Odebrecht diz ter ajudado com 'Carta ao Povo Brasileiro'

 Fabio Serapião / Beatriz Bulla / André Borges

14/04/2017

 

 

Durante a negociação do acordo de colaboração, o empreiteiro Emílio Odebrecht entregou à Procuradoria-Geral da República um relato no qual detalha sua relação com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele contou sobre as doações para todas as campanhas eleitorais, o lobby praticado junto ao petista e até a ajuda para formulação da famosa Carta ao Povo Brasileiro – texto divulgado na campanha de 2002.

“O nosso apoio financeiro se iniciou ainda quando ninguém o apoiava e não posso negar que fazíamos pagamentos em volumes consideráveis, mas também tenho de ressaltar que nosso apoio não foi apenas financeiro.

A Carta ao Povo Brasileiro, datada de 22 de junho de 2002, e feita com o propósito de acalmar o mercado financeiro, é um exemplo exato do tipo de apoio não financeiro que dávamos ao ex-presidente Lula. Essa carta tem muita contribuição nossa”, disse Emílio.

Segundo o patriarca da construtora, ele aproximou Lula do empresariado antes da primeira vitória do petista. “Recordome, particularmente, que, em 2001 e 2002, organizei uma série de encontros com empresários de diversos setores para apresentar o ex-presidente às suas ideias”, contou Emílio.

Após a eleição de 2002, quando Lula se elegeu presidente, Emílio contou que passou a se reunir para discutir temas empresariais de interesse da Odebrecht.

“Mantive reuniões periódicas com ele, por vezes, trimestrais.” Segundo ele, eram discutidos assuntos “compatíveis com as opções de políticas governamentais e projetos para o crescimento do País”. “Buscava entender também se o direcionamento estratégico que seria dado pelo governo Lula coincidiria com a nossa visão para determinados setores, tais como o petroquímico, de energia renovável e infraestrutura”, afirmou o empresário.

“Essas conversas permitiram- me ter uma melhor compreensão das políticas de governo e, por consequência, melhor direcionar as empresas da organização, bem como tentar influenciar que o ex-presidente adotasse políticas de governo que fossem coincidentes com os nossos interesses empresariais, sendo que muitas vezes eu obtive êxito”, disse Emílio.

Segundo o empresário, foram doados a Lula, em suas campanhas, R$ 20 milhões – parte por meio de caixa 2.

 

‘Greve’. Segundo o patriarca da empreiteira baiana, sua relação com o ex-presidente começou no início da década de 1980, pelas mãos do governador de São Paulo, o tucano Mario Covas (1930-2001). No período de redemocratização, ele conta que foi apresentado por Covas a Lula durante uma greve no Polo Petroquímico de Camaçari, na Bahia.

“Como a greve não contava com o apoio do sindicato e tínhamos dificuldade de dialogar com os empregados que comandavam a greve, pedi apoio a Mario Covas, que, por sua vez, me sugeriu que eu conhecesse Luiz Inácio Lula da Silva, dada a sua reconhecida liderança no ambiente sindical e sua capacidade de mediar diálogos entre líderes grevistas e empresários”, explicou Emílio. “O ex-presidente Lula teve papel importante na retomada dos diálogos e após um período de pelo menos duas semanas uma das maiores greves já enfrentadas pela indústria petroquímica teve fim.” Procurado para comentar o relato de Emílio, o Instituto Lula disse que o presidente não iria se pronunciar.

 

Encontros. Emílio afirma ter tido reuniões trimestrais com Lula após vitória em 2002

 

Contribuição

“A Carta ao Povo Brasileiro, feita com o propósito de acalmar o mercado financeiro, é um exemplo exato do tipo de apoio não financeiro que dávamos ao ex-presidente Lula. Essa carta tem muita contribuição nossa.”

Emílio Odebrecht

EMPRESÁRIO

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Lula, Aécio e Temer são os mais criticados nas redes sociais

Bruno Capelas

14/04/2017

 

 

Pesquisa da FGV-RJ mensurou mais de 1 milhão de interações sobre lista de Fachin no Twitter e no Facebook

 

 

 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o presidente Michel Temer foram os políticos mais criticados nas redes sociais nas primeiras 24 horas depois da divulgação da lista de inquéritos abertos pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), a partir das delações feitas por executivos da Odebrecht.

É o que diz estudo realizado pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP), da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ), com base em mais de 1 milhão de interações no Twitter e no Facebook após a divulgação da lista pelo portal estadao.com.br, entre as 16 horas da terça-feira e as 16 horas da quarta-feira.

“A divulgação da lista de alvos de abertura de inquéritos foi percebida como uma ‘bomba atômica’”, afirma Marco Ruediger, diretor do DAPP e um dos responsáveis pelo estudo, obtido com exclusividade pelo Estado.

Segundo o relatório, Lula, Aécio e Temer são as únicas personalidades políticas a serem citadas no “top 10” de temas nas interações feitas pelo Twitter.

No Facebook, o termo “Lula” aparece em segundo lugar, atrás apenas de “Odebrecht” – já “Aécio Neves” aparece em sétimo, atrás de “PSDB”, “Senado” e “Operação Lava Jato”.

Ao todo, foram 300 mil tuítes no Twitter e 780 mil interações no Facebook. “A polarização tradicional entre governo e oposição deu lugar à crítica geral ao sistema político”, diz o professor da FGV-RJ.

Quando a análise se restringe apenas a atores do cenário político, Lula novamente lidera em menções no Twitter – sozinho, o ex-presidente responde por 6,5% dos tuítes feitos nas primeiras 24 horas após a divulgação da lista de Fachin.

O petista é seguido de perto por Aécio e Temer.

Já a presidente cassada Dilma Rousseff, que aparece em quarto lugar nas menções no Twitter, surge como “coadjuvante” na análise da FGV-RJ. “A projeção dela nas redes sociais em um incidente desses mostra como a presidente nunca conseguiu uma identidade política própria, distinta da liderança de Lula”, diz Ruediger.

 

Confiança. Enquanto representantes do Executivo e do Legislativo foram postos em descrença na web, o Poder Judiciário apareceu sob alta expectativa da população – o termo “STF”, por exemplo, foi o terceiro mais citado em interações no Facebook, e o nono no Twitter.

 

Web. Aécio Neves ficou em sétimo em citações no Facebook

 

Prova de fogo

“Se o Judiciário falhar, pode haver uma crise de confiança sistêmica. É como se estivéssemos em uma sala com gasolina espalhada por todos os cantos, mas sem fósforos.”

Marco Ruediger

PROFESSOR DA FGV-RJ

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45104, 14/04/2017. Política, p. A6.