Ex deputado cita 'mensalinho' de Blairo

Fabio Serapião

01/04/2017

 

 

José Riva diz à Justiça que ministro, quando governador de Mato Grosso, superfaturou orçamento do Legislativo para pagar parlamentares

 

 

O ex-presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso José Geraldo Riva afirmou nesta sexta-feira, 31, em depoimento à Justiça que o atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, quando governador do Estado, entre 2003 e 2010, mandou superfaturar o orçamento do Legislativo para que o excedente fosse utilizado no pagamento de um “mensalinho” para deputados estaduais. O objetivo dos repasses, disse Riva, era manter o apoio político do Legislativo ao Poder Executivo.

No depoimento, Riva – que negocia um acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República – afirmou que o repasse de valores mensais existia antes mesmo de Blairo assumir o Executivo mato-grossense. Segundo ele, antes de 2003, diferentemente do que ocorreu na gestão Blairo, os valores saíam diretamente do Poder Executivo e eram destinados a apenas um grupo de deputados que formava a base do governo.

Riva disse que a mudança de método ocorreu nos primeiros meses da administração Blairo. De acordo com o ex-deputado, como o atual ministro, durante sua campanha a governador, em 2002, teria feito discursos duros contra a Assembleia, ele foi cobrado a reativar os pagamentos quando assumiu.

De acordo com Riva, foi realizada, então, uma reunião da qual Blairo participou. No encontro, o então governador teria dito que não continuaria a efetuar os pagamentos via Executivo e o que o que poderia ser feito era adicionar os valores dos pagamentos indevidos no orçamento da Assembleia para que, depois, o excedente fosse destinado aos deputados.

A única condição imposta por Blairo, afirmou Riva, era que os pagamentos a partir daquele momento teriam de beneficiar todos os deputados, e não só um pequeno grupo.

“Blairo disse que ia reforçar o orçamento e era para que a gente adicionasse o valor do mensalinho, mas que deveria ser pra todos os deputados para não ter problema”, disse Riva.

Questionado pela juíza Selma Arruda se Blairo e Silval Barbosa – sucessor do ministro no governo de Mato Grosso – sabiam que o acréscimo no valor do orçamento seria usado para pagar o mensalinho, Riva disse que sim. “Tanto ele como Silval fizeram cientes de que o dinheiro era para o mensalinho.”

Valores. Sobre os valores movimentados pelo esquema, Riva disse que, entre 2003 e 2004, chegaram a R$ 1,1 milhão. Em 2005, o valor aumentou para R$ 3,4 milhões. Em 2006 foram R$ 6 milhões. Em 2007, R$ 12 milhões e, em 2008, R$ 15 milhões.

O depoimento de Riva foi no âmbito da Operação Imperador, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de Mato Grosso. A operação, de fevereiro de 2015, investigou desvios praticados por Riva na presidência da Assembleia estadual.

Segundo o Ministério Público, a Mesa Diretora da Assembleia contratava empresas para fornecimento de material de escritório. Como eram firmas de fachada, cerca de 80% do valor do contrato era devolvido pelos empresários para Riva, que ficava responsável pela distribuição da mesada aos deputados.

Licitações. Para dar aparência legal ao esquema eram forjados processos licitatórios nas modalidade carta-convite, pregão presencial e concorrência pública. Além disso, a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Mato Grosso forçava os deputados a assinar um relatório no qual afirmavam ter recebido o material – objeto das compras fraudadas.

De acordo com a denúncia do Ministério Público oferecida contra 14 pessoas, alguns deputados estaduais chegaram a receber um mensalinho de R$ 70 mil para não se opor aos projetos de interesse da Mesa Diretora, na época presidida por Riva.

“O esquema começou antes do governo Dante de Oliveira, passou pelo governo Blairo e se estendeu até o último dia de governo Silval”, afirmou Riva.

 

Governos

“O esquema começou antes do governo Dante de Oliveira, passou pelo Blairo e se estendeu até o Silval.”

José Geraldo Riva

EX-PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DE MT

 

 

PARA LEMBRAR

Em 2014, foi alvo da Ararath

Ex-presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, José Riva (PSD) ficou conhecido como “o maior ficha suja do País”. O ex-deputado estadual é réu em mais de uma centena de ações criminais e cíveis. Riva também foi secretário estadual na gestão do hoje ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PP).

Em maio de 2014, Riva chegou a ser preso pela Polícia Federal durante a quinta fase da Operação Ararath, que investigava esquema de crimes financeiros e lavagem de dinheiro por meio de empresas de factoring (negociadoras de crédito). Outro detido foi Eder Moraes, que atuou como secretário de Fazenda e da Copa na gestão Blairo Maggi.

Na ocasião, o então governador do Estado, Silval Barbosa (PMDB), também alvo da operação, foi preso, por guardar em casa uma arma de fogo com registro vencido, e liberado após o pagamento de fiança.

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Ministro nega participação em esquema

 

 

O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, afirmou ontem que o próprio ex-deputado José Geraldo Riva “reconheceu” que ele se recusou “terminantemente, enquanto governador de Mato Grosso, a participar de qualquer esquema de distribuição de propina a deputados”.

“Tenho a consciência tranquila, nada fiz de errado e tenho certeza de que isso será devidamente comprovado”, disse o ministro, ao comentar o depoimento de Riva prestado ontem à Justiça em Cuiabá. Blairo declarou ainda que o Executivo, “no caso, o governador, não tem qualquer ingerência na execução orçamentária da Assembleia Legislativa”.

“O orçamento do Estado de Mato Grosso é debatido e votado anualmente pela Assembleia Legislativa. Nele estão incluídas as previsões orçamentárias dos três poderes, que são independentes e fiscalizados pelo Tribunal de Contas do Estado”, afirmou o ministro. 

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PF apura ‘fantasmas’ na Assembleia de AL

Mateus Coutinho e Julia Affonso

01/04/2017

 

 

A Polícia Federal em Alagoas deflagrou anteontem a Operação Sururugate, que apura esquema de desvios por meio de funcionários fantasmas na Assembleia Legislativa do Estado, entre 2010 e 2013. O esquema envolveria beneficiários do Bolsa Família. A PF fez buscas e apreensões na Diretoria Financeira e de Recursos Humanos.

Segundo investigações, a Assembleia de Alagoas declarou, em 2010, o triplo de servidores do que realmente possuía. Naquele ano, o Legislativo estadual mantinha na Caixa Econômica Federal contas bancárias de 2.400 funcionários. Perante o Ministério do Trabalho, contudo, foi constatado que a Assembleia tinha, de fato, 800 servidores na folha de pagamento.

As disparidades, segundo o superintendente regional da PF em Alagoas, Bernardo Gonçalves de Torres, se mantiveram durante todo o período investigado, de 2010 a 2013, quando a folha de pagamento da Casa ficou em torno de R$ 100 milhões.

“De acordo com as informações prestadas pela Assembleia ao Ministério do Trabalho essa folha era bem menor, de R$ 40 milhões, por exemplo.” Segundo o delegado, foi a partir daí que as investigações avançaram e o Ministério da Transparência realizou uma auditoria com os bancos de dados do governo federal sobre beneficiários do Bolsa Família e de outros programas sociais.

Deputados. A operação deflagrada anteontem foi autorizada pelo Tribunal de Justiça de Alagoas e mira em nove deputados estaduais e um ex-deputado que teriam se beneficiado do esquema. O processo é sigiloso e nomes não foram divulgados.

De 2010 a 2013, foi constatado que pagamentos da Assembleia a pessoas cadastradas em programas sociais do governo federal somaram R$ 15 milhões.

Ao todo, de acordo com Torres, foram identificados 220 beneficiários do Bolsa Família vinculados à Assembleia no período. “Se a pessoa recebe benefícios do Bolsa Família, obviamente não pode ser funcionário da Assembleia, onde eles recebem salários altos, de R$ 10 mil até R$ 17 mil.” Foi feita auditoria em 80 casos.

Havia desde pessoas que trabalhavam na Assembleia e recebiam indevidamente o benefício até “laranjas” que emprestavam o nome e, em troca, recebiam uma quantia simbólica, de até R$ 300, sem trabalhar na Casa. A PF identificou ainda casos de mais de 30 pessoas que moram em outros Estados e nem sequer sabiam que eram “funcionários” da Assembleia.

A reportagem tentou contato com a assessoria da Assembleia Legislativa, mas não obteve resposta. Após a operação, foi divulgada uma nota no site da Casa em que a atual Mesa Diretora afirmou ver “com naturalidade a ação investigativa”. Ainda segundo o comunicado, a Assembleia está “aberta à criação de novos mecanismos de controle interno e reitera o compromisso de colaborar com o esclarecimento da verdade”.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45091, 01/04/2017. Política, p. A9.