Argentina volta a liderar compra de manufaturado

Marta Watanabe

10/05/2017

 

 

A Argentina voltou a ser neste ano o principal destino de manufaturados brasileiros, posição que tinha perdido para os Estados Unidos em 2014. O que mais contribuiu para o quadro foi a venda de automóveis brasileiros para os argentinos, que subiu 34,5% de janeiro a abril deste ano contra iguais meses de 2016 e atingiu US$ 1,4 bilhão no período. Os veículos puxaram a alta de 25% na exportação de manufaturados para a Argentina, que alcançou US$ 4,77 bilhões no primeiro quadrimestre. A venda de manufaturados para os americanos no acumulado até abril atingiu US$ 4,46 bilhões. A venda de carros também contribuiu para aumentar as exportações de manufaturados para México e Colômbia, embora em menor grau.

José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que a vantagem para os argentinos em relação aos americanos como destino dos manufaturados brasileiros ainda é pequena, mas a tendência é que o país vizinho volte a tornar-se este ano o principal parceiro do Brasil nessa classe de produtos. Os manufaturados responderam por 92% da pauta de exportação à Argentina. Para os americanos, a fatia foi de 55%.

Nos embarques brasileiros para os argentinos os itens de transporte são representativos. Considerando a classificação de mercadorias por grandes grupos, o que contempla veículos automóveis, tratores, reboques, ciclos e outros veículos terrestres, bem como suas partes e acessórios, respondeu por US$ 2,6 bilhões em exportações aos argentinos de janeiro a abril, com alta de 42% contra igual período de 2016. Os embarques desse grupo representaram mais da metade dos manufaturados brasileiros vendidos à Argentina.

"Isso mostra o quanto a exportação de automóveis para a Argentina é importante para o Brasil", diz Castro. O comércio bilateral com o país vizinho também passou a ser mais relevante para o saldo comercial brasileiro. O superávit com a Argentina subiu de US$ 1,39 bilhão para US$ 2,35 bilhões do primeiro quadrimestre do ano passado para igual período deste ano.

O efeito positivo da exportação de veículos não se restringiu ao comércio com a Argentina. A venda externa de automóveis brasileiros cresceu 48% no acumulado até abril e contribuiu para impulsionar exportações de manufaturados para o México, Chile e Colômbia. As altas no embarque de manufaturados no mesmo período para os dois países foram de 15,5%, 40% e 16,2%, respectivamente. Para o México, as exportações de veículos cresceram 51,2% e chegaram a US$ 167,8 milhões de janeiro a abril. Para os chilenos a base de comparação é bem menor e isso ajudou a fazer o valor embarcado em automóveis quase quadruplicar, para US$ 91,1 milhões. Caso semelhante ao da Colômbia, destino para o qual a venda de carros quase triplicou, para US$ 75,8 milhões.

Para Ricardo Lacerda de Melo, professor do departamento de economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), o desempenho para países como Chile e Colômbia mostra o esforço das montadoras em conquistar novos mercados. "São as montadoras tentando ocupar capacidade ociosa com produção para exportação, embora a maior parte dos veículos ainda seja para a Argentina", diz ele.

O esforço se reflete também no superávit da balança brasileira no comércio de automóveis de passageiros. No primeiro quadrimestre, aponta Melo, o saldo positivo de US$ 1,26 bilhão ficou bem acima do superávit de US$ 530 milhões de igual período de 2016.

O ex-secretário de comércio exterior e sócio da Barral M Jorge, Welber Barral, lembra que há uma recuperação, mas o Brasil já exportou volumes muito maiores de automóveis há cerca de 20 anos, quando o país era uma plataforma de exportação.

No decorrer das últimas duas décadas, porém, diz ele, o Brasil perdeu competitividade não só por conta de idas e vindas do câmbio, como pelo próprio custo de produção e pelo avanço dos acordos regionais, dos quais o país não participou.

O que se vê agora, diz o ex-secretário de comércio exterior, é mais uma reação ao momento de crise da economia doméstica. A exportação vem crescendo, pondera ele, mas ela é muito pequena perto da capacidade de produção brasileira. A Argentina, destaca ele, é o principal destino por conta das produções complementares mantidas pelas montadoras. Os argentinos compram automóveis e autopeças que depois serão montadas e revendidas ao Brasil. Em relação ao México, as montadoras têm aproveitado para embarcar modelos mais baratos. Com a Colômbia, a expectativa é de que um acordo automotivo entre os dois países entre em vigor. O esforço de embarcar do setor deve se manter, avalia, pelos próximos dois anos. "Nesse período a demanda doméstica ainda será pequena para a capacidade de produção brasileira, que aumentou bastante por conta de incentivos como o Inovar Auto."

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4251, 10/05/2017. Brasil, p. A3.