Dono da Andrade vai depor sobre suspeita de propina a políticos

Josette Goulart

29/04/2017

 

 

Delator da Odebrecht afirma que Sérgio Andrade autorizava pessoalmente pagamentos direcionados para Aécio e Cunha

 

 

Citado em delação premiada da Odebrecht como representante da Andrade Gutierrez em negociação de propina relacionada às obras da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, o dono da construtora, Sérgio Andrade, será ouvido por investigadores da Operação Lava Jato. Segundo um dos delatores, ele tratou pessoalmente de pagamentos que seriam direcionados ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) e ao deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Principal acionista da empreiteira, Sérgio até agora está imune pelo acordo fechado pela empresa com o Ministério Público Federal (MPF). Após a delação da Odebrecht, porém, algumas empreiteiras – incluindo a Andrade Gutierrez – estão sendo chamadas para uma espécie de “recall” para explicar episódios que não foram contemplados nos primeiros depoimentos.

Segundo pessoas próximas a Sérgio, ele se antecipou a uma convocação oficial dos procuradores, considerada inevitável, para explicar a questão de Santo Antônio, que não fez parte do acordo inicial da empreiteira. O executivo pediu espontaneamente para prestar esclarecimentos. Segundo essas fontes, Sérgio não tinha conhecimento de todo o assunto relacionado à Santo Antônio, mas conversou sobre possíveis pagamentos a políticos com Marcelo Odebrecht.

Em sua delação, Marcelo afirmou que fazia reuniões frequentes com Aécio em razão do papel da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), que era sócia da usina, e que Sérgio participava desses encontros. Na época, Aécio era governador de Minas e a Andrade Gutierrez, acionista da Cemig.

Pelas delações, no entanto, o envolvimento de Sérgio ia além das reuniões de negócios. O ex-presidente da Odebrecht Energia Henrique Valladares disse que comunicava pessoalmente Sérgio sobre os pagamentos a serem feitos pelo consórcio a políticos e que o executivo dava o seu aval. A Andrade e a Odebrecht eram sócias no consórcio construtor da usina na proporção de 40% e 60%, porcentual usado para dividir o valor a ser pago por cada uma. “Minhas conversas em geral eram com o doutor Sérgio Andrade, que é tão dono da Andrade Gutierrez quanto Emílio é da Odebrecht”, afirmou Valladares.

A Procuradoria-Geral da República investiga, com base nas delações, o pagamento de R$ 50 milhões em benefício de Eduardo Cunha, que teria atuação em Furnas. A estatal era sócia do empreendimento de Santo Antônio com 40% de participação. Em seu depoimento, Valladares disse ter sido informado pelo chefe, Marcelo Odebrecht, de que outros R$ 50 milhões seriam destinados a Aécio.

A delação de Valladares foi a base para um dos inquéritos que hoje tramitam no Supremo Tribunal Federal contra o senador. Nele, o MPF alega que o pagamento de vantagens indevidas ao senador e ao PSDB foi feito em conluio com a Andrade com o objetivo de obter ajuda nas usinas do Rio Madeira. “Nesse contexto, o colaborador Henrique Valladares esclarece que os valores pagos em cada prestação giravam em torno de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões, sendo implementados por meio do Setor de Operações Estruturadas, identificando-se o beneficiário pelo apelido ‘Mineirinho’” – codinome atribuído a Aécio.

Acordo. Advogados disseram que a acusação feita por Valladares é grave porque, no acordo feito pela Andrade com a Lava Jato, somente executivos da empresa assumiram a responsabilidade pelos atos de corrupção, deixando os sócios de fora. A estratégia de defesa de Sérgio será a de que ele não tinha todas as informações sobre a usina para que pudesse colaborar. Além disso, existe a intenção de desqualificar a delação de Valladares.

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Moro manda Lula devolver 21 itens de acervo presidencial

 

 

O juiz federal Sérgio Moro autorizou ontem a Presidência da República a incorporar ao patrimônio da União 21 bens do acervo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os objetos estão armazenados em um cofre do Banco do Brasil, no centro de São Paulo, e foram apreendidos em março do ano passado na Operação Lava Jato. Na ocasião, Lula se referiu aos objetos como “tralhas”.

Uma comissão especial da Se- cretaria de Administração da Presidência analisou 176 itens recebidos pelo petista, entre 2003 e 2010. Uma coroa, uma espada, esculturas e moedas estão entre bens que não deveriam ter sido levados por Lula.

“Constatou este Juízo que havia alguns bens entre os apreendidos que teriam sido recebidos, como presentes, pelo expresidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o exercício do mandato, mas que, aparentemente, deveriam ter sido incorporados ao acervo da Presidência e não ao seu acervo pessoal. É que agentes públicos não podem receber presentes de valor e quando recebidos, por ser circunstancialmente inviável a recusa, devem ser incorporados ao patrimônio público”, escreveu Moro.

Segundo o juiz da Lava Jato, os bens a serem confiscados foram “recebidos em cerimônias oficiais de trocas de presentes com chefes de Estados ou governos es- trangeiros, que têm algum valor mais expressivo”, sem “caráter personalíssimo”.

Na mesma decisão, o juiz determinou que permaneça na posse do ex-presidente outros objetos, como “medalhas, canetas, insígnias, arte sacra, por terem caráter personalíssimo”.

Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, afirmou, por meio de nota, que “o fato de o juiz Sérgio Moro autorizar que

seja retirada de Lula parte do seu acervo presidencial é mais uma prova de sua parcialidade e perseguição contra o ex-presidente”. Segundo ele, o acervo privado de Lula é “resultado de um processo administrativo que tramitou em Brasília, exatamente como ocorreu em relação a todos os ex-presidentes”.

O advogado afirmou também que “nenhum ato relacionado ao acervo foi praticado em Curitiba”. “Além da questão da competência territorial, o tema é absolutamente estranho a uma Vara Criminal. Mais uma vez estáse diante de uma decisão absolutamente ilegítima.”

Moro e Lula vão se encontrar no dia 10 de maio, quando o expresidente presta depoimento em Curitiba, onde é réu por lavagem de dinheiro e corrupção passiva no caso do triplex do Guarujá.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45119, 29/04/2017. Política, p. A6.