FIM DE FORÇA-TAREFA PROVOCA REAÇÃO

CLEIDE CARVALHO

DIMITRIUS DANTAS

GUSTAVO SCHMITT

07/07/2017

 

 

 

 

 

Polícia Federal desmonta equipe em Curitiba que atuava somente para a Lava-Jato

“O MPF espera que a decisão possa ser revista, a fim de que possam prosseguir regularmente ecom eficiência as investigações”

Nota dos procuradores da Lava-Jato

 
A decisão da Polícia Federal (PF) de dissolver grupos de trabalho dedicados às operações Lava-Jato e Carne Fraca, em Curitiba, provocou ontem uma forte reação entre os procuradores que atuam na maior operação contra a corrupção já feita no país. Em nota, os procuradores da força-tarefa disseram que a medida vai prejudicar as investigações e dificultar seu prosseguimento com a mesma eficiência que tiveram até aqui. “A medida é um evidente retrocesso. Por isso, o Ministério Público Federal espera que a decisão possa ser revista, com a consequente reversão da diminuição de quadros e da dissolução do Grupo de Trabalho da Polícia Federal na Lava Jato, a fim de que possam prosseguir regularmente e com eficiência as investigações contra centenas de pessoas e de que os bilhões desviados possam continuar a ser recuperados”, disseram os procuradores.

Citando o excesso de investigações pendentes devido aos cortes na Polícia Federal no último ano, os procuradores culparam o governo de Michel Temer de promover uma redução drástica do efetivo da PF na Lava-Jato.

“Hoje, o número de inquéritos e investigações é restringido pela quantidade de investigadores disponível. Há uma grande lista de materiais pendentes de análise e os delegados de polícia do caso não têm tido condições de desenvolver novas linhas de investigação por serem absorvidos por demandas ordinárias do trabalho acumulado”, salientou a nota.

 

PF: SEM OBJETIVO POLÍTICO

Em nota, a Polícia Federal atribuiu a mudança a uma decisão do delegado Igor Romário de Paula, coordenador da Lava-Jato na PF de Curitiba. Ontem, Igor negou que as mudanças tenham ocorrido por decisão de Brasília, com objetivo político ou que tenha sido recado para segurar as investigações.

— Teve contingenciamento de recursos. Mas a orientação é de não parar nenhum tipo de investigação por conta da redução de recursos. A gente vive numa incerteza de uma eventual mudança e de não ter recursos pra chegar até o final do ano, ainda que até hoje não tenha faltado — disse o delegado, reconhecendo, no entanto, que o efetivo da PF de Curitiba não é o ideal.

Em nota, a PF negou o esvaziamento da Lava-Jato em Curitiba e informou que a medida vai “priorizar ainda mais” as investigações de maior potencial de dano aos cofres públicos.

A dissolução do núcleo da força-tarefa da Polícia Federal em Curitiba foi gradual. Logo depois da posse do presidente Michel Temer. A mudança de governo coincidiu ainda com o início de sinais de desgaste na sinergia entre a PF e a força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba.

Entre julho de 2016 e fevereiro passado três delegados do grupo — Eduardo Mauat, Érika Marena e Marcio Anselmo — receberam novas funções e foram deslocados de Curitiba, apesar da experiência acumulada e da capacidade de identificar e cruzar informações relevantes.

Uma fonte ligada às investigações disse ao GLOBO que a saída dos três desarticulou, aos poucos, a capacidade do grupo de "fazer as coisas acontecerem".

A medida torna a operação da PF no Paraná semelhante à de locais como o Rio, onde existe uma força-tarefa do Ministério Público para a LavaJato, mas não da PF. A equipe passa a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (Delecor) — conforme noticiou ontem a revista “Época” em sua edição online.

A equipe, que chegou a ter 70 integrantes, 11 delas delegados, agora conta com 84 pessoas — 70 policiais e 14 peritos; 4 vão trabalhar remotamente do Espírito Santo, coordenados pelo delegado Márcio Anselmo, um dos pioneiros nas investigações, e que havia deixado a LavaJato. Os inquéritos da LavaJato e da Carne Fraca serão absorvidos por essa delegacia, assim como outras investigações de corrupção e lavagem de dinheiro.

 

INVESTIGAÇÕES ESTRATÉGICAS

Embora o eixo da Lava-Jato tenha virado mais recentemente para Brasília e Rio, no Paraná encontram-se investigações importantes, relacionadas aos expresidentes Lula e Dilma Rousseff, além de Eduardo Cunha, Antonio Palocci e o delator Marcelo Odebrecht. Segundo a PF, restam no Paraná 80 inquéritos da Lava-Jato, além de 30 decorrentes das delações da Odebrecht que sequer foram iniciados.

— A Polícia Federal não tem mais dinheiro para passaporte. A força-tarefa da Polícia Federal na operação Lava Jato deixou de existir. Não há verbas para trazer delegados. Mas para salvar o seu mandato, Temer libera verbas à vontade", escreveu Lima, referindo-se à liberação de emendas parlamentares pelo governo — criticou o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, numa rede social, único procurador que comentou o caso isoladamente.

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Cunha negocia termos para delação que pode atingir Temer

07/07/2017

 

 

Tratativas estão mais avançadas do que as do doleiro Lúcio Funaro

 

O ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tenta negociar acordo de colaboração premiada com os investigadores da Operação Lava-Jato, conforme informou o colunista do GLOBO Lauro Jardim. As tratativas estão mais avançadas do que as do doleiro Lúcio Bolonha Funaro, antigo parceiro de Cunha, que foi transferido ontem do presídio da Papuda para a Superintendência da Polícia Federal em Brasília. Condenado a 15 anos de prisão pelo juiz Sergio Moro, Cunha permanece preso no Complexo Médico-Penal, no Paraná.

Ambas as propostas de delações provocam temor no Palácio do Planalto, porque podem comprometer o presidente Michel Temer, já atingido pelas revelações dos donos e executivos do Grupo J&F, que controla da JBS. Funaro já admitiu ter atuado como o operador financeiro para o PMDB. E Temer manifestou desconforto com uma suposta pressão feita por Cunha da prisão.

Em março, a Justiça do Distrito Federal encaminhou ao presidente 19 perguntas feitas por Eduardo Cunha. Cinco dias depois, Temer disse ao empresário Joesley Batista, dono da JBS, em encontro no Palácio do Jaburu no qual foi gravado pelo empresário, que estava sendo “fustigado” por Cunha.

Na conversa no Jaburu, Joesley diz que está “de bem” com o ex-deputado, e ouve de Temer: “Tem que manter isso, viu?”. Segundo investigadores, a resposta de Temer configuraria um aval para a compra do silêncio de Cunha. O presidente é investigado no Supremo Tribunal Federal por suposta tentativa de obstrução à Justiça.

Desde que foi preso, em outubro do ano passado, Cunha nega por meio de cartas e de seus advogados a intenção de firmar acordo de delação. Porém, nos bastidores, conseguiu driblar a resistência de procuradores e negocia termos para um acordo.

O globo, n.30650 , 07/07/2017. PAÍS, p. 7