Países apuram elo entre JBS e empreiteiras

Alexa Salomão e Jamil Chade

29/05/2017

 

 

 

Offshores citadas na delação de Joesley Batista aparecem em investigações sobre construtoras brasileiras; empresas serviriam para pagar políticos

 

 

 

Investigadores que acompanham transações em diferentes paraísos fiscais estão intrigados com uma coincidência: empresas offshore citadas nas delações da JBS também aparecem em investigações sobre construtoras brasileiras.

Pessoas próximas aos casos querem saber o motivo pelo qual essas offshores foram utilizadas em diferentes momentos, por pessoas sem relações diretas, mas sempre para transferir recursos a políticos e operadores.

Afora o fato de serem investigadas em esquemas de pagamento de propinas a políticos brasileiros, é difícil estabelecer correlações entre a JBS, maior produtora de carne do mundo, com a Queiroz Galvão, empresa que atua nas áreas de engenharia, óleo e gás, ou com a construtora Camargo Corrêa. A partir das várias delações e investigações em crimes de corrupção, porém, novas informações mostram que em algum momento elas tiveram vínculos financeiros.

A relação ocorreu de forma indireta, por meio de Lunsville e Valdarco, empresas offshores abertas por Joesley no Panamá, um paraíso fiscal.

Joesley contou em sua delação que passou a reservar, para pagar propina, de 1% a 3% do valor de comissões originadas a partir de operações de exportações de várias empresas do grupo. Para movimentar esses recursos, abriu duas offshores: Lunsville Internacional e Valdarco Investments. O dono da JBS, declarou que sempre havia dinheiro para que ambas pudessem fazer remessas a contas em diferentes países e a doleiros no Brasil.

 

Cruzamento. Ao se fazer o cruzamento de delações, descobriu- se que Lunsville foi citada por Expedito Machado, filho de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobrás. Em sua colaboração, Expedido narrou que, entre 2007 e 2013, recebeu recursos do exterior de esquemas do pai com várias empresas. Segundo  ele, Lunsville era responsável por pagamentos da Queiroz Galvão. Expedido disse ter perdido os registros dos depósitos e listou de cabeça as contrapartes da Queiroz Galvão, incluindo na lista a Lunsville.

A Valdarco foi identificada pelas autoridades do Peru, a partir de investigações da promotoria de crimes financeiros do país. O ponto de partida foram denúncias de que o ministro de Habitação, Construção e Saneamento, Juan Sarmiento Soto, também do conselho da Sedapal – empresa responsável pelo abastecimento de água –, teria fraudado uma licitação em benefício da Camargo Corrêa. O ano era 2009 e o presidente, Alan Garcia. A partir de várias diligências, incluindo a busca e apreensão de documento no escritório local da construtora brasileira, foi possível traçar o caminho do dinheiro.

Segundo os investigadores, Juan não teria sido pago diretamente.

A propina fora repassada a Enrique Saco Sarmiento, um parente, numa conta em Miami. A conta dos Estados Unidos, por sua vez, recebera o dinheiro do Panamá, num depósito feito pela Valdarco. O pagamento ocorreu em março de 2009. A investigação no Peru foi associada à Operação Castelo de Areia, mais tarde considerada ilegal no Brasil. Mas, ano passado, investigadores do Peru trocaram informações com a força tarefa da Lava Jato, por meio de acordo de cooperação.

 

Suíça. As osffshores da JBS fizeram várias movimentações via Suíça. Em uma delação premiada, o diretor-financeiro da JBS, Demilton Antonio de Castro, explicou que duas empresas de fachada eram alimentadas no banco suíço Julius Baer.

A instituição financeira era a mesma que também manteve quatro contas de empresas offshore controladas pelo exdeputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O Estado apurou que essa situação mudou quando a Operação Lava Jato ganhou novas dimensões e bancos suíços foram obrigados pelos procuradores a registrar e informar às autoridades suíças qualquer tipo de movimentação fora do comum envolvendo brasileiros.

No Julius Baer, o volume de recursos movimentados pela JBS e seus padrões de transferência acenderam um sinal de alerta, levando o banco a exigir explicações. Segundo fontes do meio financeiro suíço, as contas foram fechadas e transferidas para o banco Hottinger. Documentos anexados nas delações confirmam a mudança.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45149, 29/05/2017. Política, p. A9.