Marqueteiros dizem que DIlma tratou de caixa 2
Rafael Moraes Moura
25/04/2017
 
 
TSE. Em depoimentos à Corte Eleitoral, João Santana e Mônica Moura citam discussões sobre pagamentos ilegais em 2014; petista afirma que casal mentiu para ganhar a liberdade

O marqueteiro João Santana e a sua mulher, a empresária Mônica Moura, disseram ontem em depoimentos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que a presidente cassada Dilma Rousseff discutiu com eles pagamentos ilícitos feitos para a sua campanha eleitoral à reeleição, em 2014. A chapa encabeçada pela petista é alvo de ação na Corte Eleitoral por suspeita de abuso de poder político e econômico.

Os relatos sobre as tratativas sobre caixa 2 diferem do que disseram outros delatores, como Marcelo Odebrecht, de que a presidente cassada sabia dos pagamentos irregulares relacionados à sua campanha, mas que não havia tratado diretamente sobre o assunto.

Segundo o Estado apurou, o casal afirmou que João Santana conversou com a então presidente da República em meados de maio de 2014 sobre os pagamentos que seriam feitos via caixa 2. Mônica disse que tratou, posteriomente, sobre atrasos nos repasses com o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, e Edinho Silva, ex-tesoureiro da campanha.

De acordo com os depoimentos, a Odebrecht acertou pagar R$ 70 milhões ao casal por meio de doações legais e outros R$ 35 milhões por meio caixa 2.

Da parte não contabilizada, os marqueteiros teriam recebido algo entre R$ 10 milhões e R$ 12 milhões, restando uma “dívida” na casa de R$ 25 milhões. O restante do pagamento, que seria efetuado usando uma conta no exterior, teria ficado comprometido com o avanço da Operação Lava Jato.

O casal não teria mencionado de maneira explícita a expressão “caixa 2” ao tratar do assunto com Dilma, mas afirmou que estava claro nas conversas mantidas com a então presidente a origem ilícita do dinheiro. Em outro momento, Dilma também quis saber se era seguro o pagamento feito utilizando uma conta no exterior.

Depoimentos. Os depoimentos foram prestados ao ministro Herman Benjamin, relator na Corte Eleitoral da ação que apura se a chapa formada por Dilma e por Michel Temer cometeu abuso de poder político e econômico. Eles foram realizados sob sigilo ao longo de cinco horas na sede do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA).

Benjamin viajou a Salvador para ouvir pessoalmente as testemunhas, que tiveram, no início deste mês, o acordo de colaboração premiada homologado pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Além de Santana e Mônica, André Santana, funcionário do casal, prestou depoimento.

Segundo o casal de delatores, não foi tratado de assuntos financeiros da campanha com Temer, que concorria a vice na chapa de Dilma. O peemedebista, segundo os relatos, só teria conversado com Santana e Mônica durante a gravação dos programas televisivos para o horário eleitoral. Além disso, teria visto sua participação em material publicitário ser reduzida em virtude de questões relacionadas à sua imagem.

Os depoimentos de ontem foram pedidos pelo vice-procurador- geral eleitoral, Nicolao Dino, após a Corte Eleitoral reabrir a fase de instrução do processo.

Em manifestação enviada ao TSE no mês passado, Dino havia pedido a cassação de Temer e a inelegibilidade de Dilma.

Agora, Benjamin vai decidir se encerra a fase de instrução ou convoca novas testemunhas.

Não há prazo para que ele tome essa decisão.

Manifestação. Por meio de nota, Dilma disse ontem que Santana e Mônica “faltaram com a verdade” nos depoimentos prestados ao TSE. “Dilma Rousseff nunca negociou diretamente quaisquer pagamentos em suas campanhas eleitorais, e sempre determinou expressamente a seus coordenadores de campanha que a legislação eleitoral fosse rigorosamente cumprida”, diz a nota enviada pela assessoria da petista.

Segundo Dilma, “tudo indica que o casal, por força da sua prisão por um longo período, tenha sido induzido a delatar fatos inexistentes, com o objetivo de ganhar sua liberdade e de atenuar as penas impostas por uma eventual condenação futura”.

Procurada pela reportagem, a defesa do casal informou que reitera o “compromisso de colaborar com a Justiça”.

JUSTIÇA ELEITORAL

Processo no TSE apura abuso de poder

Ação

A ação no TSE apura suposto abuso de poder econômico e político na campanha presidencial de Dilma Rousseff e Michel Temer de 2014.

Mérito

No mérito, os ministros da Corte Eleitoral devem discutir se há prova de que houve dinheiro ilícito na campanha. Para isso, devem decidir se os depoimentos dos delatores da Odebrecht valem como prova.

Julgamento

No dia 4 de abril, o TSE reabriu a fase de coleta de provas do processo e autorizou os depoimentos de João Santana e Mônica Moura. Ainda não há data prevista para que o julgamento seja retomado.

 

O Estado de São Paulo, n. 45115, 25/04/2017. Política, p. A4