal La Stampa preferiu dosar a notícia com humor. "Um fanfarrão, perfeito para entrar no (reality show) Ilha dos Famosos, que tem ocupado o espaço deixado vago pelo ex-chefe de governo Silvio Berlusconi", afirmou. "Bronzeado, de cabelo penteado e com (óculos) Ray-Ban, que sabe as regras, mas está habituado a não cumpri-las", definiu o jornal de esquerda Il Fato Quotidiano, que comparou o comandante ao ex-premiê. Por outro lado, Schettino tem sido cada vez mais chamado de "capitão covarde" e tratado como uma criança que chora "no barco todo molhado". (RC)