Juiz proíbe venda de frigoríficos da JBS no Mercosul para a Minerva

Manoel Ventura

Rennan Setti

22/06/2017

 

 

Operação de US$ 300 milhões foi anunciada este mês. Empresa vai recorrer
 O juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, proibiu a venda dos frigoríficos da JBS no Mercosul para a concorrente Minerva. A operação, de US$ 300 milhões, foi anunciada no início deste mês. Endividada, a JBS apresentou na última terça-feira um plano de desinvestimento para levantar R$ 6 bilhões, que inclui sua participação na Vigor, além de parte de suas operações na Europa e nos Estados Unidos. O objetivo é equacionar as contas e fazer frente ao volume de dívidas de curto prazo. A empresa informou ontem que vai recorrer da decisão que proíbe a venda dos frigoríficos para a Minerva.

Na avaliação do magistrado, a venda de ativos pode prejudicar o esclarecimento dos fatos denunciados na delação premiada dos donos da JBS. O juiz Ricardo Leite é o responsável pela Operação Bullish, que investiga supostas irregularidades nos aportes feitos pelo BNDES na empresa.

O Ministério Público Federal (MPF) havia concordado com o pedido dos irmãos Batista para que a Justiça liberasse a venda dos ativos. O juiz entendeu, no entanto, que seria “prematuro” liberar a venda dos frigoríficos. E que ainda não foi possível apontar o elo entre os valores repassados a “ocupantes de cargos eletivos (incluindo ministros de estado)” e os aportes do BNDES na aquisição de várias empresas.

“Entendo prematura qualquer decisão judicial de liberar a venda de ações requerida, bem como das medidas cautelares reais. Isto porque até o momento há fragilidade das provas apresentadas e que envolvem o repasse de valores a inúmeros políticos detentores de foro privilegiado”, escreveu o juiz na decisão. Em outro trecho, ele acrescenta que “a colaboração premiada não se esgota apenas em depoimentos, havendo necessidade de apresentação de provas idôneas”.

Na operação anunciada no início do mês, a JBS acertou a venda da totalidade das ações que detinha nas operações de carne bovina em Argentina, Paraguai e Uruguai às empresas Pul Argentina SA, Frigomerc SA e Pulsa SA, controladas pela Minerva. Ainda caberia ao Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade) dar o aval à operação.

Na avaliação do mercado, a venda de ativos da companhia é essencial. A JBS, em março, tinha dívida líquida de R$ 47,8 bilhões. A dívida bruta chegava a R$ 58,6 bilhões, sendo 31% com vencimento em 12 meses.

 

‘VULNERÁVEL EM VÁRIAS FRENTES’

Ricardo Leite ressalta na decisão que o acordo de delação ainda será analisado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), que poderá mudálo. Para o juiz, os delatores não apresentaram nenhuma prova à Justiça Federal sobre a atuação da JBS no BNDES.

“O repasse de recursos a membros do Poder Executivo e Legislativo, e mais especificamente ao então ministro Guido Mantega, não foram capazes de elucidar pormenores referentes à transferência de recursos à JBS para aquisição das empresas Smithfield, National Beef, Pilgrim’s, Tasman Group e Frigorífico Bertin, conforme laudo pericial”, disse o juiz.

O juiz Ricardo Leite disse ainda que é “indispensável” o depoimento do presidente do BNDES e do procurador geral.

Apesar da decisão da Justiça, as ações da JBS subiram 5,32% na B3 (antiga Bovespa), a R$ 6,33. Foi a primeira alta após nove pregões de queda, nos quais os papéis da companhia acumularam desvalorização de 17,5%.

— A valorização dos papéis hoje (ontem) foi resultado de uma correção de preço após tantas quedas. Além disso, os tombos recentes já incorporavam, em parte, a expectativa com relação às recentes notícias negativas para a companhia, como o bloqueio à venda de ativos para a Minerva — afirmou Raphael Figueredo, da Clear Corretora.

Segundo o analista, o plano de venda de ativos apresentado esta semana pela JBS não foi inviabilizado pela decisão judicial, mas pode ser prejudicado:

— A decisão não breca o processo. O que pode acontecer é que a venda não atinja o valor almejado, o que é ruim para a recuperação da companhia. Mas não há dúvida de que a venda desses ativos é um dos únicos caminhos que a empresa tem. O problema da JBS é que ela está vulnerável em várias frentes. É na CVM, é na Justiça, é nos EUA... Isso dificulta traçar um cenário.

Segundo Luiz Roberto Monteiro, operador da corretora Renascença, também pode ter influenciado na alta de ontem relatório do banco UBS, que estima que o papel tem potencial para atingir R$ 11,80 dentro de 12 meses, quase o dobro do que vale hoje. O banco, porém, manteve a classificação “neutra” com relação à empresa, diante dos obstáculos que ela enfrenta.

 

O globo, n.30635 , 22/06/2017. ECONOMIA, p. 18