Conselho de Ética da Câmara ignora lista de Fachin
Daiene Cardoso e Julia Lindner
16/04/2017
Para membros de órgão, pedido de cassação exige provas; com 39 colegas investigados, deputados dizem que inquérito é fase inicial
O novo Conselho de Ética da Câmara considera insuficientes as autorizações de abertura de inquéritos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) contra 39 deputados federais para justificar a instauração de processos de cassação de mandato. Dos 21 titulares do órgão ouvidos pelo Estado, 12 afirmaram que somente provas de crime cometido no exercício do mandato levarão a ações por quebra de decoro parlamentar em razão do conteúdo das delações de executivos e ex-executivos da Odebrecht.
Segundo os conselheiros empossados na semana passada, inquérito é fase inicial de processo e somente a partir da formalização da denúncia – em caso de a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedir ao STF para tornar investigados réus – o processo disciplinar pode ganhar força, principalmente se tratar de episódios relativos à atual legislatura. Parlamentares, porém, disseram já saber que haverá implicação de atos cometidos neste mandato.
“À medida que tiver prova e (o representado) virar réu, aí a gente vai ter de trabalhar”, afirmou o deputado Izalci Lucas (PSDB-DF), membro do órgão responsável pelo julgamento da conduta de seus pares.
O deputado Aluísio Mendes (PTN-MA) disse que é cedo para instaurar qualquer procedimento no colegiado. “Se o STF autorizar é porque já tem indícios. Se transformar em denúncia, é porque os indícios são fortes”, afirmou. “Ser réu é meio caminho andado”, disse o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).
Os parlamentares esperam pelo surgimento de fato relevante para discutir eventual punição aos colegas investigados. “Ser réu não é suficiente, tem de ter um fato”, resumiu o deputado Augusto Coutinho (SD-PE). “Se tiver prova cabal, meu voto será pela punição”, disse o deputado Mauro Lopes (PMDB-MG). A avaliação é a mesma do primeiro-vice-presidente do conselho, João Marcelo Souza (PMDB-MA): “No meu entender, tem de ter prova cabal, senão não vamos a lugar algum”.
Entre as punições para a condenação em um processo no Conselho de Ética, a mais radical é a cassação. Valmir Prascidelli (PT-SP) considerou que eventual perda de mandato deve ter como base condenação ou indícios contundentes. “Não é porque foram citados em delação que são culpados. Não faz sentido abrir processo antes do trânsito em julgado ou ter evidências bastante robustas, como no caso do Eduardo Cunha (deputado cassado, preso e condenado pela Operação Lava Jato)”, afirmou Prascidelli.
Representantes do PP – um dos alvos da força-tarefa que investiga esquema de corrupção e desvios na Petrobrás – também exigem a existência de condenação ou de provas para dar prosseguimento a ações. “O conselho não pode julgar por indício, sem nenhum tipo de prova. Mas isso não impede a admissibilidade do processo de caminhar”, disse Cacá Leão (PP-BA).
Seu colega de bancada Hiran Gonçalves (PP-RR) defendeu o “princípio pétreo da presunção de inocência” e recomendou cautela para que não haja prejulgamento. “Colocar fogo nas coisas não é bom para o País.”
Na terça-feira passada, após o Estado revelar a lista do ministro-relator da Lava Jato, Edson Fachin, o PSOL anunciou que vai analisar as acusações contra os deputados e avaliar se entrará com representações por quebra de decoro. O colegiado foi instalado no mesmo dia e elegeu Elmar Nascimento (DEM-BA) para presidi-lo. Ele é aliado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), um dos parlamentares com abertura de inquérito autorizada.
Blindagem. Deputados disseram temer que a composição do conselho atue para proteger investigados. “Forças antagônicas se juntaram no conselho para blindar os investigados”, disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), que foi relator dos processos de cassação de José Dirceu (PT) e André Vargas (ex-PT).
O deputado Sandro Alex (PSD-PR) disse que houve um acordo entre os grandes partidos para eleger Elmar, que teria um perfil mais favorável aos investigados. “Não acredito no funcionamento do conselho nos próximos dois anos. Ele foi composto para blindar”, afirmou. O parlamentar prevê que a maioria dos investigados será denunciada e considera graves os casos relacionados à atuação em medidas provisórias (MPs) para favorecer empresas. Alex está descrente sobre o andamento dos processos: “Os tentáculos de Cunha estão aí e influenciaram a eleição no conselho”.
Fogo no País
“Ser réu não é suficiente, tem de ter um fato.”
Augusto Coutinho (SD-PE)
DEPUTADO FEDERAL
“Colocar fogo nas coisas não é bom para o País.”
Hiran Gonçalves (PP-RR)
DEPUTADO FEDERAL
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Nenhum partido faz indicação para colegiado no Senado
16/04/2017
Entre fevereiro e março, a cada 2 anos, Conselho de Ética é formado; Mesa Diretora prevê compor órgão nesta semana
Nenhum partido indicou formalmente nomes para compor o Conselho de Ética do Senado. Diante da lista do ministro Edison Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), com pedidos de inquéritos sobre 24 senadores, o colegiado seria responsável por analisar eventuais denúncias por quebra de decoro parlamentar, que podem levar à cassação do mandato.
Segundo a Mesa Diretora do Senado, os conselhos da Casa sempre são instalados após as comissões permanentes e mistas, e as indicações devem começar a ser feitas nesta semana. Pelo regimento, no entanto, a retomada das atividades do colegiado está atrasada. A resolução prevê que a instalação, a cada dois anos, se dê entre fevereiro e março.
Cotado para comandar o Conselho de Ética pela quinta vez, o senador João Alberto (PMDB-MA) disse que ainda não houve a instalação da nova formação do órgão porque os partidos não indicaram os nomes, mas que tudo está correndo dentro da normalidade. Segundo ele, o presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), enviou na quarta-feira passada um ofício aos líderes solicitando as indicações.
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), não há “muita vontade” para o funcionamento do conselho neste momento. Ele disse que o seu bloco já tem os nomes para compor o colegiado. “Nós temos insistido na necessidade de que os partidos indiquem para que o conselho seja constituído. Não descarto a possibilidade de a gente solicitar isso no plenário na próxima semana”, afirmou.
Processo. Randolfe considera que seria impossível investigar os 24 senadores da “lista de Fachin” no conselho. “Tem de ocorrer [um eventual processo] conforme o julgamento for avançando. Se tornado réu, por exemplo, é uma situação mais gravosa. Eu acho que quem tem abertura de inquérito pelo menos não deveria estar apto a estar no conselho”, disse.
Apesar do entendimento de que apenas réus devem ser investigados pelo conselho, no ano passado, dois senadores tiveram denúncias aceitas pelo STF, Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), mas nenhum processo foi aberto. A última sessão do conselho ocorreu no dia 3 de maio de 2016, para a cassação do mandato do ex-senador Delcídio Amaral (sem partido-MS).
O Estado de São Paulo, n. 45106, 16/04/2017. Política, p. A6.