Presidente da Funai é demitido e ataca governo

André Borges

06/05/2017

 

 

Toninho Costa atribui sua saída a ‘ingerências políticas’ da bancada ruralista, diz que órgão foi abandonado e critica ministro da Justiça

 

 

 

 

 

Antônio Fernandes Toninho Costa foi demitido ontem do cargo de presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai). Ao saber da medida pelo Diário Oficial da União, embora sua saída já fosse dada como certa, Toninho Costa tratou de convocar a imprensa ainda pela manhã para justificar a demissão.

Durante 12 minutos, o pastor Toninho Costa criticou duramente o governo e atribuiu sua demissão após três meses de trabalho a “ingerências políticas” que sofreu no período pela bancada ruralista liderada pelo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, além da “incompetência do governo, que abandonou a Funai e as causas indígenas”.

Serraglio reagiu e, por meio de nota, disse que “dada a extrema importância que o governo dá à questão indígena”, a Funai precisa de uma “atuação mais ágil e eficiente, o que não vinha acontecendo”.

Toninho Costa afirmou que as ingerências políticas partiram inicialmente do líder do governo no Congresso, o deputado André Moura (PSC-SE), que, segundo ele, queria nomear pessoas sem nenhuma ligação com temas indígenas para ocupar cargos na instituição. “Eu não atendi e jamais atenderia, porque o meu compromisso é com as políticas indígenas e com o servidor.” André Moura informou que não comentaria o assunto.

“Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Eu saio porque sou honesto, porque não me curvei e jamais me curvarei para fazer o malfeito”, afirmou Toninho Costa. “A minha exoneração é atribuída a fatores políticos. Há uma incompreensão por parte do Estado brasileiro de não entender o papel do presidente da Funai de executar as políticas indígenas. Isso deve ter contrariado alguns setores”, disse.

“São pessoas que não têm nenhum compromisso com as causas indígenas.” O ex-presidente da Funai disse que espera retaliações por causa de seu posicionamento. “Hoje o próprio governo afirmou que estou saindo por incompetência. Incompetência é a desse governo, que quebrou o País”, afirmou.

Toninho Costa criticou Osmar Serraglio, que, em sua avaliação, tem atuado para defender apenas os interesses da bancada ruralista. “O ministro Serraglio é um excelente deputado, mas ele não está sendo ministro da Justiça, porque ele está sendo ministro de uma causa que ele defende no parlamento.” “O governo brasileiro não cumpre o que está escrito na Constituição com as populações indígenas. A Funai foi esquecida pelo governo, não só por esse governo, mas também por governos anteriores, que deixaram a Funai numa situação caótica. Os povos indígenas precisam de um ministro que faça justiça, não de um ministro que venha pender para um lado. Isso não é papel de ministro. Vocês sabem o lado que ele defende”, afirmou Toninho Costa.

Partido. Apesar de sua indicação para o cargo ter saído do Partido Social Cristão (PSC), do deputado André Moura, Toninho Costa disse que não é filiado à sigla e que atendia ao PSC apenas em trabalhos técnicos.

Toninho também alertou sobre a situação caótica das frentes de proteção que atuam em defesa dos povos indígenas isolados e de recente contato na Amazônia, tema de reportagem do Estado da semana passada. “As frentes de proteção me preocupam muito, porque isso poderá causar uma grande catástrofe internacional, se esses índios ficarem desprotegidos”, disse. “A Funai corre risco, sim, de ser extinta, se continuarem esses ataques parlamentares e os cortes de orçamento.”

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Países cobram Brasil sobre questão indígena

06/05/2017

 

 

Governos de todo o mundo cobraram do Brasil uma resposta sobre ataques a povos indígenas, a garantia de recursos para a Funai e a celeridade na demarcação de terras. As críticas ocorreram durante reunião da ONU sobre políticas de direitos humanos do País realizada ontem. De 103 países que tomaram a palavra para cobrar o Brasil em diversos assuntos, ontem, 34 deles concentraram suas queixas na questão indígena.

O País sabia que o tema seria tratado na ONU. Nesta semana, governos estrangeiros enviaram a diplomatas brasileiros perguntas sobre a Funai, depois do recente caso de violência contra indígenas no Maranhão.

O governo da Noruega exigiu uma resposta para impedir que os ataques continuem, pedido similar ao da Áustria e Holanda.

O governo da Alemanha pediu que o Brasil “garanta que indígenas sejam consultados” e que seus direitos sejam protegidos. A delegação da Suíça criticou a “lentidão” do processo de demarcação de terras no Brasil.

A ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, disse repudiar a violência contra indígenas e afirmou e que há compromisso com os “esforços de demarcação”.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45126, 06/05/2017. Política, p. A7.