Investigados se incriminaram ao gravarem troca de mensagens

Cleide Carvalho

28/07/2017

 

 

Conteúdo de conversas apagadas foi resgatado após quebra de sigilo telemático

O Ministério Público Federal (MPF) descobriu que o ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras Aldemir Bendine e o operador financeiro André Vieira conversavam pelo aplicativo de celular Wickr, que permite a destruição automática das mensagens trocadas. Mas, por algum motivo, eles salvaram em seus telefones “prints” das mensagens que serviram de prova para a operação realizada ontem pela Lava-Jato e que levou ambos à prisão.

Uma das mensagens indica justamente o endereço da casa de Vieira em Brasília, onde o empresário Marcelo Odebrecht e Fernando Reis, ex-executivo da empreiteira, relataram ter tido uma reunião em que Bendine disse a senha da cobrança de propina, que seria mencionar um empréstimo concedido pelo Banco do Brasil à Odebrecht Agroindustrial.

Segundo despacho do juiz Sergio Moro, em outra mensagem gravada Vieira mandou para Bendine uma lista de pessoas próximas a Lúcio Bolonha Funaro, operador do ex-deputado federal Eduardo Cunha — ambos foram presos pela Lava-Jato.

De acordo com o juiz, as mensagens foram encontradas em arquivos mantidos na “nuvem” dos aparelhos de celular ou dos aplicativos, uma espécie de servidor externo. Os investigadores conseguiram chegar até as mensagens graças à quebra de sigilo telemático (referente à comunicação eletrônica, como e-mails e mensagens), uma vez que os aparelhos ainda não haviam sido apreendidos pela Polícia Federal.

Foi também por meio de mensagens trocadas entre o grupo que a Lava-Jato descobriu que o irmão de André Vieira, Antônio Carlos Vieira da Silva Júnior, teria sido o responsável por providenciar o recebimento do dinheiro da Odebrecht — os pagamentos eram relacionados com o codinome de Bendine: “Cobra”.

A investigação descobriu ainda que Antônio Carlos mandou mensagens a Marcelo Marques Casimiro, um taxista. Chamado a prestar depoimento, o taxista contou que presta serviços a Antônio Carlos, que lhe pediu para pegar três pacotes nas datas das entregas de dinheiro feitas a Vieira — segundo a Odebrecht, a entrega foi feita na Rua Sampaio Viana, em São Paulo. Disse, porém, que não sabia que se tratava de dinheiro e deixou os pacotes no apartamento. Para pegar os pacotes ele teve de usar três senhas diferentes, uma para casa ocasião (Oceano, Rio e Lagoa).

O flat da Rua Sampaio Viana havia sido alugado por Antônio Carlos, entre abril de 2014 e abril de 2016. Ele negou conhecer o taxista, mas, além desta ligação, os investigadores descobriram, pelos registros do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ), que ele fez vultosas transações em espécie.

No celular de Antônio Carlos foi localizado ainda registro do pagamento de despesas de hospedagem, em janeiro de 2016, para Amanda Bendine, filha de Aldemir Bendine. Para Moro, o pagamento eventualmente pode representar uma forma de transferir, indiretamente, a propina recebida da empreiteira.

Além das conversas, o MPF confirmou ainda, por meio de registro em hotéis e emissão de passagens aéreas, os encontros relatados pelos delatores da Odebrecht. Algumas das mensagens encontradas na “nuvem” de aparelhos ligados a Bendine e André ainda não foram decifradas.

O globo, n.30671 , 28/07/2017. País, p. 5