Temer troca o comando da Justiça, alvo de críticas

Fabio Serapião / Renan Truffi

29/05/2017

 

 

GOVERNO SOB INVESTIGAÇÃO / Torquato Jardim substitui no ministério Osmar Serraglio, que não agradava a base aliada e era considerado ‘fraco’ pelo Planalto; o peemedebista deve assumir a pasta da Transparência

 

 

 

O presidente Michel Temer demitiu ontem o ministro da Justiça Osmar Serraglio (PMDB) e anunciou o jurista Torquato Jardim, então chefe da Transparência e Controle, como novo titular da pasta. A troca de nomes na Justiça marca mais um capítulo da tentativa de Temer de fortalecer a interlocução de seu governo com o Judiciário e dar respostas aos aliados sobre a crise política iniciada com a delação da J&F (holding que inclui a JBS).

Após a demissão, Serraglio foi convidado a assumir o Ministério da Transparência, responsável por firmar acordos de leniência.

A troca foi antecipada pela Coluna do Estadão no portal estadao.com.br.

Nos bastidores, a demissão de Serraglio é atrelada a dois fatores.

O primeiro seria sua ineficiência em estabelecer canais de comunicação com órgãos sob a tutela do ministério – como a Polícia Federal –, com outras instituições e com as cortes superiores.

No Palácio do Planalto, Serraglio era considerado “fraco” e a preocupação era ter um ministro da Justiça com interlocução no Judiciário, como tinham os exocupantes da pasta Alexandre de Moraes e José Eduardo Cardozo.

Contribuiu para a decisão de substituir de Serraglio a tentativa de uma escrivã da PF de tentar, por telefone, na quarta-feira passada, marcar uma data para o presidente ser ouvido. Na avaliação de interlocutores de Temer, Torquato terá mais “ascendência” sobre a corporação.

Na base aliada, o descontentamento com o ministro ficou mais evidente nas gravações de conversas do senador Aécio Neves (PSDB-MG) – agora afastado do cargo –, divulgadas no âmbito da delação da JBS. “O ministro é um b... de um c... Ele (Temer) errou de novo de nomear essa p...”.

Ao contrário de Serraglio, Torquato possui bom trânsito em ao menos duas cortes em que tramitam processos de interesses do governo Temer e é visto como um gestor de pulso firme que poderá influir de modo mais enérgico na Polícia Federal.

Ele tem boa interlocução no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e no Supremo Tribunal Federal (STF). No TSE, chegou a ser ministro entre 1988 e 1996.

A partir do dia 6 de junho os ministros do TSE vão julgar a ação proposta pelo PSDB contra a chapa Dilma Rouseff-Michel Temer. Visto até há pouco tempo como um possível caminho para livrar o peemedebista, o julgamento, após a delação JBS, agora é tido como a forma mais “constitucional” para a cassação do presidente.

No Supremo, Temer é alvo de um inquérito por corrupção, obstrução de Justiça e organização criminosa.

 

Carne Fraca. O segundo fator está atrelado à Operação Carne Fraca, na qual Serraglio foi citado. O Estado apurou que a troca também se deve a informações sobre a negociação de delação premiada de dois investigados.

O ex-superintendente regional do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no Paraná, Daniel Gonçalves Filho, e a chefe do Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal, Maria do Rócio Nascimento – apontados pela Polícia Federal como líderes do esquema –, afirmaram à Procuradoria-Geral da República que Serraglio beneficiava o grupo investigado quando era deputado.

Os dois negociam um acordo de delação com a PGR. Serraglio apareceu em conversa interceptada pela PF chamando Gonçalves Filho de “grande chefe”. Já Maria do Rócio tratou o ex-ministro da Justiça de “o velhinho que está conosco”.

Se aceitar ficar com a Transparência, Serraglio mantém o foro privilegiado do deputado federal afastado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Loures é suplente de Serraglio e assumiu o mandato do deputado após sua ida para o Ministério. Ele foi flagrado recebendo uma mala com R$ 500 mil de Ricardo Saud, executivo da JBS, e está sendo investigado no STF no mesmo inquérito de Temer.

Antes de assumir a pasta, Torquato chegou a atuar como advogado de Marina Silva e da Rede no processo para registrar o partido na Justiça Eleitoral, em 2015. Em junho daquele mesmo ano, artigo publicado no site de seu escritório, em julho de 2015, ele defendeu uma posição diversa da que a defesa de Temer apresentou no TSE – se dizendo contrário à separação da chapa.

Quando ainda não havia recebido o primeiro convite de Temer, Torquato também se mostrou cético sobre a possibilidade da Operação Lava Jato ter efeito concreto para o fim da corrupção no País.

Na ocasião, disse que os partidos políticos brasileiros são um “balcão de negócios” e citou o Centrão – grupo formado por 13 partidos pequenos e médios na Câmara dos Deputados – como exemplo de atuação “em nome da corrupção e da safadeza”. No cargo de ministro da Transparência, Torquato também defendeu que a regulamentação do lobby no Brasil .

Substituto. Temer deixa Jaburu com Torquato (dir), que trocou Transparência por Justiça

 

Delegados

A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal afirmou que a mudança na pasta “gera preocupação e incerteza sobre a possibilidade de interferências”.

 

PARA LEMBRAR

Três ministros em um ano

Ao decidir substituir Osmar Serraglio por Torquato Jardim no Ministério da Justiça, o presidente Michel Temer promoveu a terceira mudança na pasta em pouco mais de um ano à frente do Palácio do Planalto. O hoje ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Alexandre Moraes (foto acima), foi o primeiro titular da Justiça após a queda Dilma Rousseff, mas ele não era a primeira opção. O preferido de Temer era advogado criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, que “caiu” antes de assumir por criticar as delações da Lava Jato. Mariz atualmente é advogado do presidente. Com a ida de Moraes para o STF, o PMDB na Câmara “emplacou” o paranaense Osmar Serraglio.

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Presidente vai ao NE para mostrar governo ativo

Daiene Cardoso/ Carla Araújo/ Tânia Monteiro

29/05/2017

 

 

Na tentativa de dar um ar de normalidade ao governo, o presidente Michel Temer montou uma agenda positiva de atividades para os próximos dias. Temer deixou ontem o isolamento em Brasília e partiu para Alagoas e Pernambuco, para visitar as áreas atingidas pelas chuvas.

O presidente levou na comitiva o novo ministro da Justiça, Torquato Jardim. Em Maceió, Temer não conseguiu sobrevoar as áreas inundadas porque quando chegou já estava escuro.

Ele se reuniu com o governador do Estado, Renan Filho (PMDB), e prefeitos de cidades atingidas. O presidente acenou com a liberação de recursos federais para as localidades atingidas pelas chuvas, mas recomendou que governadores e prefeitos façam levantamentos dos estragos.

Temer viu fotos da situação e seguiu para Pernambuco, para se reunir com o governador Paulo Câmara (PSB).

Questionado sobre a substituição na Justiça, o presidente desconversou: “Isso é outro assunto”.

Para a visita aos Estados nordestinos, Temer cancelou uma reunião com os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo Oliveira (Planejamento), e com o novo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Paulo Rabello de Castro, substituto de Maria Silvia.

 

Economia. Em outra frente para mostrar que o governo não está paralisado e permanecer no cargo, o presidente vai buscar o respaldo da classe empresarial nesta semana. O peemedebista vai participar da abertura do Fórum de Investimentos Brasil 2017, em São Paulo. Na véspera do evento, Temer dará entrevistas às agências internacionais e terá um jantar com executivos de empresas convidadas do fórum.

No Congresso, a base aliada montou uma agenda de votações.

No Senado, a ordem é colocar em votação algumas Medidas Provisórias (MPs) e dar andamento à reforma trabalhista, que está em discussão na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Já na Câmara, a estratégia é dar seguimento aos temas econômicos para sinalizar que a base segue sólida, a despeito da pressão das bancadas para abandonar o governo. 

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45149, 29/05/2017. Política, p. A4.