Para acelerar economia, governo quer mudar lei de recuperação judicial
Adriana Fernandes e Fernando Nakagawa
09/05/2017
 
 
Proposta. Proposta que será enviada ao Congresso prevê mais garantias aos bancos para concederem financiamentos e também para quem comprar ativos das empresas em recuperação; medida faz parte de um pacote de medidas microeconômicas em preparação

O governo vai enviar em junho ao Congresso Nacional o projeto de uma nova lei de recuperação judicial para as empresas, informou ao “Estado” o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Com a proposta, Meirelles previu a redução para dois anos, em média, de todo o processo de recuperação judicial. Hoje, esse tempo pode chegar a sete ou oito anos.

O projeto de recuperação judicial encabeça a lista das próximas medidas do Plano de Reformas Microeconômicas que serão adotadas pela equipe econômica para aumentar a produtividade do Brasil e garantir que o crescimento potencial do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, hoje entre 2% e 2,25%, se estabilize entre 3,5% e 4% nos próximos anos, disse Meirelles.

O PIB potencial representa a capacidade de crescimento do País sem aumento da inflação. O plano do governo Temer está sendo coordenado pela Fazenda, por meio dos economistas João Manoel Pinho de Mello, da assessoria especial de reforma microeconômicas, e Waldery Rodrigues e Marcos Mendes, também assessores especiais do ministério. O diagnóstico da Fazenda é que o processo de retomada mais lenta da economia ocorreu, em parte, por conta da legislação atual, que estimula que o processo judicial se arraste por muito tempo.

O grupo de trabalho formado pela Fazenda está concluindo os detalhes técnicos do projeto, que visa a garantir que as empresas viáveis que entrem em recuperação possam produzir, tomar crédito e voltar à normalidade.

“Aquelas empresas que porventura não sejam viáveis, que sejam liquidadas. Mas que sejam uma minoria”, disse.

Segundo o ministro, o projeto dará mais poderes aos credores, viabilizando a negociação de ativos das empresas, além de regular melhor a sucessão empresarial. “Muitas vezes, é de interesse dos trabalhadores e credores vender determinado ativo, mas é difícil pela questão do passivo contingente que pode ser assumido pelo comprador.” Ele também destacou a importância da mudança da lei para viabilizar a concessão de novos financiamentos para que a empresa tenha condições de sobreviver durante o processo de recuperação.

O governo quer, com a nova lei, reduzir o risco de interessados em comprar empresas em dificuldades. A ideia é evitar que o passivo de um grupo contamine o ativo.

Garantias. Além da recuperação judicial, integram a lista das próximas medidas a regulamentação da “central de registro de recebíveis de duplicatas e outras garantias”. A equipe de Manoel Pinho acredita que a medida, ao melhorar a qualidade e segurança das garantias dadas às empresas nos financiamentos, terá para as empresas o impacto positivo que teve a regulamentação do crédito consignado para as pessoas físicas. A central funcionará como um ambiente em que todos possam acessar o que cada um tem direito a receber, contribuindo para a redução dos spreads e dos juros nas operações de crédito.

O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, já reconheceu que o juro poderia cair mais acentuadamente se instituições financeiras tivessem mais agilidade para recuperar ativos em caso de calote.

Alvo. Ideia, segundo Meirelles, é que as empresas cuja recuperação é viável tenham mais facilidade para continuar operando

REFORMAS

Próximos passos da agenda microeconômica

● Recuperação judicial

Nova lei será enviada em breve ao Congresso

● Regulamentação da central de registro de recebíveis de duplicatas

Medida vai funcionar como crédito consignado para as empresas

● Cadastro positivo

Legislação será modificada

●  Desburocratização tributária

Haverá um sistema de escrituração digital para o pagamento de todos os tributos.

●  Redução dos spreads bancários

Governo trabalha em agenda para reduzir custo do crédito

PARA LEMBRAR

Recuperação caiu 30% este ano

No ano passado, o Brasil teve 1.863 pedidos de recuperações judiciais – 44,8% a mais do que em 2015, quando foram registradas 1.287 ocorrências. Neste ano, entre janeiro e abril, o País teve queda de 30,3% no número de recuperações requeridas em relação aos quatro meses de 2016. Foram 398 solicitações no primeiro quadrimestre de 2017 ante 571 no mesmo período do ano passado, segundo dados do Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações. As micro e pequenas empresas lideraram o ranking de solicitações, com 249 pedidos no acumulado do ano. Em igual período de 2016, 327 solicitações de recuperação das MPEs foram registradas.

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Ganho com fim da desoneração é menor, dizem economistas

Alexa Salomão

09/05/2017

 

 

Segundo estudo, receita estimada pelo governo, de R$ 4,8 bilhões este ano, pode não se confirmar

Ao anunciar o fim da desoneração sobre a folha de pagamento para a maioria dos setores, a partir de julho, o governo argumentou que iria recuperar uma receita de cerca de R$ 4,8 bilhões neste ano. O resultado, no entanto, pode não ser tudo isso.

Um estudo sobre o desempenho desse incentivo e os impactos do mercado de trabalho sobre a arrecadação estima que a receita para os cofres públicos tende a ser menor: na hipótese mais otimista, serão R$ 3,2 bilhões a mais no caixa do governo neste ano, e outros R$ 7, 8 bilhões em 2018.

O prognóstico consta do estudo “Desembarque da desoneração da folha de salários”, assinado pelos economistas Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), e José Roberto Afonso, professor do mestrado do Instituto do Direito Público (IDP).

Para fazer o prognóstico, os autores levaram em consideração a série histórica de quanto o governo vinha perdendo com o benefício. Acompanhando a relação entre a estimativa de renúncia e a renúncia que efetivamente ocorreu, o levantamento apurou que houve uma crescente discrepância entre os valores: a estimativa foi sucessivamente se tornando superior ao resultado de fato.

Segundo o estudo, no acumulado em 12 meses, até novembro do ano passado, a previsão era de que haveria R$ 17,3 bilhões de renúncia. A soma do informado na planilha da desoneração, porém, foi menor: R$ 15 bilhões. Como esse valor vinha caindo e alguns setores continuam a ter o benefício da desoneração sobre a folha, os estudiosos apontam que um valor cada vez menor vai entrar nos cofres públicos no futuro. A conclusão: “A renúncia no presente não é mais tão grande quanto já foi no passado”, diz Vilma. Os autores tiveram dificuldade de aprofundar o levantamento porque a Receita Federal parou de divulgar dados mais amplos.

Trabalho e renda. Segundo o estudo, há mais de uma razão para explicar o fenômeno. Algumas delas são técnicas: mudanças de alíquotas e base de cálculo. Mas o que chamou a atenção foi o impacto de questões ligadas ao emprego e à renda.

“Houve um processo de substituição, que aparece nas estatísticas: no início da recessão, demitiram primeiro quem ganhava mais e ocuparam a vaga com quem ganhava menos; houve expansão de autônomos, de pessoa jurídica, incluindo a expansão de uma nova moda, o MEI (Microempreendedor Individual).

Com isso, a base de salário despenca”, diz Afonso.

Os autores alertam que o trabalho regular, com carteira assinada, está caindo no mundo inteiro.

No caso brasileiro, a recessão e o alto custo de contratação, uma das mais caras do mundo, aceleram o processo, com efeitos sobre a arrecadação do setor público que ainda não foram dimensionados.

Em queda

R$ 3,2 bi é a estimativa de arrecadação com o fim da desoneração, segundo o estudo, um valor 33% menor que os R$ 4,8 bilhões projetados pelo governo .

 

O Estado de São Paulo, n. 45129, 09/05/2017. Economia, p. B1