Reformas devem ficar em segundo plano

Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli

18/05/2017

 

 

CRISE NO PLANALTO.Temor da equipe econômica do governo é de que a retomada do crescimento econômico, ainda frágil e incipiente, seja interrompida

Embora não tenha havido nenhum posicionamento oficial, a área econômica do governo já discute cenários sobre o impacto na economia da revelação de que o presidente Michel Temer teria dado o aval para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) nas investigações da Lava Jato.

As acusações podem interromper as negociações para a aprovação das duas principais reformas econômicas em tramitação no Congresso: a da Previdência e a trabalhista. Há o temor de que o processo de retomada do crescimento do País, que começou no primeiro trimestre, seja interrompido ainda em sua fase inicial.

Após a divulgação da notícia da delação de Joesley Batista, um dos donos da JBS, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi ao Palácio do Planalto para uma reunião com o presidente.

Meirelles já tinha cancelado antes todos os compromissos que teria à tarde, depois de participar da 20.ª Marcha dos Prefeitos. O ministro foi presidente do conselho de administração da J&F, holding controladora da JBS.

Entre assessores da área econômica do governo, a notícia revelada pelo jornal O Globo é descrita como “bomba total”. Um integrante da equipe, porém, disse que vê as acusações com “preocupação, mas não com desespero”, e que o governo vai discutir com parlamentares como será o encaminhamento das reformas.

Para o cientista político e presidente da consultoria Arko Advice, Murillo de Aragão, a acusação contra o presidente é séria e gera um impasse para o avanço das reformas. “Aumenta a importância do Meirelles e do presidente do BC, Ilan Goldfajn, na condução da economia”, disse Aragão, ressaltando que, mais importante do que os nomes dos expoentes da economia, é a direção da política econômica, que precisa ser mantida. Ele ponderou que, “no mínimo”, o governo ficou paralisado pela denúncia. “Tem de se organizar para saber se continua ou se acaba”, afirmou.

O economista Paulo Tafner, especialista em Previdência, avaliou que é preciso apurar os fatos, mas reconheceu que as acusações são graves e podem trazer problemas de governabilidade a Temer, justamente em momento de fragilidade econômica.

“Sem governabilidade, não há reformas”, avaliou. “Estamos à beira do precipício.” Com os holofotes voltados para a crise, a Câmara vai se ocupar com o pedido de impeachment de Temer, que já foi protocolado pela oposição. Para negociadores das reformas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, haverá “pouco tempo e energia para pensar em uma coisa tão prosaica quanto uma reforma da Previdência”, principalmente se a Câmara precisar eleger o próximo presidente da República de forma indireta.

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Ex-marqueteiro do PT chama Cardozo de ‘cínico’

 Julia Affonso e Ricardo Galhardo

18/05/2017

 

 

Ex-ministro disse que há contradição na delação de Santana e de Mônica Moura e negou caixa 2 nas campanhas de Dilma

O publicitário João Santana divulgou nota na qual chama o exministro da Justiça José Eduardo Cardozo de “cínico” por dizer, em entrevistas publicadas ontem, que as delações do exmarqueteiro da campanha de Dilma Rousseff e de sua mulher, a empresária Mônica Moura, apresentam contradições.

“A grotesca e absurda entrevista do advogado José Eduardo Cardozo faz-me romper o compromisso – que tinha comigo mesmo – de somente tratar dos termos das colaborações, minha e de Mônica, no âmbito da Justiça. Desta forma, digo de forma sucinta (e reservo detalhes para momentos apropriados): Não há nenhuma contradição naquilo que Mônica e eu afirmamos sobre as informações recebidas, em fevereiro de 2016, a respeito de nossa prisão iminente”, diz a nota.

Ontem, o Estado e O Globo publicaram entrevistas de Cardozo nas quais o ex-ministro reitera que não vazou informações sobre a prisão de Santana e Moura a Dilma e aponta supostas contradições nas delações do casal. Segundo Cardozo, Mônica disse que o casal recebeu um telefonema de Dilma quando estava na República Dominicana avisando sobre a emissão de mandados de prisão. Já Santana disse ter “deduzido” sobre a prisão ao ler uma mensagem cifrada de Dilma registrada em uma conta de e-mail, mas só teve certeza quando viu a Polícia Federal chegar à sua casa.

Na nota divulgada ontem, o publicitário rebateu com evidências as entrevistas de Cardozo.

“Apenas para ficar em dois indícios não devidamente noticiados: se não estivéssemos sendo informados da iminência da prisão, porque chamaríamos, na sexta, 19 de fevereiro, o nosso então advogado, Fabio Tofic, para que viesse às pressas a Santo Domingo? Por que cancelaríamos nosso retorno ao Brasil, dias antes, com passagem comprada e com reserva já confirmada? (A Polícia Federal chegou a esse detalhe através de investigação feita na época)”, disse.

Segundo o ex-ministro da Justiça, a nota confirmou a possível contradição. “Ele confirma a contradição. Mônica disse que houve um telefonema depois do e-mail. A nota diz que o último informe foi o e-mail”, declarou Cardozo.

Para o ex-ministro, a suposta contradição pode levar à anulação da delação do casal. Santana chamou Cardozo de “cínico” por dizer, ao jornal O Globo, que não houve caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014 de Dilma pois o valor pago pelo PT ao marqueteiro, R$ 70 milhões, já seria suficientemente alto.

“De forma cínica diz que não houve caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014. Pra cima de mim, José Eduardo?”, disse o publicitário.

 

O Estado de São Paulo, n. 45138, 18/05/2017.Política, p. A10