Carolina Brígido
17/06/2017
-BRASÍLIA- O Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar na quartafeira se o plenário da Corte pode rever pontos específicos das colaborações premiadas dos donos da JBS — entre eles, as penas negociadas com os delatores em troca das revelações. Também será analisado se o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, vai continuar conduzindo o inquérito aberto para investigar o presidente Michel Temer e o exdeputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), suspeitos de terem cometido corrupção, organização criminosa e obstrução de justiça. Os questionamentos foram feitos pelo governador de Mato Grosso do Sul, o tucano Reinando Azambuja, que foi alvo das delações. Fachin decidiu levar as questões para o exame em plenário.
Uma decisão do STF no sentido de possibilitar revisão dos termos das delações seria uma forma de reduzir o poder da Procuradoria-Geral da República, porque os investigadores têm se valido das colaborações premiadas como forma de ampliar as investigações da Lava-Jato. Se decidirem que é possível modificar a cláusula das delações mesmo depois de terem sido homologadas, os ministros do STF vão estabelecer em que momento isso pode ser feito — se a qualquer momento das investigações ou apenas no fim da ação penal, quando são fixadas as penas dos eventuais condenados.
Sobre a relatoria, Fachin deverá defender no plenário que o caso é mesmo uma atribuição dele. Quando chegou ao STF, o inquérito foi para o gabinete do ministro por conexão com a Lava-Jato. No recurso, o governador argumenta que o caso deveria ter sido sorteado entre todos os ministros do tribunal, porque não haveria nenhuma ligação com o objeto de investigação da Lava-Jato — ou seja, os desvios na Petrobras.
Ao menos quatro ministros da Corte defendem que pontos específicos das delações premiadas dos donos da JBS possam ser revisitados pelo plenário. Isso porque a lei fala em homologação por parte do juiz. No caso de um tribunal, a homologação deve ser feita pelo colegiado, que reúne todos os juízes da Corte.
— Eu tenho a impressão de que nós vamos ter que discutir esse tema da homologação. Eu já tinha discutido com o ministro Teori (Zavascki, antigo relator da Lava-Jato) no sentido de que essa matéria fosse discutida pela turma. Porque o que a lei diz? Que o juiz é quem homologa, mas o juiz aqui não é o relator. Quando se trata de tribunal, é o próprio órgão. Ele pode até fazer a homologação prévia, mas sujeita a referendo — disse Gilmar Mendes em maio.
Marco Aurélio Mello também defende a tese:
— Realmente, a negociação pode partir do Ministério Público, mas quem fixa os benefícios é o Judiciário. Nesta delação de agora (da JBS), o ministro Edson Fachin somente homologou o acordo nos aspectos formais, não o conteúdo em si. O conteúdo em si será avaliado pelo órgão julgador, que é o plenário do Supremo — afirmou Marco Aurélio.
Um outro ministro do tribunal considera que, recentemente, a PGR tem firmado delações premiadas com exigências muito frouxas para os investigados. A principal crítica é contra as penas brandas fixadas, em contraste com a gravidade dos crimes praticados.
— Fica fácil fazer delação assim, com penas tão amigáveis. O STF não pode permitir que isso fique assim — disse o ministro.
Normalmente, as questões referentes à Lava-Jato são submetidas à Segunda Turma, composta de cinco ministros. Mas, como a delação da JBS levanta suspeita contra o presidente Temer, o assunto seria levado ao plenário, em um julgamento com os 11 integrantes da Corte.
Fachin tem ouvido de colegas do tribunal e também de juízes auxiliares que atuam em seu gabinete que é possível rever pontos do acordo, mesmo depois da homologação. O relator estaria estudando essa possibilidade.
Perguntas e respostas
– Quem são os maiores interessados na revisão dos acordos de delação? – A ação que será julgada foi apresentada ao STF pelo governador de Mato Grosso do Sul, citado na delação da JBS. Outros citados também têm interesse no resultado do julgamento.
– A JBS já se pronunciou sobre o risco de a delação ser revista? – A defesa de Joesley Batista recorreu ao STF alegando que só os próprios delatores poderiam pedir a revisão do acordo e que o governador do MS não teria direito de contestá-lo judicialmente.
O globo, n. 30630, 17/06/2017. País, p. 4