AGU contraria tese usada por defesa de Temer 

André de Souza

15/06/2017

 

 

Ao Supremo, Advocacia-Geral da União afirma que chapas eleitorais não podem ser divididas em processos

-BRASÍLIA- A Advocacia-Geral da União (AGU), que representa o governo federal em processos judiciais, defendeu a indivisibilidade das chapas eleitorais em documento protocolado no Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, “eventual eleição para o cargo de vice está obrigatoriamente vinculada à do titular”. A manifestação ocorreu na ultima terça-feira, numa ação questionando decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que cassou os mandatos do governador e do vice do Amazonas.

O parecer foi entregue quatro dias depois de o TSE concluir outro julgamento: o que manteve no cargo o presidente Michel Temer, a quem cabe nomear o chefe da AGU. Vice da ex-presidente Dilma Rousseff em 2014, ele assumiu a Presidência da República depois do processo de impeachment. Na sua defesa pessoal no TSE, Temer destacava, entre outros pontos, justamente a separação de contas entre titular e vice, em sentido contrário ao defendido pela AGU. Mas, como toda a chapa foi absolvida, esse ponto sequer foi analisado pelo TSE.

No documento, a AGU destacou um trecho da Constituição segundo o qual a eleição de presidente e vice é simultânea. Além disso, “a eleição do Presidente da República importará a do Vice-Presidente com ele registrado”. Assim, conclui a AGU, “de modo semelhante, a candidatura para os cargos de governador e vice-governador é feita mediante chapa única e indivisível, de modo que eventual eleição para o cargo de vice está obrigatoriamente vinculada à do titular da chapa, nos termos do artigo 91 do Código Eleitoral”.

Em outro ponto, tratando especificamente do caso do Amazonas, a AGU diz que não há motivo para falar em individualização da pena, o que permitiria ao vice do Amazonas, José Henrique de Oliveira, assumir o cargo com a cassação do mandato do ex-governador José Melo.

COMPRA DE VOTOS EM 2014

A ação protocolada no STF é de autoria do Solidariedade, partido do vice cassado. Em 4 de maio, por cinco votos a dois, os ministros do Tribunal Superior Eleitoral entenderam que houve compra de votos na eleição de 2014. Para a AGU, o partido “busca a conservação de parte dos efeitos de um pleito eleitoral comprovadamente fraudulento, em manifesta violação ao direito de voto”.

“De modo semelhante, não prospera a argumentação do requerente no sentido de que a decisão impugnada ofenderia os princípios constitucionais da pessoal idade e individualização da pena. De fato, a norma legal que proíbe a captação ilícita de sufrágio, sancionando essa conduta com a cassação do mandato e a imposição de multa, visa a resguardar, sobretudo, a vontade do eleitor”, alegou a AGU.

O órgão do governo federal refutou ainda o argumento de que não poderia ter ocorrido a execução da decisão do TSE antes da publicação do acórdão, uma espécie de resumo do que foi decidido. A AGU citou jurisprudência do STF, segundo a qual isso é possível em caso de compra de voto. O documento é assinado pela ministra da AGU, Grace Mendonça, pela secretária-geral de Contencioso do órgão, Isadora Maria Cartaxo de Arruda, e pela advogada da União Andrea de Quadros Dantas Echeverria.

No caso de Temer, por quatro votos a três, o TSE o manteve no cargo na semana passada. O tribunal absolveu a chapa vencedora da eleição de 2014, em que Dilma era a titular e Temer o vice. Com o impeachment da ex-presidente no ano passado, Temer herdou o cargo. A chapa era acusada de ter recebido recursos de origem irregular e ter feito despesas ilícitas.

PROVAS CONTRA CHAPA FORAM IGNORADAS

Mesmo admitindo a existência de fartos indícios de que houve crimes na campanha, o TSE lançou mão de argumentos técnicos para absolver os candidatos e, com isso, deu fôlego para o presidente tentar manter-se no cargo, a despeito da crise política instalada no país.

Quatro ministros do tribunal — o presidente Gilmar Mendes, Napoleão Nunes Maia Filho, Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira — declararam que as provas mais contundentes, como os depoimentos de delatores da empreiteira Odebrecht, não poderiam ser levadas em conta, porque foram inseridas no processo fora do prazo.

Frase

“Eventual eleição para o cargo de vice está obrigatoriamente vinculada à do titular da chapa” Grace Mendonça Advogada-Geral da União

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Fachin rejeita suspensão de ação sobre tríplex

André de Souza e Juliana Arreguy 

15/06/2017

 

 

Defesa de Lula queria acesso a supostas delações ainda em negociação

-BRASÍLIA E SÃO PAULO- O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou pedido do ex-presidente Lula para suspender a ação penal sobre o tríplex do Guarujá (SP), que tramita na 13ª Vara Federal de Curitiba, do juiz Sérgio Moro. A decisão do ministro foi tomada no âmbito de uma reclamação, por meio da qual a defesa de Lula pediu acesso a informações relacionadas a delações que estariam em negociação entre o Ministério Público Federal (MPF) e outros réus no processo, como Léo Pinheiro, expresidente da OAS, e Agenor Franklin Magalhães Medeiros, ex-executivo da empresa.

Na decisão contestada no Supremo, o juiz considerou incabível a apresentação de informações sobre “eventual e incerto acordo de colaboração não celebrado”, mas acolheu pedido para que o MPF, nas alegações finais, informe se o acordo tiver sido celebrado, caso não esteja sob sigilo. Lula é acusado de ter recebido propina da OAS de forma disfarçada, por meio da compra e reforma de um apartamento no Guarujá (SP) e os custos do armazenamento de bens após ter deixado a Presidência.

A defesa de Lula argumentou, na reclamação ao STF, que as informações solicitadas são necessárias porque poderiam influenciar a ação penal a que o cliente responde. Alega ainda que a decisão da Justiça Federal em Curitiba contraria súmula do STF que assegura ao acusado acesso a elementos de prova já documentados. Por isso, além de pedir em caráter liminar a suspensão da ação penal, requereu acesso à íntegra das diligências documentadas referentes a eventual colaboração premiada.

Na decisão, Fachin afirmou não verificar ilegalidade evidente que justifique a suspensão do processo em Curitiba. Segundo ele, não se constata iminência de prolação de decisão definitiva “que poderia, em tese, causar prejuízo ao reclamado”.

EX-PROCURADORES DEPÕEM

Fachin também defendeu que não há elementos seguros de concretização do acordo de colaboração, bem como sua documentação, que possam caracterizar ofensa à súmula vinculante do STF. Ele indeferiu o pedido de liminar, que poderá ser reanalisado na apreciação do mérito da matéria.

Em outro processo, os ex-procuradores-gerais da República Claudio Fonteles e Antônio Fernando de Souza, além do ex-diretor geral da Polícia Federal Luiz Fernando Corrêa negaram qualquer tentativa de obstrução de investigações promovidas durante o governo Lula. Em depoimentos ontem ao juiz Sergio Moro, por videoconferência, todos afirmaram desconhecer, à época em que ocupavam os respectivos cargos, os nomes de Nestor Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Renato Duque.

Os três foram testemunhas de defesa no processo em que Lula é acusado pelo Ministério Público Federal de pedir propina à Odebrecht, como um apartamento vizinho ao que mora hoje, em São Bernardo do Campo (SP), e um prédio que sediaria o Instituto Lula, em São Paulo.

— De 2003 a 2005 eu fui vice procurador-geral eleitoral e o procurador-geral era o Claudio Fonteles. Nesse período, e depois dele, jamais tive qualquer conhecimento sobre esse homem — respondeu Souza quando indagado sobre Nestor Cerveró.

A fala de Souza corrobora a versão dada por Fonteles sobre o ex-diretor da Petrobras:

— Não, nem conhecia esse nome. Nunca o vi. Soube quem era apenas agora, recentemente.

Questionado se conhecia fatos que “indicassem prática de ato ilícito” de Renato Duque, Fonteles alegou desconhecer qualquer situação e afirmou que ações sobre o caso iam além de sua competência.

— Não, até porque não me compete tomar conhecimento disso. São pessoas destituídas de prerrogativa de função. Uma coisa que sempre preservei, e meus colegas sabem disso, é a independência funcional.

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Lula defende mudanças na escolha de ministros do STF

15/06/2017

 

 

Para o petista, alterações evitariam suposta influência de ex-presidentes na Corte

-SÃO PAULO- O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a revisão dos processos de indicação para altos cargos do Judiciário “para não parecer que o presidente tem influência sobre um ministro e outro”. A declaração, feita ontem a uma rádio maranhense, veio uma semana após a absolvição da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), embora Lula tenha se referido ao Judiciário de forma genérica.

— Precisamos discutir com a sociedade um novo critério para indicar ministros da Suprema Corte. É extremamente importante a gente aperfeiçoar o sistema democrático, para não parecer que presidente tem influência sobre um ministro e outro. Acho que não tem — disse Lula.

Durante seu mandato presidencial (2003-2010), Lula indicou oito ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Três deles ainda compõem a Corte: a presidente, Cármen Lúcia, o vice, Dias Toffoli, e o ministro Ricardo Lewandowski. Foi o maior número de indicações desde a ditadura militar, como apontado pelo próprio Lula na entrevista:

— Como fui eu quem mais indicou (ministros) acho que tenho autoridade para dizer que precisamos aperfeiçoar o sistema de escolha na Suprema Corte.

Embora tenha reforçado a atuação independente do Judiciário, Lula defendeu que o tempo de permanência no cargo seja revisto. Atualmente, os ministros do STF não possuem mandato fixo, com o limite de aposentadoria compulsória aos 75 anos.

— Quando o ministro coloca a toga, ele vira uma figura independente. Um bom presidente da República não indica um ministro para servi-lo, mas para cumprir a Constituição. O que não pode é entrar com 35 anos e ficar até os 75 num cargo de ministro da Suprema Corte — disse.

Ao longo da entrevista, o expresidente criticou novamente os procuradores da Lava-Jato:

— Tenho criticado o comportamento dos procuradores da Lava-Jato. Acho que eles estão depondo contra a imagem do Ministério Público e da Polícia Federal com comportamento pouco democrático. Eles acham que não precisam achar provas, apenas acusações.

Lula também citou as eleições em 2018. Apesar de já ter declarado a intenção de se candidatar, defendeu que a votação seja antecipada com uma eventual saída de Michel Temer.

 

O globo, n. 30628, 15/06/2017. País, p. 6