O Estado de São Paulo, n. 45096, 06/04/2017.  Política, p. A10

JBS cita Cabral em negociação sob suspeita

Presidente do grupo afirma que ex-governador negociou venda da Rica, cujo dono é acusado de lavar dinheiro de esquema de corrupção

Por: Roberta Pennafort

 

O presidente da JBS, Gilberto Tomazoni, afirmou ontem em depoimento à Justiça que o ex-governador do Rio Sergio Cabral (PMDB) alegou “interesse do Estado” para tentar intermediar a venda da Frangos Rica para a empresa, em 2014. Tomazoni foi arrolado pela defesa do empresário Luiz Alexandre Igayara, um dos sócios-controladores da Rica Alimentos, da marca Frangos Rica. Igayara é acusado de lavar dinheiro do esquema de corrupção que teria sido chefiado por Cabral, durante e mesmo depois de seu governo.

“O negócio apresentado para nós seria de interesse do Estado (do Rio). Como todos os Estados fazem. Há sempre interesse, porque a avicultura é uma atividade que gera nível de emprego grande. (O objetivo de Cabral) foi essa reaproximação e tentar ver se tinha como as empresas fazerem negócio, o que acabou não ocorrendo”, declarou Tomazoni. Ele prestou depoimento ao juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal Criminal do Rio.

As investigações do Ministério Público Federal identificaram que a Rica fez pagamentos a uma empresa de Cabral, a SCF Comunicações. Também foram detectadas transferências de valores para firmas de dois colaboradores de Cabral, Carlos Emanuel Miranda e Luiz Carlos Bezerra, também presos, como o ex-governador, no Complexo de Gericinó, em Bangu.

Houve ainda repasses para o escritório de advocacia da exprimeira- dama Adriana Ancelmo, atualmente em prisão domiciliar no Leblon, zona sul da capital fluminense.

 

Tratativas. O executivo disse que Cabral procurou um dos controladores da JBS, Joesley Batista, para tratar do negócio. “Joesley falou que o ex-governador Cabral o procurou e disse que seria importante para o Rio de Janeiro desenvolver a atividade de frango. Assim foi feito.

Visitamos a operação dele (Igayara) e novamente o negócio não se mostrou viável.” Segundo ele, o ex-governador insistiu nas tratativas alegando que o negócio era importante para a geração de empregos no Rio. A Rica é uma empresa local e hoje está em recuperação judicial.

No caso dos supostos contatos para a venda da Rica, feitos quando Cabral já havia renunciado ao cargo, em abril de 2014, o presidente da JBS afirmou que não houve nada inapropriado.

A aquisição da Rica já havia sido descartada pela empresa de carnes, uma vez que as partes não haviam entrado em acordo.

Em novembro de 2016, Igayara foi conduzido coercitivamente para depor no âmbito da Operação Calicute, da Polícia Federal, cujo alvo principal foi Sergio Cabral.

Aquisição. Por nota oficial, a JBS reafirmou a versão apresentada por seu executivo: “A JBS implementou nos últimos anos uma estratégia de aquisição de várias empresas. A Rica, maior processadora de frango do Rio de Janeiro, foi uma das empresas avaliadas. A análise ocorreu em duas ocasiões: em 2014, apresentada pela Winner International Bank, e em 2015, pela própria empresa. A companhia decidiu não seguir adiante na aquisição por razões comerciais, após avaliação feita por seus executivos diretamente com a Rica”, informa a empresa.

“Posteriormente, a oportunidade do negócio também foi mencionada a Joesley Batista pelo ex-governador Sergio Cabral, quando este já não ocupava nenhum cargo público. A negociação não prosperou pelas mesmas razões comerciais. O ex-governador não atuou como agente, intermediário ou corretor na negociação. Seu papel foi o de alguém que sugeriu uma empresa de seu Estado como uma oportunidade de aquisição”, finaliza a nota.

 

Detido. Sergio Cabral está preso desde o ano passado em Bangu; negócio entre a JBS e a Frangos Rica não foi fechado

 

Interesse do Estado

“O negócio apresentado para nós seria de interesse do Estado (do Rio). Como todos os Estados fazem. Há sempre interesse, porque a avicultura é uma atividade que gera nível de emprego grande.”

Gilberto Tomazoni

PRESIDENTE DA JBS, EM DEPOIMENTO À JUSTIÇA

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Advogado de Lula depõe em defesa de Adriana Ancelmo

 

Cristiano Zanin Martins, um dos advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi uma das testemunhas apresentadas ontem pela defesa da ex-primeira dama do Rio Adriana Ancelmo para depor ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. Ela é acusada de integrar o esquema de corrupção que seria chefiado pelo marido, o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).

Por videoconferência, Zanin assegurou ter trabalhado com o Ancelmo Advogados, escritório de Adriana, de 2015 a 2017.

“Tivemos um cliente comum, a Fecomércio-RJ, entidade de grande porte e com destaque no Estado do Rio, que tem litígio de grande proporção com entidade correlata, o que envolve diversos processos”, declarou Martins, em depoimento. “Tínhamos discussões sobre o exercício da advocacia.

Participo desse grupo de advogados que defende esse cliente.” Segundo ele, havia ações na Justiça estadual e na federal do Rio e recursos no Tribunal Regional Federal da 2ª Região e no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Outro advogado, Marcelo Rossi Nobre, também foi convocado para depor em defesa da colega.

Um dos principais objetivos dos defensores é demonstrar que o Ancelmo Advogados não é um escritório de fachada. O Ministério Público Federal diz que, por meio da simulação de serviços prestados pela banca, era lavado dinheiro proveniente de corrupção.

A defesa de Adriana Ancelmo nega irregularidades.

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H.Stern fecha acordo de delação premiada com Ministério Público

Herdeiros e outros dois executivos de joalheria terão de pagar multa de R$ 18,9 mi por compras feitas por Cabral e Adriana

Por: Mariana Sallowicz

 

O alto escalão da H.Stern fechou acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal relativo às investigações do esquema de corrupção que seria liderado pelo ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB). O presidente da joalheria, Roberto Stern, o vice-presidente, Ronaldo Stern, o diretor financeiro, Oscar Luiz Goldemberg, e a diretora comercial, Maria Luiza Trotta, concordaram em pagar multas que somam R$ 18,9 milhões. Também se comprometerem a prestar serviços à comunidade e emitir notas fiscais das compras feitas por Cabral e pela ex-primeira-dama Adriana Ancelmo.

As conclusões que surgirem do acordo vão servir como base para uma nova denúncia contra Cabral. O foco nesse caso será lavagem de dinheiro com a compra de joias. Cabral e sua mulher compraram cerca de 40 peças da H.Stern, num total de R$ 6,3 milhões. A multa é equivalente a três vezes esse valor.

Os dois herdeiros da rede de joalherias pagarão as maiores penalidades, de R$ 8,95 milhões cada uma. Já os diretores terão que pagar R$ 500 mil cada um. O formato da prestação de serviços ainda está em discussão, mas uma das possibilidades é que ofereçam cursos profissionalizantes dentro da H.Stern durante dois anos.

 

Emissão. Uma fonte informou à reportagem que as peças vendidas ao casal pela H.Stern sem notas fiscais já foram regularizadas – nem todas as compras foram sem a emissão dos recibos. Além disso, a joalheira terá de emitir notas fiscais de todas as vendas feitas a outros clientes com valores em dinheiro acima de R$ 30 mil. Como consequência, a empresa também terá de recolher os tributos referentes a essas vendas.

Caso se descubra posteriormente que a H.Stern deixou de emitir alguma dessas notas, o acordo será invalidado.

 

Presente. Entre as peças compradas pelo casal, está um brinco de ouro 18 quilates com brilhante solitário, que custou R$ 1,8 milhão. Há ainda um anel de ouro amarelo com brilhante solitário de R$ 1,1 milhão. Também foram feitas compras em valores menores, abaixo de R$ 1 mil. Nesse caso, as joias eram dadas como presente, segundo as investigações.

Em depoimento no mês passado, a diretora comercial da H.Stern, Maria Luiza Trotta, contou que Cabral chegou a ser atendido no Palácio Guanabara, quando ele ainda era governador do Rio.

Segundo as investigações do MPF e da Polícia Federal, o grupo de Cabral teria desviado recursos em propinas cobradas de diversas empreiteiras contratadas para obras públicas do Estado, incluindo projetos financiados pela União, como a reforma do Estádio do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 e o PAC das Favelas.

Cabral e Adriana, ambos réus da Operação Calicute, um desdobramento da Lava Jato, são suspeitos de comprarem joias para fazer a lavagem de dinheiro do esquema de corrupção.

 

Defesas. Procurada pelo Estado, a empresa não quis comentar. A defesa de Adriana nega que a ex-primeira-dama tenha cometido os crimes e diz que ela só fez a compra de joias com nota fiscal. A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Cabral.

 

Braço direito de Eike

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu ontem a prisão preventiva de Flávio Godinho, ex-vice- presidente de futebol do Flamengo que foi alto executivo do grupo EBX, holding do empresário Eike Batista.

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Marqueteiros vão detalhar em delação caixa 2 no exterior

Depoimentos prestados por ex-executivos da Odebrecht ao TSE citam negócios feitos por João Santana e Mônica Moura

Por: Fabio Serapião / Rafael Moraes Moura / Beatriz Bulla

 

Os depoimentos de ex-executivos e ex-funcionários da Odebrecht ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que as delações premiadas do marqueteiro João Santana e da empresária Mônica Moura devem revelar detalhes do caixa 2 em campanhas do Brasil e no exterior realizadas de 2008 a 2014.

Anteontem, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), homologou as delações de João Santana, Mônica Moura e de André Luis Reis Santana, funcionário do casal. Os três serão ouvidos pelo TSE no âmbito da ação que apura se a chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer cometeu abuso de poder político e econômico para se reeleger em 2014.

Em depoimentos prestados ao TSE no mês passado, Maria Lúcia Tavares, Luiz Eduardo Soares, Fernando Migliaccio, Hilberto Mascarenhas e o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht revelaram detalhes da relação da empreiteira com o casal, conhecido pelo codinome “Feira”.

 

Campanhas. Em depoimento ao TSE em 6 de março, Mascarenhas disse que foram pagos entre US$ 50 milhões e US$ 60 milhões a Mônica Moura. Segundo ele, foram feitos pagamentos ao casal por campanhas no Brasil de 2010, 2012 e 2014 e por serviços realizados no exterior.

“Pessoas de países que nós trabalhávamos, como Angola, Panamá, El Salvador, queriam eles na campanha deles. E eles diziam: ‘Só vou se a Odebrecht garantir o pagamento’. Então sobrava para a gente pagar, não é?”, afirmou Mascarenhas.

De acordo com Migliaccio, havia uma sistemática para o pagamento realizado à Mônica Moura no Brasil – preferencialmente em reais e em espécie.

No dia 1.º de março, Marcelo Odebrecht disse ao TSE que, no caso de Santana, os pagamentos do setor de propina representavam a maior parte do que era destinado ao PT. “E aí é um processo que começou lá trás, estou falando de 2008, onde eles procuravam acertar com a gente um valor e a gente dar um conforto ao João Santana, que ele recebia.” Segundo o empreiteiro, como Santana tinha confiança que os pagamentos seriam efetuados, os repasses ocorriam ao longo do tempo. Como exemplo, Marcelo citou que, em 2014, ainda eram efetuados pagamentos acertados em 2011.

Além de pagamentos relacionados às campanhas – 2008, 2010, 2012 e 2014 –, Marcelo Odebrecht disse que repassou valores ao marqueteiro por sua atuação em campanhas no exterior em países que o “PT tinha interesse em ajudar”.

Tanto Santana quanto Mônica deverão esclarecer no acordo de colaboração qual era o grau de conhecimento e participação de Dilma nos pagamentos irregulares da Odebrecht.

Para Marcelo, a única ilicitude em sua relação com a petista eram repasses ao publicitário.

 

Renúncia. Após a homologação do acordo, oito advogados renunciaram à defesa do casal na Lava Jato. Em petição ao juiz federal Sérgio Moro, que conduz a operação na primeira instância, os criminalistas Fabio Tofic Simantob, Débora Gonçalves Perez, Maria Jamile José, Bruna Nascimento Nunes, Luiz Felipe Gomes, Thais Guerra Leandro, Daniel Paulo Fontana Bragagnollo e João Paulo de Castro Bernardes alegaram “motivos de foro íntimo”.

 

Sigilo. Defesa de João Santana não comentou acordo