Valor econômico, v. 18, n. 4252, 11/05/2017. Política, p. A10

Governo estuda medida para taxar PJs

 
Fabio Murakawa
Vandson Lima

 

Preocupado com os efeitos de um processo de pejotização sobre a arrecadação de impostos - um possível efeito colateral da reforma trabalhista em discussão no Congresso -, o governo estuda a edição de uma medida provisória para obrigar as empresas prestadoras de serviços a arcar com encargos que atualmente incidem sobre a folha de pagamento.

A ideia vem sendo discutida entre o presidente Michel Temer e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Foi também um dos temas do encontro entre Temer e a bancada do partido anteontem, no Palácio do Planalto, para discutir a tramitação da reforma na Casa.

Segundo Eunício, encargos como INSS - além de PIS, ISS e Cofins, já cobrados sobre prestação de serviços - seriam recolhidos pela empresa tomadora e descontados do pagamento feito às prestadoras. Simula-se, assim, o que ocorre atualmente com trabalhadores contratados sob a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em que descontos são feitos pelas empresas diretamente da folha de pagamento de seus funcionários.

O líder do governo no Congresso, André Moura (PSC-SE), confirma que há discussões nesse sentido, mas diz que uma decisão ainda não foi tomada.

Inicialmente, a ideia era a edição de uma medida provisória para tratar especificamente desse tema. Mas a sensação de que vários senadores, inclusive da base, devem apresentar emendas com alterações à reforma trabalhista aprovada há duas semanas na Câmara mudou a programação.

A tendência, agora, é que Temer edite uma medida provisória que abarque as propostas feitas pelos senadores para modificar o texto elaborado pelo deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), que altera mais de uma centena de artigos da CLT.

André Moura admite que o presidente quer evitar a todo custo que o projeto seja modificado pelos senadores. Isso obrigaria seu retorno à Câmara, atrapalhando inclusive a tramitação da reforma da Previdência, cuja aprovação é bem mais complicada do que a da trabalhista. Por tratar-se de uma proposta de emenda constitucional (PEC), ela exige os votos e dois terços dos parlamentares em dois turnos de votação em cada uma das Casas do Congresso Nacional.

Porém, alguns senadores da base vêm demonstrando desconforto com o alcance de algumas medidas da reforma e já vêm apresentando emendas ao texto gestado na Câmara. Caso de Fernando Bezerra (PSB-PE), que é vice-líder do governo no Senado.

Ele apresentou ontem emenda para proibir que gestantes e mulheres que amamentam sejam autorizadas a trabalhar em locais com qualquer grau de insalubridade. O texto aprovado na Câmara proíbe apenas o trabalho delas em lugares com grau máximo de insalubridade. Naqueles com grau leve ou médio, o afastamento só ocorrerá mediante atestado médico.

Na avaliação de Bezerra, "o projeto de modernização das leis do trabalho é necessário ao país, deve ser apreciado pelos senadores no tempo adequado e não pode retirar conquistas dos trabalhadores", informou sua assessoria.

Ontem à noite, a ala pemedebista ligada ao senador Renan Calheiros (AL) reuniu-se para discutir mudanças na reforma trabalhista. Participaram Jader Barbalho (PA), Hélio José (DF) e Eduardo Braga (AM), além do líder do governo no Senado, Romero Jucá (RR).

Renan saiu do encontro sinalizando que não concorda que as alterações sejam feitas via MP. Para ele, se o Senado não é capaz de melhorar o texto que recebeu e o governo tem de fazer uma MP para isso, "a política falhou, não conseguiu" fazer seu papel. "A questão é o prazo para fazer a reforma ou fazer uma reforma significativa, que traga avanços?", indagou.

Ao Valor, um senador pemedebista que não esteve na reunião, lembrou que no ano que dois terços do Senado serão renovados no ano que vem. Somado à eventual aprovação da reforma da Previdência, cuja impopularidade o governo tenta combater com uma peças publicitárias, o apoio irrestrito às mudanças na CLT é visto por ele e outros parlamentares da base como uma bomba armada para as eleições de 2018.

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Planalto usará três 'armas' para aprovar Previdência

 

Raphael Di Cunto


O governo pretende usar três "ferramentas" para construir a maioria de 308 votos necessária para aprovar a reforma da Previdência agora que o texto foi aprovado na comissão especial da Câmara: propaganda, a "caneta" do presidente da República e o fechamento de questão de partidos aliados, segundo parlamentar diretamente envolvido nas discussões sobre o projeto.

Redesenhada, a propaganda já está em divulgação nas rádios e TVs, além da versão voltada para os parlamentares, uma cartilha com explicações sobre a proposta e argumentos para defende-la. O material foi elaborado pelo deputado Beto Mansur (PRB-SP), um dos responsáveis por contar os votos favoráveis ao projeto - hoje mais do que insuficientes.

A caneta também está em ação, com exonerações no "Diário Oficial da União" de aliados de deputados que se recusaram a votar a favor das reformas e redistribuição dos cargos para outros políticos, liberação de emendas parlamentares apenas para os "fiéis" e publicação de medidas para agradar setores da Câmara, como parcelamento de dívidas rurais, de prefeituras e de empresários, flexibilização nas regras para porte de armas e afagos aos evangélicos.

O próximo passo, disse, é o fechamento de questão, quando o diretório nacional do partido se reúne para decidir por um posicionamento em matérias no Congresso Nacional e, com isso, recebe autorização para punir até com expulsão os parlamentares que contrariarem essa decisão.

O líder do PMDB, Baleia Rossi (SP), já começou a reunir assinaturas neste sentido. O governo entende que o partido do presidente precisa ser o primeiro, para dar exemplo de unidade. Há, contudo, resistência de parte da bancada a apoiar a reforma e, principalmente, fechar questão.

Temer também recebeu sinais da cúpula do PSDB de que, se o PMDB seguir por essa linha, os tucanos devem acompanhar. A bancada de deputados, por outro lado, ainda está muito resistente e a avaliação é que só a melhora na comunicação externa pode modificar esse quadro, além de mudanças pontuais no projeto, que deve passar por nova rodada de negociação. Também se fala na possibilidade de o PP fechar questão, mas isso é remoto hoje.

Interlocutores do governo também preparam discurso para convencer os deputados da base que estão contra o projeto por causa da eleição do próximo ano dizendo que aqueles que votaram a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff que eles pagarão o preço eleitoral caso o governo que entrou no lugar não resolva a crise econômica e o desemprego.

Em reunião com deputados do PR há algumas semanas, o relator da reforma da Previdência na Camara, deputado Arthur Maia (PPS-BA) ouviu reclamações de que o problema não era mais o texto, mas a falta de apoio na sociedade. "Esse projeto é para quem vai se aposentar da vida pública. Quem deseja ser candidato ano que vem, como eu, não pode votar uma reforma dessas", disse um dos parlamentares.

Maia rebateu que só a oposição ganhará se a reforma não passar. "Estejam certos, os deputados da base do governo vão ser os mais afetados e cobrados se a economia desandar. Ninguém aqui terá uma eleição fácil nesse cenário", afirmou.

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Câmara aprova recuperação dos Estados com mudanças

 

Raphael Di Cunto
Marcelo Ribeiro

 

Após quase dois meses de discussão, a Câmara dos Deputados finalmente aprovou o projeto que cria um Regime de Recuperação Fiscal dos Estados ontem, com a rejeição dos destaques que visavam reduzir as contrapartidas dos governadores, mas com duas concessões: manter inalterado os repasses para outros Poderes e refinanciar dívidas negociadas em 1993 pelos Estados, no valor de R$ 9 bilhões. O texto segue para análise do Senado.

Os dois destaques foram aprovados com apoio do governo, em acordo com a base. O refinanciamento seguirá os moldes do alívio da dívida com a União feito no ano passado, com parcelamento por 20 anos, mas que focou nas dívidas renegociadas pelos Estados e municípios com o governo federal em 1997. Ficaram de fora débitos de 24 Estados alongados em 1993, que agora terão o prazo estendido. "O montante é só de R$ 9 bilhões, enquanto o da lei de 1997 era de R$ 460 bilhões", afirmou o deputado Giuseppe Vecci (PSDB-GO) - Goiás, base do autor da emenda, será o principal beneficiado.

Também foi aprovada alteração para manter os repasses ao Legislativo, Judiciário, Tribunais de Contas e Ministério Público inalterados. O projeto determinava que os valores repassados, mas não utilizados ao fim do exercício financeiro, voltariam para o Executivo. "É um destaque que faz justiça à gestão, principalmente as comarcas do interior, que têm poucos recursos", disse o líder do PSD, deputado Marcos Montes (MG).

O projeto permite que Estados em situação pré-falimentar - com folha de pagamento acima de 70% da receita corrente líquida, sem dinheiro para pagar as responsabilidades do ano e receita menor que a dívida consolidada - fiquem três anos, prorrogáveis por igual período, sem pagar a dívida com a União - que consome até 13% da receita.

Os créditos concedidos por instituições financeiras públicas e privadas aos Estados depois da aprovação da lei também poderão ser suspensos pelo prazo de adesão ao regime - o que aumentará o risco, e custo, de empréstimos a esses governos.

Em troca desses benefícios, o Estado terá que cumprir uma série de contrapartidas, como congelar salários dos servidores, cortar isenções tributárias em 10%, não criar cargos e privatizar empresas estatais de saneamento, financeiras, energia e outros setores. Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais estariam aptos à adesão, mas só os dois primeiros se mostraram interessados.

Também havia a previsão no projeto de que os governos locais fossem obrigados a elevar a contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14%, além da possibilidade de instituir uma taxa extra, mas, com traições na base, o governo foi derrotado nesse ponto e o artigo, excluído. O déficit nos regimes próprios de Previdência é dos principais motivos no rombo das contas estaduais.

Há a possibilidade de que o Senado, onde o relator será o senador Armando Monteiro (PTB-PE), inclua novamente essa previsão - o que exigirá nova avaliação da Câmara- ou mantenha a versão aprovada pelos deputados e encaminhe o texto para sanção.

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), disse que já esteve com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), para tentar votar regime de urgência na terça-feira. "Essa matéria já tinha passado no Senado [no ano passado] com 70 votos a 7 com as contrapartidas. É uma matéria que será votada com mais tranquilidade no Senado", afirmou.

Apesar das concessões, o governo conseguiu importantes vitórias ontem pela manutenção de contrapartidas. O DEM, da base, tentou manter a liberação para que os Estados possam recorrer ao Judiciário questionando o pagamento da dívida no futuro, mas saiu derrotado por 296 a 91.

Já o PT tentava permitir aumentos dos salários para o funcionalismo, a contratação de concursados e tirar a trava para que as despesas não sejam reajustadas acima da inflação, medida pelo IPCA, durante a vigência do regime. O apoio ao governo nesse destaque teve quórum suficiente para aprovar mudanças na Constituição: 314 a 100.