FMI aponta novas ameaças à estabilidade

Rolf Kuntz

20/04/2017

 

 

De acordo com relatório do Fundo, populismo e políticas mal conduzidas surgem como riscos quando o mundo parece recuperar-se

 

 

Barreiras comerciais, juros altos e afrouxamento da regulação bancária, riscos associados às promessas do presidente Donald Trump, podem ser as novas ameaças ao equilíbrio financeiro, adverte o Fundo Monetário Internacional (FMI). Os emergentes, incluído o Brasil, estarão entre os mais prejudicados, se esses riscos se materializarem.

Nove anos depois do início da última grande crise, a maior desde a depressão dos anos 1930, a economia mundial parece recuperar-se com firmeza. A segurança dos bancos aumentou, com a imposição de regras mais severas, embora ainda soem sinais de alarme em alguns mercados. O cenário melhorou muito, após um longo e trabalhoso ajuste, mas o otimismo dos mercados poderá sumir, se prevalecer a pior combinação de políticas. O aviso está no Relatório de Estabilidade Financeira Global, apresentado ontem pelo diretor do Departamento Monetário e de Mercado de Capitais do FMI, Tobias Adrian.

Os perigos do protecionismo e da menor cooperação internacional vêm sendo apontados em várias manifestações de dirigentes do FMI. Não se pensa em nenhum país em particular, disse Adrian. Em muitos países, acrescentou, uma virada populista questiona os benefícios do livre-comércio e dos vínculos globais. “No FMI, é claro, nós acreditamos no comércio como crucialmente importante para o crescimento global.” Vários países têm sido atingidos pela onda populista e nacionalista, mas a exposição referiu-se principalmente às mudanças em discussão nos EUA.

Se as melhores escolhas forem feitas, o investimento será estimulado, a atividade ganhará impulso e a segurança financeira será reforçada. Boas políticas deverão incluir juros ainda baixos, estímulos fiscais ao crescimento, redução da carga tributária sobre empresas e medidas para corrigir o excesso de endividamento na China e a vulnerabilidade de bancos europeus. Parte desses bancos ainda está muito exposta a devedores duvidosos. Nos Estados Unidos, os mercados têm apostado em estímulos fiscais, investimentos em infraestrutura e alívio dos impostos. Mas essas políticas, se mal conduzidas ou mal combinadas, podem gerar desafios enormes.

Um forte aumento de juros pode ser necessário para corrigir os excessos de uma política de estímulos mal calibrada. Isso pressionaria empresas com ganhos já insuficientes, ou mesmo pouco mais que suficientes, para a cobertura das obrigações financeiras. As novas pressões poderiam, num dos cenários apresentados no relatório, comprometer empresas com ativos combinados de cerca de US$ 4 trilhões. Esse conjunto corresponde a quase um quarto do universo empresarial considerado na análise.

Juros muito altos e medidas protecionistas poderiam prejudicar de modo especial economias emergentes. Um forte aperto financeiro poderia adicionar US$ 130 bilhões ao endividamento das companhias mais vulneráveis. A dívida desse grupo é estimada em US$ 590 bilhões. Um aumento das barreiras comercias poderia acrescentar até US$ 235 bilhões à divida já existente. No Brasil, a dívida empresarial com cobertura insuficiente corresponde, de acordo com a estimativa do FMI, a cerca de 10% do estoque.

Essa parcela cresceria cerca de três pontos porcentuais, no caso de maior protecionismo, e quase seis pontos, na hipótese do aumento de crédito. Num grupo de nove emergentes selecionados, as companhias mais afetadas num surto protecionista seriam as chinesas, com aumento de cerca de oito pontos porcentuais no estoque de dívidas em risco, já superior a 10%.

Exercícios como esse podem parecer muito abstratos, mas dão uma ideia do estrago causado por um retrocesso nas políticas fiscais - com consequente correção por meio dos juros - e nas políticas de comércio exterior. Se a esse quadro se adicionar um afrouxamento significativo da regulação bancária nos Estados Unidos, os danos serão agravados pelo deslocamento dos negócios financeiros na direção do mercado menos sujeito a controle.

 

Ponto de vista. Adrian defendeu o comércio como crucial para o crescimento global

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Reformas ajudarão crescimento brasileiro, diz Meirelles

Rolf Kuntz

20/04/2017

 

 

A economia brasileira deve entrar em 2018 crescendo a um ritmo anualizado de 3%, disse ontem o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, numa entrevista na sede do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington. Pela projeção do Fundo, o Brasil deve crescer no próximo ano 1,7%. Para 2017 a estimativa é de apenas 0,2%. No trimestre final deste ano, o produto interno bruto (PIB) já deverá ser 2,7% maior que nos últimos três meses do ano passado.

Entre os fatores favoráveis à reativação, Meirelles incluiu a redução do endividamento das famílias e das empresas e a necessidade de recomposição de estoques. Mas deu ênfase à melhora das expectativas. Essa melhora dependerá em grande parte, segundo ele, do avanço dos ajustes e, de modo especial, da aprovação da reforma da Previdência.

O ministro reafirmou a esperança de ver a reforma aprovada no Congresso até o fim do primeiro semestre. A primeira etapa, a votação na Câmara dos Deputados, deverá ser concluída em maio, pelos seus cálculos. Não haverá, no entanto, nenhum desastre, se a tramitação no Senado só terminar em agosto, admitiu.

Ele também manifestou a expectativa de ver consagrado um texto muito parecido com aquele já indicado pelo relator, sem novas mudanças importantes. As alterações negociadas até agora, como a redução da idade mínima para mulheres de 65 para 62, pouco afetarão o resultado final, concedeu.

O bom andamento da reforma poderá afetar de forma importante as expectativas, favorecendo a imagem do Brasil e a canalização de recursos para a recuperação da economia. A importância dessa reforma também foi acentuada pelos economistas do FMI nas avaliações das condições de crescimento do País e da evolução de suas contas públicas nos próximos cinco anos.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45110, 20/04/2017. Economia, p. B7.