Delações citam beneficiários de R$ 1,68 bilhão

Daniel Bramatti Marcelo Godoy

16/04/2017

 

 

Depoimentos de executivos da Odebrecht permitem rastrear pagamentos ilegais a quase 500 políticos, lobistas e servidores

 

 

As delações que a Odebrecht apresentou à Justiça indicam os beneficiários de pelo menos R$ 1,68 bilhão pago em propinas e contribuições ilegais de campanha. Os recursos foram distribuídos a quase 500 políticos, lobistas, empresários e dirigentes de estatais no Brasil e no exterior.

Trata-se de um quadro parcial, já que a máquina montada pela empreiteira para garantir o superfaturamento de obras e o desvio de recursos públicos movimentou valores muito maiores. Segundo delação do ex-executivo Hilberto Mascarenhas, o chamado Setor de Operações Estruturadas – departamento de propinas da Odebrecht – fez pagamentos de US$ 3,37 bilhões entre 2006 e 2014. Em valores atuais, isso equivale a cerca de R$ 10,6 bilhões.

O rastreamento de R$ 1,68 bilhão foi feito pelo Estado com base no cruzamento de dados de três fontes de informação: os 337 pedidos de abertura de inquérito e petições assinadas pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF); os depoimentos que executivos da Odebrecht prestaram, como parte de seus acordos de delação premiada; e a planilha de pagamentos entregue aos procuradores por Benedicto Júnior, um dos delatores.

Nem sempre é possível contabilizar valores. Em muitas das operações citadas pelos executivos da empresa em seus depoimentos, por exemplo, não há detalhamento de quanto foi pago para os agentes públicos envolvidos.

Da fatia dos recursos em que é possível identificar o beneficiário, a maior parte foi para representantes do PT e do PMDB, partidos que dividiram o poder nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Mas uma parcela expressiva foi destinada a líderes do PSDB, principal partido de oposição durante as gestões petistas.

Os desembolsos bilionários eram vistos pela Odebrecht como um investimento. O grupo empresarial negociou favores com políticos em todas as esferas de poder – de vereadores em cidades pequenas, como Santa Gertrudes (SP), a ocupantes do Palácio do Planalto. Com o dinheiro distribuído, a empresa comprou a aprovação de medidas tributárias que a beneficiaram. Pagou ainda comissões para obter benesses em contratos de infraestrutura.

A empreiteira atendeu a pedidos e também foi proativa, ao oferecer contribuições a políticos que se alinhavam a seus interesses. Procurou ainda quebrar resistências de indivíduos e grupos que identificou como potenciais obstáculos. Quanto mais influentes os políticos, maiores eram os valores com os quais eram contemplados.

Ranking. No topo do ranking de pagamentos compilado pelo Estado – cujas posições ainda podem variar, a depender das investigações e da revelação de novos documentos – estão, além de representantes do PT, do PMDB e do PSDB, um ex-diretor da Petrobrás e nomes ligados aos governos de Angola e Venezuela.

Dos políticos brasileiros, estão em posição de destaque o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (PT), os senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e José Serra (PSDB-SP) e o ministro e ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD).

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20 nomes concentram 67% da verba rastreada

16/04/2017

 

 

Lobista é quem mais recebeu individualmente recursos; primeiro político da lista é Cabral, com R$ 97,9 milhões

 

 

É de um intermediário de um contrato do governo federal – a compra de submarinos franceses pela Marinha – o título de maior recebedor individual de recursos supostamente ilícitos pagos pela Odebrecht até agora rastreados. Trata-se do lobista José Amaro Ramos, com ¤ 40 milhões (R$ 133,3 milhões). Só no quinto posto da lista das pessoas físicas aparece o primeiro político: Sérgio Cabral (PMDB), ex-governador do Rio, com R$ 97,9 milhões.

Levantamento do Estado mostra o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (PT) envolvido em repasses que chegaram a R$ 93 milhões – isso sem contar os R$ 150 milhões entregues para as campanhas de Dilma Rousseff em 2010 e 2014.

A lista dos dez maiores recebedores de recursos tem ainda: o senador Aécio Neves (PSDBMG), com R$ 65,5 milhões supostamente obtidos em campanhas eleitorais, fraudes em contratos de estatais e licitações; um ministro angolano não identificado (R$ 63 milhões); o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (PMDB), que teria embolsado R$ 47,7 milhões em campanhas eleitorais, e o ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD), com R$ 41,2 milhões relacionados à fundação de seu partido e a contratos no Ministério das Cidades e na Prefeitura de São Paulo.

Os 20 primeiros nomes da lista concentram 67% dos recebimentos. Há nela ainda o senador José Serra (PSDB-SP), o exministro Antonio Palocci (PT), o ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PP), o senador Romero Jucá (PMDB-RR), o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDBRJ), o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), os governadores do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), e de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e o deputado federal Julio Lopes (PP-RJ). Procurados pelo Estado, todos negaram o recebimento de recursos ilegais. 

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45106, 16/04/2017. Política, p. A8.