Delator indica propina em obra da Sabesp

Fabio Leite e Fabio Sera

25/04/2017

 

 

Ex-presidente da Odebrecht Benedicto Júnior aponta pagamentos ilícitos para campanhas eleitorais em 2014 de Alckmin e deputado tucano

Planilhas entregues aos investigadores da Lava Jato pelo ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura Benedicto Júnior vinculam uma obra da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) a pagamentos ilícitos para as campanhas eleitorais em 2014 do governador Geraldo Alckmin e do deputado federal João Paulo Papa, ambos do PSDB. Esta é a primeira vez que a estatal paulista que trata água e esgoto é envolvida no esquema de corrupção.

O documento aponta pagamento de R$ 1,5 milhão no dia 5 de agosto de 2014 direcionado a ‘MM-Partido’, codinome usado pela empreiteira para se referir ao atual secretário paulista de Planejamento, Marcos Monteiro, que foi tesoureiro da campanha de Alckmin em 2014. Na planilha, o pagamento está vinculado à obra ‘Emissário Praia Grande’, que se refere a um contrato de R$ 225,8 milhões assinado pela Sabesp com um consórcio liderado pela Odebrecht em 2007 para obras de esgoto no litoral sul paulista.

Uma semana depois, em 12 de agosto, um novo pagamento atrelado à obra, no valor de R$ 300 mil, foi feito para ‘Benzedor’, codinome dado ao deputado Papa, ex-prefeito de Santos (2005-2012) e que foi superintendente da Sabesp entre 1991 e 1995 e diretor da estatal entre 2013 e 2014. À época do repasse, ele concorria a uma cadeira na Câmara. Segundo BJ, como Benedicto Júnior é conhecido, os pagamentos foram feitos “de forma ilícita, sob pretexto de campanha eleitoral”.

Na planilha, o contato da Odebrecht encarregado pelo acerto é Josnei Cirelli, responsável da construtora junto ao contrato com a Sabesp. Ele não está na lista dos 77 executivos e ex-executivos da empreiteira que assinaram termo de colaboração com a Lava Jato. O contrato da obra da Sabesp recebeu, ao todo, seis aditivos, que elevaram o custo total em 24%, para R$ 280 milhões, próximo do limite de 25% estabelecido pela Lei de Licitações. Sabesp e Odebrecht são sócias na empresa Aquapolo, que produz água de reúso para indústria petroquímica.

Investigação. O ministro Edson Fachin, relator dos inquéritos da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a abertura de investigação contra o deputado Papa a pedido do Ministério Público Federal (MPF). Segundo os procuradores, os repasses para o tucano teriam fundamento no protagonismo político do parlamentar em Santos e que era “importante guardar uma relação de longo prazo com ele, pois poderia auxiliar os interesses do grupo Odebrecht em oportunidades futuras”.

Fachin também resolveu manter a investigação em sigilo porque um dos delatores que citam os repasses a Papa e Monteiro, o ex-superintendente da Odebrecht em São Paulo Luis Bueno, também está envolvido em pagamentos ilícitos no exterior. O sigilo por mais tempo foi combinado com o MPF para que a empreiteira pudesse negociar acordos com autoridades de outros países nos quais pagou propina.

Já Alckmin teve o pedido de investigação remetido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Obras. Ao todo, a Odebrecht pagou R$ 8,3 milhões de caixa 2 a campanha de Alckmin em 2014, segundo BJ. “Havia uma demanda do partido (PSDB), através do secretário Marcos Monteiro, para que se fizesse uma doação de R$ 10 milhões para a campanha do Geraldo Alckmin”, disse. A maior parte dos pagamentos está vinculada ao contrato da Linha 6-Laranja do Metrô, uma Parceria Público- Privada (PPP) vencida pela Odebrecht em consórcio com a Queiroz Galvão em 2013.

Aos procuradores, BJ disse que os pagamentos eram “alocados” nas obras públicas mas que o dinheiro de caixa 2 “saía do lucro” da empreiteira. Segundo ele, o Odebrecht não teve vantagem nos contratos citados.

A informação, porém, foi desmentida por outro delator no caso do Metrô. O executivo Carlos da Fonseca Rodrigues afirmou em depoimento que pagou R$ 500 mil ao ex-diretor do Metrô e assessor do governo Sérgio Brasil depois que ele fez alterações no edital da Linha 6 como queria a empreiteira.

Defesas. Em nota, Papa afirmou que “repudia a delação” e nega ter recebido dinheiro de caixa 2. Tanto ele como a Sabesp disseram que o tucano não estava na estatal entre 2007 e 2010, quando o contrato com a Odebrecht foi executado. O secretário Marcos Monteiro afirmou que “a gestão financeira da campanha de 2014 foi feita dentro da lei” e que as contas foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

A Secretaria dos Transportes Metropolitanos disse que “é a maior interessada no avanço e resolução dos processos” e que “preza pela transparência de seus trabalhos e exige de seus funcionários uma conduta ética condizente com os mais elevados padrões do serviço público”.

OBRAS SUSPEITAS

Linha 2 do Metrô

Delatores citam propina a três diretores do Metrô e R$ 4,7 mi a campanha de Serra em 2004

Linha 5 do Metrô

Propina de 0,25% dos valores mensais pagos a diretor do Metrô

Trecho Sul do Rodoanel

Propina de R$ 1,2 mi e de 0,75% dos contratos a dois ex-diretores da Dersa e campanha de Serra

Rodovia Carvalho Pinto

Pagamentos de R$ 24,6 mi no Brasil e no exterior para a campanha de Serra em 2010

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Para FHC, acusações contra Lula podem virar ‘arma de campanha’

Daniel Weterman, Eduardo Laguna, Victor Aguiar e Circe Bonatelli

25/04/2017

 

 

Ex-presidente, também citado em delação, diz que se suspeitas contra petista forem provadas, pode haver reflexo em 2018

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que as acusações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva podem virar arma de campanha e que outros candidatos irão crescer na disputa para 2018.

Diante da liderança do petista em pesquisas eleitorais, FHC afirmou que não acha Lula um “bicho-papão” porque o venceu duas vezes, em 1994 e 1998. Após participar do Fórum Espanha- Brasil, em São Paulo, o líder tucano relativizou a liderança de Lula em sondagens de intenção de voto para 2018. “Pesquisa fora de época não é pesquisa, é projeção um pouco no vazio”, disse.

FHC falou ainda que, diante das acusações que o ex-presidente petista enfrenta, tudo o que se fala pode virar arma de campanha. “Se for verdade tudo que estão dizendo sobre o Lula, isso vira uma arma de campanha. E, sendo uma arma e campanha, afeta também a votação. Eu ganhei do Lula duas vezes, não acho o Lula um bicho-papão”, disse.

As declarações do ex-presidente tucano ocorrem no mesmo dia em que Lula, alvo de cinco ações penais na Justiça, participou de um seminário em Brasília, de onde se defendeu das acusações nos processos da Operação Lava Jato e afirmou que está tranquilo sobre o depoimento que vai prestar ao juiz federal Sérgio Moro.

“Eu não sei se ele vai murchar, mas acho que outros vão crescer”, afirmou FHC quando perguntado se as denúncias iriam desgastar Lula até a eleição.

Citado pelo patrono da maior empreiteira do País, Emílio Odebrecht, FHC também pode ser investigado pela Justiça. O ex-presidente tucano é alvo de petição do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin à Justiça de São Paulo.

Fachin determinou a remessa dos autos para a primeira instância em São Paulo, onde reside o ex-presidente. Emílio revelou em delação premiada ter pago “vantagens indevidas não contabilizadas” às campanhas presidenciais do tucano.

“Isso nunca chegou ao meu conhecimento, mas também não posso responder nada porque não conheço o texto do que realmente foi declarado e se houve alguma referência específica pelo senhor Emílio”, escreveu FHC nas redes sociais, à época das declarações do empreiteiro.

‘Acordão’. Presentes no evento, tanto o ex-presidente como o ex-ministro do Supremo Nelson Jobim negaram que haja conversa com Lula e Temer para uma salvação política de seus partidos após a Lava Jato. “Nunca ninguém falou nisso”, afirmou FHC. Ele defendeu que haja uma agenda pública em uma provável conversa.

Jobim disse que não sabe “de onde tiraram isso", quando perguntado sobre o eventual “acordão”. Ele e o ministro Gilmar Mendes, do STF, foram citados como emissários do acordo entre os três caciques partidários.

 

O Estado de São Paulo, n. 45115, 25/04/2017. Política, p. A6