Chico Otavio e Daniel Biasetto
02/06/2017
Com a prisão ontem de Marco Antônio de Luca pela Polícia Federal em novo desdobramento da Operação Lava-Jato, o séquito de Sérgio Cabral no que ficou conhecido como a “República de Mangaratiba” está perto da bancarrota. Levantamento feito pelo GLOBO, em novembro do ano passado, mostrava que antes da prisão da máfia comandada pelo ex-governador, ao menos oito pessoas, entre empresários, gestores públicos e políticos ligados ao governo Cabral, compraram ou alugaram casas no Condomínio Portobello, onde fica a aprazível Praia de São Braz, a 110 quilômetros do Rio, às margens da BR-101.
Na época da pesquisa, a lista era composta por Cabral, dois secretários estaduais e cinco empresários.
Passado o furação da Operação Calicute, que levou para cadeia Cabral, sua mulher, Adriana Ancelmo, e seus assessores mais próximos, acusados de participar de um esquema criminoso de corrupção que levou o Estado do Rio à falência, apenas dois personagens da “República de Mangaratiba” ainda não foram acordados com os agentes da PF à sua porta: Georges Sadala, ex-dono do serviço “Poupa Tempo”, e Arthur Cesar de Menezes Soares Filho, o “Rei Arthur”, dono do Grupo Facility, um dos maiores prestadores de serviços do governo fluminense desde a gestão de Anthony Garotinho.
SUBORNO A AGENTES PÚBLICOS
O “Rei Arthur” tem contra ele ao menos uma investigação sobre participação no esquema de Cabral. Ele e seu irmão Luiz Roberto de Menezes Soares são suspeitos de pagar suborno a agentes públicos para conseguir contratos com o estado em prestação de serviços ligados ao ramo da alimentação, entre outros.
Entre os assessores, Cabral dividia a quadra de vôlei e outros momentos de lazer em Mangaratiba com os exsecretários Wilson Carlos (Governo) e Sérgio Côrtes (Saúde), ambos presos.
Entre os empreiteiros vizinhos do exgovernador no condomínio Portobello, estavam Benedicto Júnior, então presidente da Odebrecht Infraestrutura e um dos principais delatores da empreiteira, e Fernando Cavendish, da Delta Construções. Os dois estão em prisão domiciliar.
Da posse de Cabral no governo fluminense, em janeiro de 2007, até a passagem do cargo para Luiz Fernando Pezão, em abril de 2014, o Portobello foi ponto de encontro entre gestores públicos e empreiteiros com contratos de obras e de prestação de serviços com o estado. Procurados, eles afirmaram que, nos momentos de lazer com Cabral, não misturavam os interesses públicos e privados.
NOITES DE PIZZAS E VINHOS
Depois que Cabral entrou em declínio e os boatos de que era alvo de investigações começaram a crescer, todos praticamente desapareceram. Cavendish foi o primeiro a se afastar. Atingido por denúncias que o ligaram ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, foi praticamente excluído do grupo e vendeu a casa. Wilson Carlos devolveu a sua, que diz ter sido alugada. Os demais deixaram de frequentar a casa do ex-governador, principalmente as disputadas noites de pizzas e vinhos. Na fase de ouro, um convite para um evento deste era sinal de prestígio.
A Praia de São Braz, onde fica o imóvel, faz parte da História da ocupação do Rio de Janeiro. De acordo com os historiadores, em 1619 o então governador do Rio de Janeiro, Martim de Sá, mandou vir de Porto Seguro índios tupiniquins já catequizados para, com os jesuítas e seu filho Salvador de Sá, estabelecer aldeamentos na região.
O proprietário do Portobello Resort, Carlos Borges, é amigo de Cabral e cliente de Adriana Ancelmo e de Carlos Miranda, apontado como principal operador de Cabral. O empresário pagou à exprimeira-dama R$ 2,56 milhões em honorários, por serviços prestados para o resort e para o hotel Portobello. Durante a Calicute, ele foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento, mas não chegou a ser preso. Borges foi denunciado pelos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Ontem pela manhã, agentes da PF “visitaram” novamente o condomínio, desta vez na casa de um novo personagem. Para completar o álbum, agora só faltam duas figurinhas.
O globo, n. 30615, 02/06/2017. País, p. 6