Cunha tinha mapa de cargos loteados nos governos do PT

 ANDRÉ DE SOUZA

DIMITRIUS DANTAS

27/07/2017

 

 

À Justiça, ex-presidente da Caixa diz que foi ameaçado por peemedebista

 Dois documentos encontrados nas buscas feitas nos endereços do expresidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) durante a Operação Catilinárias, no fim de 2015, apresentam um mapa do loteamento de cargos entre o PMDB na Câmara e o PT durante os governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Em um deles, manuscrito, Cunha desenhou uma tabela comparando as benesses concedidas ao PMDB nas duas gestões. As páginas foram enviadas pelo Supremo Tribunal Federal e anexadas ao processo em Curitiba que investiga a participação dos operadores Jorge e Bruno Luz em um contrato da Petrobras que teve o ex-deputado como um dos beneficiários.

Em março deste ano, Cunha foi condenado a 15 anos e quatro meses de prisão por ter recebido vantagens indevidas por influenciar a compra, pela Petrobras, de um campo de exploração de petróleo em Benin. Ele está preso desde outubro do ano passado em Curitiba, e vem tentando negociar um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF).

Sob o argumento de que Cunha pode voltar a cometer crimes e em razão de sua intensa movimentação financeira e ocultação de dinheiro no exterior, além da influência que exerce sobre seus “asseclas” na Câmara, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu a manutenção da prisão do ex-parlamentar. A manifestação aconteceu em parecer contrário a recurso da defesa de Cunha.

 

RISCO DE NOVOS CRIMES

Janot avaliou que “é elevado o risco de reiteração delitiva caso seja posto em liberdade”. Embora a Câmara já tenha cassado o mandato do ex-deputado, em setembro, o procurador-geral também diz que “seu potencial delitivo, hoje, está concentrado mais na capacidade de influenciar seus asseclas, ainda ocupantes de cadeiras no Congresso Nacional, do que propriamente no abuso das prerrogativas de parlamentar”.

Janot argumentou que Cunha usava terceiros, sua “tropa de choque", para obstruir o funcionamento de órgãos da Câmara, como CPIs e o Conselho de Ética, que analisou seu processo de cassação. Cunha é acusado ainda de ter articulado a contratação de uma empresa pela CPI da Petrobras para investigar delatores da Lava-Jato, de forma a desacreditá-los.

A suspeita de manipulação dos trabalhos da CPI foi reforçada ontem, em depoimento à Justiça Federal, pelo ex-presidente da Caixa Econômica Jorge Hereda, que ocupou o cargo nas gestões de Dilma. Ele disse que Cunha o ameaçou, com uma eventual convocação para prestar depoimento na comissão parlamentar, caso projetos de seu interesse não tivessem prioridade de tramitação no banco. Hereda depôs como testemunha em ação que investiga pagamentos de propina a Cunha para aprovação de projetos de liberação de crédito do FI-FGTS a diferentes empresas.

Segundo Hereda, uma conversa com Cunha ocorreu na Câmara em 2014. Na ocasião, o então deputado teria ameaçado convocá-lo à CPI da Petrobras.

— O senhor Eduardo Cunha reclamava do andamento dos projetos, mas que a gente andava muito rápido para a Petrobras. Ele falou que, se a gente aprovasse os da Petrobras antes das outras, ele ia me convocar na CPI da Petrobras — afirmou Hereda.

O ex-presidente da Caixa não respondeu sobre como uma eventual convocação à CPI poderia interferir no andamento dos projetos.

— Isso tem de ser perguntado para ele. Eu entendi como uma ameaça para me causar constrangimento — disse, antes de acrescentar que acabou não sendo convocado pela CPI: — (O requerimento de convocação) não foi aprovado pela CPI, a CPI não aprovou. Não fui.

 

DIRETORIA NA PETROBRAS

Na documentação apreendida que trata das indicações políticas nos governos petistas, em coluna referente a Lula, consta que o PMDB teria direito à Diretoria Internacional da Petrobras e à metade da Diretoria de Abastecimento da estatal. Durante a Lava-Jato, as investigações mostraram que Nestor Cerveró e Jorge Zelada, que ocuparam a Diretoria Internacional, eram representantes do partido na estatal.

Em outro documento, há uma lista dos cargos vinculados à bancada do PMDB na Câmara: três vice-presidências da Caixa, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), a Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, a Diretoria Comercial da Infraero, as delegacias da Agricultura e um cargo na “DNCOS”, possivelmente um erro de digitação para Dnocs, o Departamento Nacional de Obras contra as Secas.

O globo, n.30670 , 27/05/2017. PAÍS, p. 4