Janot: ‘Senti náusea’ ao ouvir gravação

Jefferson Ribeiro

06/07/2017

 

 

Procurador-geral diz que denúncia contra Temer tem uma ‘narrativa fortíssima’

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contou ter sentido “náuseas” ao ouvir a gravação entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer, que integra a denúncia em análise pela Câmara dos Deputados. A gravação, feita pelo dono da JBS, em conversa com Temer em encontro fora da agenda oficial, no Palácio do Jaburu, mostra negociações que teriam resultado no pagamento de R$ 500 mil em propina para o ex-assessor presidencial Rodrigo Rocha Loures.

— Eu fiquei chocado e senti náusea. Fiquei enjoado mesmo — disse Janot, em entrevista ao jornalista Roberto D’Avila, da GloboNews, na noite de ontem.

Janot acrescentou que as gravações não foram combinadas com a PGR:

— De jeito algum. Se o Ministério Público provoca qualquer ato de colaboração ele está anulando toda a delação. Essa gravação foi feita uns 30 dias antes de começarmos a negociar com essas pessoas.

 

IMUNIDADE NEGOCIADA

Segundo ele, o acordo prevendo o perdão judicial aos empresários foi a única exigência deles e, diante dos fatos graves narrados pelos irmãos Joesley e Wesley Batista, foi obrigado a aceitá-la, porque, do contrário, não teria como investigá-los.

— Eles são criminosos e não perdem essa condição, são réus colaboradores... Eles aceitaram negociar tudo, menos a imunidade — afirmou Janot.

Segundo ele, a denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal tem uma forte narrativa, apesar de reconhecer que ainda terá que produzir mais provas para ligar a mala de dinheiro recebida por Loures a Temer.

— A denúncia tem a seguinte narrativa. Um empresário investigado em primeira instância por eventuais ilícitos tem uma conversa, que ele grava, com um ex-deputado federal, acertando a ida dele à residência do presidente da República à noite, sem testemunhas. Ele chega ao palácio presidencial e não é sequer identificado na porta. Ele entra, vai a uma sala que está na parte de baixo do palácio, e tem uma conversa muito pouco republicana com o presidente. E nessa conversa, o presidente indica como interlocutor de confiança dele esse deputado federal com quem esse empresário tinha acertado a ida dele ao palácio, porque os outros interlocutores estavam impedidos de continuar na interlocução — descreveu Janot.

— Ele (Joesley) se entrevista dias depois com esse interlocutor, acerta alguns atos ilícitos com esse interlocutor, acerta o pagamento de propinas com esse interlocutor, que depois é pilhado em São Paulo com uma mala contendo R$ 500 mil. E esse interlocutor é a pessoa indicada como homem de confiança do mais alto dignatário da República para fazer negociações em nome dele. Essa narrativa é fortíssima. Se isso é fraco eu não sei o que seria forte — acrescentou.

Segundo Janot, ainda há duas investigações em curso que podem resultar em denúncias contra o presidente.

— A investigação de obstrução de Justiça está mais avançada que a de organização criminosa.

O procurador disse que o seu pior dia à frente da PGR foi quando prenderam seu ex-colega, o procurador Ângelo Goulart Villela:

— Eu pedi que me informassem quando ele fosse preso. Quando me ligaram, eu passei mal e vomitei quatro vezes. (Jeferson Ribeiro)

O globo, n.30649 , 06/07/2017. PAÍS, p. 5