Gustavo Shmitt
25/07/2017
“A palavra propina foi inventada pelos empresários para tentar culpar os políticos (...). Se os políticos não tiverem coragem de mudar a legislação, de criar um fundo (...), o Brasil não vai ter jeito”
Luiz Inácio Lula da Silva
Ex-presidente
-SÃO PAULO- O Banco do Brasil e o Itaú transferiram R$ 419 mil das contas do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva para um depósito judicial. O resgate faz parte de um bloqueio total de R$ 606,7 mil de Lula e foi autorizado pelo juiz Sergio Moro, na semana passada, a título de reparação de danos à Petrobras, pela condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. Os valores ficarão congelados até o fim do processo. Caso o ex-presidente seja absolvido, o dinheiro será devolvido.
Com a transferência das contas feita hoje ainda faltam R$ 187 mil para serem retirados do petista. Há mais R$ 123,8 mil de Lula na Caixa Econômica Federal e R$ 63,7 mil no Bradesco.
Na quinta-feira da semana passada, Lula ainda teve mais R$ 9 milhões bloqueados em planos de previdência privada. A defesa do ex-presidente recorreu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) para ter os valores liberados. No entanto, o pedido liminar ainda não foi apreciado.
Em entrevista ontem à rádio Tiradentes, do Amazonas, Lula disse que o setor empresarial, com o aval do Ministério Público, tem se utilizado, nos acordos de colaboração premiada, da estratégia de dizer que o dinheiro doado oficialmente para candidatos e partidos é “propina”.
— A palavra propina foi inventada pelos empresários para tentar culpar os políticos, ou pelo Ministério Público. Por tudo o que leio na imprensa, os empresários sempre deram dinheiro para campanha. Eu não conheço um político em Manaus ou em São Paulo que vendeu a casa para ser candidato — disse Lula, em entrevista.
Em outras oportunidades, o ex-presidente já havia afirmado que os empresários delatores falam a palavra “propina” para agradar aos procuradores e, assim, conseguir a liberdade, depois de um longo tempo na prisão.
Na entrevista de ontem, o petista disse que os empresários sempre fizeram doações a políticos no Brasil.
— Todos (políticos) pedem dinheiro para empresário, desde que foi proclamada a República. A diferença é que agora transformaram as doações em propina, então ficou tudo criminoso.
Lula ainda aproveitou para defender a criação do fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões, que os congressistas tentam aprovar na reforma política que está em tramitação no Congresso.
— Se os políticos não tiverem coragem de mudar a legislação eleitoral, de criar um fundo de financiamento de campanha para que não fiquem mais dependentes de empresário, o Brasil não vai ter jeito.
“VERSÃO LIGHT”
Para o promotor Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Lula tentou minimizar a corrupção com a declaração.
— É uma barbaridade. A ideia é criar uma versão light diante de um contexto em que tudo está ruindo. As delações mostram um submundo que jamais foi imaginado. Quando o PT foi criado e pretendia chegar o poder, um das promessas que fazia é de que seria diferente, que seria um partido ético e que teria um compromisso profundo com o combate à corrupção — avaliou.
Na entrevista de ontem, o petista se irritou ao ser questionado sobre os motivos pelos quais teria dado tratamento “duro” aos seus críticos:
— O dia que você for acusado de ladrão, que te acusarem de lavagem de dinheiro, o dia em que seu neto vier perguntar se é verdade o que estão falando, você vai ser muito mais duro do que eu. Vai ficar com muito mais raiva do que eu, porque eu sou um homem controlado.
O globo, n. 30668, 25/07/2017. País, p. 5