Justiça nega liberdade a Palocci e Vaccari

Cleide Carvalho

06/07/2017

 

 

Desembargador justifica decisão classificando os crimes de ‘esquema amazônico de corrupção’

 

“A Lava-Jato já revelou um quadro perturbador de corrupção sistêmica, envolvendo diretores da maior estatal nacional, detentores de mandatos eletivos e empresas e contratos de fachada”

João Gebran Neto

Desembargador do TRF-4

O desembargador João Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), negou ontem pedido de liberdade ao ex-ministro Antonio Palocci Filho, condenado a 12 anos de prisão, e ao ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, condenado a mais de 30 anos de prisão. Agora, os pedidos serão analisados pelo colegiado da 8ª Turma do TRF-4, que, no último dia 27, reformou decisão do juiz Sergio Moro e absolveu Vaccari na primeira ação em que ele havia sido condenado, com pena de 15 anos e 4 meses de prisão. Integrante da 8ª Turma, Gebran foi voto vencido.

No caso de Palocci, Gebran considerou que a sentença de Moro, proferida no último dia 26, reforçou os pressupostos do pedido de prisão preventiva do réu. “Não há mais somente boa prova de autoria e materialidade da prática de um crime. Há agora certeza, ainda que sujeita a eventual revisão em recursos”, escreveu o magistrado.

O desembargador lembrou que outros pedidos de liberdade de Palocci já foram negados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e que a preventiva foi decretada para preservar a ordem pública, num quadro de corrupção sistêmica.

A defesa de Palocci havia alegado ao TRF-4 que a prisão preventiva do ex-ministro era uma forma de “antecipação da pena” e que não haveria, no caso, “risco à instrução criminal”. A tese foi negada por Gerbran.

“As diversas fases da Operação Lava-Jato já revelaram um quadro perturbador de corrupção sistêmica, envolvendo diretores da maior estatal nacional, detentores de mandatos eletivos e empresas e contratos de fachada, esquema este organizado, em sua essência, para pagamento de propinas”, escreveu o desembargador.

 

EX-MINISTRO NEGOCIA DELAÇÃO

Segundo ele, “neste esquema amazônico de corrupção, diante do envolvimento de centenas de investigados e denunciados, certamente a quantidade de medidas cautelares restritivas de liberdade — em números absolutos — talvez impressione, contudo mostrase bastante proporcional ao contexto investigado”.

Palocci foi condenado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo que envolvia pagamentos da Odebrecht ao marqueteiro do PT, João Santana, e à sua mulher Mônica Moura. O dinheiro teria sido repassado ao casal em contas no exterior, por meio do setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, o chamado departamento de propina.

De acordo com a sentença, pelo menos US$ 10,2 milhões pagos em propina seriam referentes a contratos firmados pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu — de propriedade da Odebrecht — com a Petrobras, por intermédio da Sete Brasil.

Parte dos valores destinados a Palocci eram lançados em uma planilha, na qual o ex-ministro era identificado como “italiano”. Nas delações premiadas da Odebrecht, pelo menos três ex-executivos da empreiteira confirmaram que o codinome se referia a Palocci.

O petista contratou um escritório de advocacia para negociar um acordo de colaboração premiada com a Lava-Jato. Ainda não é possível dizer se a força-tarefa aceitará as informações trazidas por Palocci em troca de benefícios penais.

Para solicitar a soltura de Vaccari, os advogados do ex-tesoureiro usaram como base a recente decisão da 8ª Turma do TRF-4, que absolveu o petista da condenação de 15 anos e quatro meses de prisão determinada por Moro.

Gebran é o relator de todos os processos da Lava-Jato no TRF-4. Ao relatar a apelação anterior de Vaccari, ele considerou que a pena foi correta, mas foi vencido pelo voto dos outros dois desembargadores da turma, que consideraram as provas insuficientes, e a condenação baseada apenas na palavra de delatores, o que é proibido por lei.

A defesa de Vaccari argumentou agora que a prisão do petista havia sido pedida com base nos argumentos da ação na qual ele foi absolvido, não restando motivo para mantêlo preso. Moro havia se manifestado uma segunda vez pela manutenção da prisão, mas, segundo a defesa, teria apenas citado que ela seria extensão do primeiro decreto de prisão.

Ao negar a liberdade, ontem, Gebran afirmou que foram identificadas outras condutas de Vaccari, em outras ações, que justificam a necessidade da prisão preventiva para coibir a reiteração delitiva. Vaccari foi condenado por Moro em mais quatro ações penais, num total de 32 anos de prisão.

O advogado de Vaccari, Luiz Flávio Borges D’Urso, afirmou em nota que a defesa insiste que não houve um segundo decreto de prisão preventiva, e que a prisão foi estendida no caso em que o ex-tesoureiro do PT foi absolvido.

O globo, n.30649 , 06/07/2017. PAÍS, p. 07