Lula comandava corrupção na Petrobrás, diz ex-diretor

Fausto Macedo / Luiz Vassallo /Ricardo Brandt / Valmar Hupsel Filho

06/05/2017

 

 

Depoimento. Renato Duque afirma ao juiz federal Sérgio Moro que ex-presidente ‘tinha pleno conhecimento de tudo’ do esquema instalado na estatal petrolífera

 

 

O ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque afirmou ontem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva “tinha pleno conhecimento de tudo, tinha o comando” do esquema de corrupção instalado na estatal petrolífera.

A declaração foi dada em depoimento ao juiz Sérgio Moro, na primeira vez em que o ex-executivo, que é candidato a delator, falou sobre as irregularidades na empresa.

Duque disse a Moro que teve três encontros pessoais com Lula, o último em 2014, em um hangar do Aeroporto de Congonhas, quando a Lava Jato já estava nas ruas. “(No encontro) Ele (Lula) me perguntou se eu tinha uma conta na Suíça com recebimentos da empresa SBM”, afirmou Duque. O relato sobre os encontros foi antecipado ontem pela Coluna do Estadão.

Segundo Duque – preso na Lava Jato e condenado a mais de 57 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro em quatro ações penais –, Lula disse que a então presidente Dilma Rousseff “tinha recebido informação de que um ex-diretor da Petrobrás teria recebido dinheiro numa conta na Suíça da SBM (empresa holandesa que tinha contratos com a estatal)”.

“Eu falei não, não tenho dinheiro da SBM nenhum, nunca recebi dinheiro da SBM. Aí ele vira para mim e fala assim: ‘Olha, e das sondas, tem alguma coisa?’ E tinha né, (mas) eu falei não, também não tem.” Segundo ele, Lula então fez um alerta: “‘Olha, preste atenção no que vou te dizer: se tiver alguma coisa (no exterior) não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome’. Eu entendi, mas o que eu ia fazer? Não tinha mais o que fazer. Aí ele falou que ia conversar com a Dilma, que ela estava preocupada com esse assunto e que ia tranquilizá- la”, afirmou Duque.

“Nessas três vezes ficou claro, muito claro para mim, que ele tinha pleno conhecimento de tudo, tinha o comando”, acrescentou o ex-diretor. A defesa do ex-presidente Lula negou as declarações de Duque (mais informações na pág. A6).

Duque ocupou o cargo estratégico na estatal petrolífera, por indicação do PT, de 2003 a 2012.

Foi o próprio ex-diretor que pediu para ser novamente ouvido por Moro, após ficar em silêncio em depoimentos anteriores.

De acordo com Duque, nos encontros que teve com Lula, o ex-presidente sempre o questionava sobre contratos da estatal, mesmo após ele ter saído do cargo.

“(No encontro de 2012) Ele (Lula) começou a fazer algumas perguntas sobre a questão das sondas, uma delas porque não tinha sido aprovado ainda.

‘Presidente, eu não sei responder, eu estou fora da empresa’”, disse. “Aí, teve um segundo encontro que, da mesma maneira, ele fez perguntas sobre sondas, porque não estava recebendo até então, em 2013. Eu não soube responder.”

 

Institucionalizado. Segundo o ex-diretor da Petrobrás, o sistema de contribuições na estatal era institucionalizado e ocorria sempre nos grandes contratos, com valor superior a R$ 100 milhões. “Quando existia um contrato, seja ele qual fosse o contrato, em que corria uma licitação normal, o partido ou normalmente o tesoureiro do partido procurava a empresa e pedia contribuição. E a empresa normalmente dava porque era uma coisa institucionalizada”, afirmou.

“Todos sabiam. Todos do partido, desde o presidente do partido, o tesoureiro, secretário, deputados, senadores, todos sabiam que isso ocorria.” Na audiência, Duque afirmou que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto era o “homem” de Lula no esquema de corrupção na Petrobrás. “Vaccari é da criação do PT, salvo engano. Ele foi apresentado como homem do presidente Lula, que iria cuidar dos interesses das empresas que atuavam junto à Petrobrás, interesses do presidente Lula, interesses políticos.” O ex-executivo da Petrobrás declarou que Vaccari começou a arrecadar propinas em 2007.

“Ele não era tesoureiro, mas começou a atuar na arrecadação.” Moro quis saber o motivo. “Porque o então presidente Lula determinou isso”, respondeu.

Ele disse que conheceu Vaccari em 2007, por meio do então ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Naquele ano, segundo ele, foi chamado a Brasília e, na ocasião, Bernardo disse: “Você vai conhecer uma pessoa indicada pelo… e aí fazia este movimento (neste momento do depoimento, Duque passa os dedos pelo queixo, como se cofiasse uma barba). Não citava o nome”, relatou. “O presidente Lula era chamado por ‘chefe’, ‘grande chefe’, ‘nine’ ou este movimento com a mão.” Questionado como a arrecadação de dinheiro ilícito era destinada ao PT e como esse dinheiro chegava ao partido, o ex-diretor citou outros ex-tesoureiros do PT. “Sempre através do tesoureiro, com Delúbio Soares, depois Paulo Ferreira e depois o Vaccari. Todos sabiam. Ninguém desconhecia.”

 

Arrependimento. A Moro, Duque se disse arrependido das “ilegalidades” que cometeu enquanto foi diretor da Petrobrás, e afirmou estar disposto a “pagar”.

“Quero pagar pelas ilegalidades que cometi. Se for fazer uma comparação com o teatro, da situação que a gente vive, sou um ator, tenho papel de destaque nessa peça, mas não sou nem o diretor nem o protagonista dessa história.” Declarou ainda que quer “passar essa história a limpo”. 

 

OS EX-DIRETORES E A LAVA JATO

Renato Duque

Ex-diretor de Serviços

Indicado pelo PT, permaneceu na Diretoria de Serviços de 2003 a 2012. A área, segundo investigações, era cota do partido no esquema de corrupção na Petrobrás. Condenado a 57 anos e 7 meses de prisão em quatro ações penais da Lava Jato, Duque negocia um acordo de delação premiada. Está preso.

 

 

Paulo Roberto Costa

Ex-diretor de Abastecimento

Ocupou o cargo de 2004 a 2012 por indicação do PP, partido que detinha o controle político da diretoria. Primeiro delator da Lava Jato, foi condenado a 82 anos e 8 meses de prisão em sete sentenças. Cumpre prisão domiciliar.

 

Nestor Cerveró

Ex-diretor de Internacional

Chefiou a área de 2003 a 2008. Foi indicado pelo PMDB, que, segundo a Lava Jato, controlava a diretoria no esquema de corrupção na Petrobrás. Foi condenado a 39 anos de prisão. Fez delação e cumpre prisão domiciliar.

 

Jorge Zelada

Ex-diretor de Internacional

Sucessor de Nestor Cerveró na Petrobrás, comandou a área de Internacional de 2008 a 2012. Tem uma condenação na Lava Jato (12 anos e 2 meses de prisão) e é apontado como nome do PMDB no esquema. Está preso.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45126, 06/05/2015. Política, p. A4.