O Estado de São Paulo, n. 45096, 06/04/2017.  Política, p. A6

Jucá tenta alterar PEC do fim do foro

Senador apresenta emendas que propõem manutenção da prerrogativa a autoridades ao contrário do que defende proposta original de autor

Por: Julia Lindner

 

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), apresentou anteontem à noite duas emendas para atenuar a proposta que extingue o fim do foro privilegiado para todas as autoridades por crimes comuns. O relator da proposta na Casa, senador Randolfe Rodrigues (Rede- AP), no entanto, disse que vai rejeitar as propostas de Jucá.

Em uma delas, Jucá mantém o Supremo Tribunal Federal (STF) como responsável pelas decisões sobre o recebimento de denúncia e a autorização de inquérito policial envolvendo o presidente da República, ministros de Estado, deputados e senadores, além dos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ministros dos tribunais superiores e o procurador- geral da República. Na prática, a Suprema Corte continua como um “filtro” para os processos das autoridade Em seu texto, Jucá sugere ainda que o inquérito policial sobre as autoridades deve ser concluído em até 180 dias, com prorrogação por igual período uma única vez. Já a denúncia poderá ser oferecida em até 45 dias após a conclusão do inquérito, sob pena de arquivamento.

No documento, Jucá justifica que a sua emenda busca “assegurar a estabilidade do desempenho de funções estatais essenciais”.

Na outra emenda, ele sugere que a prerrogativa do foro seja mantida para os chefes dos Três Poderes, o presidente da República, da Câmara, do Senado e do STF. Dessa forma, eles continuariam sendo processados e julgados pelo STF. Segundo o senador, o objetivo é assegurar a independência e harmonia entre Poderes.

“Não se mostra razoável as autoridades máximas da República serem submetidas a julgamento perante as primeiras instâncias.

Por meio de tal sistemática, pode-se gerar grande instabilidade institucional”, afirma o documento.

O relator Randolfe Rodrigues considera que a sugestão de Jucá mantém a prerrogativa de foro, além de invadir competências do Judiciário. Das seis emendas apresentadas ao texto por senadores nos últimos dias, Randolfe adiantou que vai aceitar somente a do senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB). O tucano sugere que a revisão constitucional para extinguir o foro privilegiado seja feita no artigo 5.º da Constituição, de forma a se tornar uma cláusula pétrea – assim, não poderá ser modificada futuramente.

 

Fluxo. Anteontem, a proposta do fim do foro, de autoria do senador Alvaro Dias (PV-PR), voltou para a análise da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. O texto original determina o fim do foro para todas as autoridades brasileiras, inclusive para o presidente da República.

Na ocasião, os senadores aprovaram um requerimento para que a matéria passe a tramitar em conjunto com outra proposta de emenda constitucional (PEC) do senador Acir Gurgacz (PDT-RO), que acaba com o foro em casos de crime contra a administração pública, lavagem de bens, valores decorrente de crime contra a administração pública e crime hediondo.

Por se tratar de uma PEC, as emendas e o pedido de junção apresentados precisam ser apreciadas pela CCJ. No sistema do colegiado, contudo, as duas propostas sobre foro ainda constam como “aguardando designação do relator”. O presidente do colegiado, Edison Lobão (PMDB-MA), garantiu que vai manter Randolfe no posto.

 

Debate. Jucá sugere que inquéritos policiais sobre autoridades sejam concluídos em 180 dias prorrogáveis por igual período

 

PARA LEMBRAR

Contra ‘suruba selecionada’

Alvo de ao menos dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) relativos à Operação Lava Jato, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) afirmou em fevereiro deste ano que foro privilegiado não poderia ser “suruba selecionada”. “Se acabar o foro, é para todo mundo. Suruba é suruba. Aí é todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada”, disse ao Broadcast, serviço de notícia em tempo real do Grupo Estado. “Uma regra para todo mundo para mim não tem problema”, acrescentou o senador. Um dia depois, Jucá se retratou, alegando haver citado a música da banda Mamonas Assassinas que cita o termo.

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CCJ aprova aumento do nº de deputados em 7 Estados

Por: Erich Decat / Julia Lindner

 

Integrantes da Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovaram ontem, por unanimidade, projeto que redefine o número de cadeiras na Câmara destinadas para cada Estado e o Distrito Federal. O texto segue para o plenário da Casa.

De acordo com a proposta, o número de deputados será mantido em 513, mas alguns Estados terão mudanças no número de cadeiras. As alterações levam em conta, entre outros critérios, os Quocientes Populacionais Nacional e Estaduais e têm como base a atualização estatística demográfica da população dos Estados e do Distrito Federal.

Segundo relatório apresentado pelo senador Antônio Anastásia (PSDB-MG), sete Estados poderão ter bancada maior a partir de 2019. O Pará passaria a ter quatro deputados a mais; Amazonas e Minas Gerais ganhariam duas cadeiras; Bahia, Ceará, Santa Catarina e Rio Grande do Norte ficariam com mais um deputado.

Em contrapartida, sete Estados deverão ter a bancada reduzida: Rio perderia três cadeiras; Rio Grande do Sul, Paraíba e Piauí, duas cada, enquanto Paraná, Pernambuco e Alagoas ficariam com um deputado a menos.

De acordo com o projeto, os outros Estados não perderiam nem ganhariam vagas. “É uma anomalia que estamos corrigindo.

Espero que, daqui para frente, seja feito da forma como a Constituição determina: um ano antes de cada eleição seja revista a proporcionalidade”, defendeu o autor da proposta, Flexa Ribeiro (PSDB-PA). / ERICH DECAT e J.L

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Agência aluga e reforma imóvel de Lira com gasto de R$ 2 mi

TCU e PGR questionam transação comercial realizada em prédio de senador que no final foi dispensado pela ABDI

Por: Fábio Fabrini / Lu Aiko Otta

 

O aluguel de um imóvel no centro da capital federal pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) em 2015, durante a gestão de Alessandro Teixeira, chamou a atenção do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Procuradoria- Geral da República (PGR) por supostas irregularidades no contrato. O imóvel pertence ao senador Raimundo Lira (PMDB-PB).

Os dois órgãos de controle fizeram questionamentos informais ao atual presidente da agência, Luiz Augusto Souza Ferreira, segundo confirmou a assessoria de imprensa da ABDI. Por causa das suspeitas de irregularidades, das infiltrações registradas no imóvel e também por ele ser maior do que o necessário, a agência decidiu mudar-se.

Essa decisão levou Lira a procurar o ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, para discutir o contrato na semana passada.

Entre os pontos que levantaram suspeitas da fiscalização está o fato de a ABDI haver gasto perto de R$ 2 milhões em reformas antes de mudar-se, embora o prédio fosse novo. A agência informou que, durante os três meses em que as novas instalações da agência ficaram em obras, ela pagou aluguel pelo imóvel, sem poder descontar o valor gasto.

Além disso, o valor do aluguel foi reajustado de R$ 210 mil para R$ 280 mil por mês – um aumento de 33%, acima da inflação e em um momento de baixa no mercado imobiliário.

Outro ponto é que o imóvel, que fica na cobertura de um prédio de escritórios, tem uma área aberta de cerca de 500 metros quadrados, projetada para descanso dos funcionários e “fumódromo”, que está abandonada.

O acórdão 991/2006 do TCU diz que é irregular o “pagamento de aluguel de imóvel sem a utilização de suas dependências.” O responsável pelo contrato é sujeito a multa.

 

Defesas. A ABDI informou que busca um novo imóvel há mais de seis meses. “É correto que a ABDI, baseada na busca da economicidade e na sua readequação orçamentária, por meio do seu corpo técnico, tem procurado, há mais de seis meses, imóveis com valores mais compatíveis com a realidade da atual estrutura da agência”, diz em nota.

Questionado pelo Estado, Lira disse que procurou Marcos Pereira para iniciar uma negociação. Ele informou que há quatro alternativas: entregar metade da área, negociar o valor do aluguel, a compra do imóvel pela ABDI ou sua devolução.

A assessoria do ministério confirmou a reunião. “A redução de custos com o aluguel, já apontada pelo TCU e por avaliações técnicas internas como necessária, faz parte desse processo do bom uso do dinheiro”, diz o texto da pasta.

O senador enviou à reportagem uma nota técnica, segundo a qual o valor do aluguel é R$ 300 mil por mês, mas foram concedidos descontos num total de R$ 1,53 milhão ao longo de 24 meses para cobrir gastos com reformas e adaptações, “apesar de o imóvel locado estar na sua quase totalidade pronto para uso imediato.” O reajuste de 33% ocorreu quando o desconto, que foi de R$ 90 mil por mês no primeiro ano de contrato, caiu para R$ 20 mil. As infiltrações, disse ele, estão sendo reparadas.

O imóvel ainda está sob garantia da construtora.

Lira disse que é proprietário de muitos imóveis na capital federal, mas não os aluga para o governo. A ABDI, frisou ele, é uma pessoa jurídica de direito privado. A reportagem não conseguiu contato com Alessandro Teixeira por meio de telefone celular nem por e-mail.

 

Reação. Lira afirmou que não aluga imóvel para o governo