Dantas quer reabrir briga da Brasil Telecom

Josette Goulart

16/04/2017

 

 

Banqueiro diz que esquema do governo petista provocou sua retirada da empresa

 

 

 

Quase uma década depois de encerrada uma das maiores guerras societárias do País, o banqueiro Daniel Dantas quer reabrir a disputa. Há cerca de dois meses, entrou com ação na Justiça de Nova York contra o Citibank, um dos seus ex-sócios na operadora de telefonia Brasil Telecom, cobrando uma indenização de bilhões de dólares. O argumento de Dantas é que ele teria sido vítima de um grande esquema de corrupção do governo petista, revelado agora pela Operação Lava Jato.

A corte de Nova York já aceitou previamente o processo, mas deu prazo até 26 de abril para que as duas partes deem mais detalhes sobre seus argumentos. O Citibank tenta convencer o juiz Jesse Furman de que a ação não tem fundamento, relembrando processos parecidos que já tramitaram pelas cortes americanas e que foram encerrados há anos.

Dantas e Dório Ferman, seu sócio no Opportunity, por sua vez, alegam que foram coagidos a assinar o acordo que encerrou todas as disputas judiciais em torno da Brasil Telecom, no fim de 2008. O acordo era necessário para a fusão entre a Oi e a Brasil Telecom, que criaria a “supertele” nacional.

Para comprar a Brasil Telecom, a Oi (antiga Telemar) exigia que todas as quase 200 disputas judiciais entre os sócios da tele fossem encerradas. A desistência rendeu a Daniel Dantas e seu fundo Opportunity cerca de R$ 1 bilhão, correspondente à sua participação societária na empresa à época.

Agora, Dantas quer retomar a discussão e pede mais alguns bilhões. O argumento é que sua destituição do bloco de acionistas da Brasil Telecom, capitaneada pelos fundos de pensão estatais e pelo Citibank, seus ex-sócios, foi feita tendo por pano de fundo interesses escusos do governo petista, revelados pela Operação Lava Jato.

Na ação, Dantas diz que as operações Satiagraha (que investigava esquema de corrupção e lavagem de dinheiro) e Chacal (que investigou esquema de espionagem no setor de telecomunicações), feitas pela Polícia Federal durante o governo Lula, e que chegaram a levá-lo à prisão, teriam sido encampadas pelo governo, e foram totalmente encerradas a seu favor.

Tiroteio. Em 103 páginas, o banqueiro faz uma série de acusações contra os ex-sócios. Uma delas é de que o Citibank atuava para facilitar esquemas do governo. Um deles teria sido o caso da refinaria de Pasadena, nos EUA, comprada pela Petrobrás. Investigações recentes mostram que a refinaria foi adquirida com um sobrepreço que seria usado para o pagamento de propinas. A avaliação da refinaria foi feita pelo Citibank.

A Petrobrás informou, por nota, que o caso Pasadena foi investigado dentro da empresa e as conclusões enviadas às autoridades, mas não disse quais foram os resultados. O Citibank afirmou que a ação de Daniel Dantas não tem fundamento.

O banqueiro também questiona a participação da Andrade Gutierrez na criação da “supertele”. A Andrade era uma das sócias da Oi, que só pôde comprar a Brasil Telecom por causa de uma mudança na legislação feita às vésperas do negócio e assinada pelo ex-presidente Lula e por Dilma Rousseff, então chefe da Casa Civil.

Recentemente, a Andrade admitiu atos de corrupção para obter contratos com o governo em um acordo com o Ministério Público Federal. As delações dos executivos, em especial do ex-presidente da empresa, Otavio Azevedo, porém, não relatam qualquer caso de corrupção que envolva o setor de telefonia. Juliano Breda, advogado de Azevedo, não quis falar do assunto.

Os argumentos apresentados por Dantas não passam, por enquanto, de acusações. O banqueiro não apresentou nenhuma prova no processo. Alguns argumentos já foram usados anteriormente, como o de que os ex-sócios compraram juízes no Brasil para destituí-lo da gestão da Brasil Telecom. Dantas diz que computadores de Alberto Guth, dono da Angra Partners, que assumiu a gestão da Brasil Telecom quando os fundos de pensão e o Citibank conseguiram tirá-lo da empresa, trazem planilhas em que nomes de juízes aparecem do lado de valores e porcentuais, numa alusão a supostos pagamentos de propinas. Guth não quis falar sobre o assunto.

No ano passado, Dantas também já havia aberto ações contra a União e os fundos de pensão estatais, especialmente a Previ, do Banco do Brasil. No caso dos fundos, os processos versam sobre diferentes temas, incluindo a sociedade que possuem na Vale. Dantas pede cerca de R$ 4 bilhões dos fundos de pensão. A Previ também não quis comentar o assunto.

Os opositores de Dantas dizem que ele tenta reescrever a história com uma narrativa que o coloca como vítima, e afirmam que, apesar de todo o argumento de que foi o PT que fez um esquema para derrubá-lo, as brigas societárias começaram muito antes, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso.

Antes da briga societária em torno da Brasil Telecom, Dantas era tido como candidato a ser um dos maiores banqueiros do País, à frente do Opportunity. Depois da briga e de algumas operações da PF, ele se tornou um gestor de family office, ou seja, administra seus próprios recursos. O banqueiro e o Opportunity não quiseram falar sobre o assunto.

 

Banqueiro perdeu disputa em corte arbitral

Além de brigar com os sócios do CVC Opportunity, o fundo que administrava a Brasil Telecom, o banqueiro Daniel Dantas também abriu uma disputa com a Telecom Italia, sócia estratégica no empreendimento. Em um procedimento arbitral internacional, espécie de Justiça privada, Dantas pedia uma indenização de US$ 15 bilhões, alegando que a Telecom Italia teria cometido uma série de crimes para manipular investigações policiais e financiar a imprensa em uma campanha contra ele.

A empresa teria, segundo ele, interceptado informações sigilosas da empresa de telefonia para repassar a policiais, o que teria resultado em duas operações contra Dantas e seus sócios, a operação Chacal e a Satiagraha. No ano passado, os juízes arbitrais entenderam que Dantas não tinha razão no pleito.

 

PARA LEMBRAR

Na época da privatização do sistema Eletrobrás, os fundos de pensão estatais se tornaram sócios de Daniel Dantas para comprar o que seria a Brasil Telecom, com atuação no Norte, Centro- Oeste e Sul do País. Dantas administrava, por meio do Opportunity, um fundo chamado CVC Opportunity, em que estavam os fundos de pensão, com 45%, o Citibank, com 45%, e o próprio Opportunity, com 10%. O CVC era o dono da Brasil Telecom e tinha como sócio estratégico a Telecom Italia.

Desavenças na gestão fizeram com que os fundos de pensão iniciassem uma briga para destituir Dantas.

 

Mais tarde o Citibank se juntou aos fundos de pensão na briga, que se arrastou por um bom tempo. Em 2008, os sócios chegaram a um acordo de encerrar toda e qualquer disputa para efetivar a venda para a Oi.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45106, 16/04/2017. Economia, p. B5.