OAB vê ‘fato estarrecedor’ e juristas falam em crime

Gilberto Amendola e Valmar Hupsel Filho

18/05/2017

 

 

CRISE NO PLANALTO. Presidente de entidade de advogados pede esclarecimento imediato; especialistas em Direito dizem que eventual saída de Temer leva à eleição indireta

Juristas veem indícios de crime de responsabilidade e já consideram um processo de impeachment como desdobramento “provável” das delações que implicam o presidente Michel Temer em uma suposta compra de silêncio de Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), os fatos divulgados são “estarrecedores”.

“Se as informações forem confirmadas, a situação se torna insustentável. Um processo de impeachment deve ser aberto em breve”, disse Davi Tangerino, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Professor de Filosofia e Teoria Geral do Direito na Universidade de São Paulo (USP), Rafael Mafei Rabelo Queiroz enxerga na suposta ação do presidente “uma tentativa de obstrução à Justiça”. “Existem motivos de sobra para a abertura de um processo de impeachment.

Como foi um vazamento, é preciso aguardar a confirmação e a homologação da delação. Com provas tão fortes (um áudio), acredito em um processo rápido (de impeachment). Principalmente se a gente levar em conta que esse é um governo que não é popular.” Para o professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Pedro Serrano, a gravação pode confirmar algo maior do que apenas “obstrução à Justiça”. “Se for exatamente isso que está sendo divulgado, podemos dizer que o presidente tem coparticipação em um crime.” Mais cauteloso é o professor de Processo Penal Claudio José Langroiva Pereira (PUC-SP).

“É preciso investigar quem vazou essa informação. O vazamento foi uma irresponsabilidade”, disse.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Claudio Lamachia disse que “são estarrecedores” os fatos divulgados pelo jornal O Globo. “A sociedade precisa de respostas e esclarecimentos imediatos”, disse Lamachia. “As cidadãs e cidadãos brasileiros não suportam mais conviver com dúvidas a respeito dos representantes.”

Eleições diretas? Para Rubens Glezer, professor de Direito Constitucional da FGV, a questão é clara: “Se Temer cair, são eleições indiretas. Eleições diretas só se tiver uma PEC, mudando o texto da Constituição. Ou se for via cassação da chapa. E na cassação da chapa tem chance de ser direta”, diz.

Já Tangerino afirmou que há duas abordagem possíveis: legalista e política. “Do ponto de vista constitucional, o previsto é que o presidente da Câmara assuma.

Por outro lado, existe a questão política. A população pode entender que este Congresso não tem legitimidade para escolher quem vai comandar o País.”

PERGUNTAS & RESPOSTAS

O que pode acontecer?

1. A gravação de Joesley é legal e vale como prova?

Sim, pois não foi um grampo. A jurisprudência do Supremo, nesses casos, é de que a gravação não foi ilegal, pois foi gravada por participante da conversa.

2. Qual crime foi cometido nas gravações?

Se confirmado, houve crime de responsabilidade, por violação da probidade da administração.

3. O presidente Michel Temer pode ser afastado? Se sim, como?

Da mesma forma que Dilma Rousseff foi impedida no ano passado. Se comprovado o crime de responsabilidade, ele pode ser afastado por meio de impeachment.

4. Qual o andamento para o processo de impeachment?

Rito será o mesmo que o impeachment de Dilma. O presidente da Câmara deve aceitar um pedido de abertura de impeachment, que, depois, tem de ser analisado por uma comissão especial. Após discussões e parecer do relator, tem de ir ao plenário da Casa. Se houver 342 votos (de 513) a favor, o pedido segue para Senado, onde também será analisado por uma comissão especial. Primeiro é decidida a admissibilidade e, depois, o teor do relatório. Se o pedido passar na comissão, vai para plenário. Em seguida, caso o impedimento passe, presidente da Câmara assume a presidência por 90 dias e deve convocar eleições indiretas. Ou seja, Congresso elege alguém para assumir a Presidência até 2018.

5. Existe a possibilidade de eleições diretas?

Só se o Congresso fizer uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), alterando o ponto da Carta que determina eleições indiretas nessa situação. Outra possibilidade é se a chapa Dilma-Temer for cassada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

6. O que acontece se o presidente renunciar?

O procedimento é o mesmo no caso de o impeachment. O presidente da Câmara assume e deve convocar, em 90 dias, eleições indiretas.

7. Aécio Neves pode ser afastado do Senado?

Ele pode ser cassado. Se houver entendimento do ministro do STF responsável pela Lava Jato, Edson Fachin, de que houve coação a testemunha, obstrução da investigação, indícios de fuga, pode até pedir a prisão do senador. Se ele for cassado, perde o foro privilegiado.

 

O Estado de São Paulo, n. 45138, 18/05/2017. Política, p. A7