Medidas polêmicas recheiam Super-Refis

Lorenna Rodrigues e Eduardo Rodrigues

10/05/2017

 

 

Relatório aprovado em comissão do Congresso estabelece que não incidem tributos, como o IRPF, quando uma empresa contrata outra

Além de ampliar o prazo e criar descontos generosos no Programa de Regularização Tributária, o relatório da Medida Provisória 766, aprovado pela comissão mista do Congresso Nacional na semana passada, trouxe uma série de emendas com assuntos que vão além de um novo Refis.

São artigos que facilitam a contratação de PJs, modificam a legislação de execução fiscal e até aumentam a fatia que Estados e municípios receberão do programa de repatriação de recursos do exterior.

O relatório será votado no plenário das duas casas.

Uma das emendas estabelece que não incidem tributos como contribuições previdenciárias e Imposto de Renda Pessoa Física quando uma empresa contrata outra, mesmo quando a contratada for formada por apenas um profissional que presta serviços exclusivamente para o contratante. De acordo com tributaristas, isso na prática libera a contratação de pessoas jurídicas (PJ) sem a obrigação de pagamento dos tributos que incidem na relação de trabalho, como o INSS, que é o entendimento reinante hoje na Justiça trabalhista.

O artigo também beneficiará PJs como artistas e atletas, que constituem empresa para oferecer serviços “personalíssimos”, ou seja, prestados por eles mesmos. Há entendimento na Receita Federal de que muitas vezes esses profissionais se tornam pessoa jurídica apenas para fugir da alíquota do Imposto de Renda Pessoa Física, que chega a 27,5% – para pessoa jurídica, é de 15%.

Recentemente, esportistas como Guga e Neymar foram condenados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a recolher valores que deixaram de ser pagos porque eles vinham pagando tributos via empresas. “Essa legislação é uma barreira para que a autoridade previdenciária busque receber tributos nesses casos”, afirma o advogado Maucir Fregonesi, do escritório Siqueira Castro. “É uma situação que já existe na prática em alguns setores, mas que levanta dúvidas.” Para o advogado Mateus Bueno de Oliveira, do PVG Advogados, a inclusão de artigo sobre a contratação de PJs em um projeto que não trata do tema chama atenção. “Temo que o assunto não esteja sendo debatido e esteja passando em paralelo às reformas previdenciária e trabalhista.” Alterações. Uma das emendas determina que são impenhoráveis valores depositados em conta bancária destinada à manutenção do capital de giro de empresas. Também foi colocado como primeira prioridade na ordem de penhora de bens de devedores imóveis, juntamente com dinheiro.

A mudança tornará os bens penhoráveis menos líquidos para os governos, já que hoje a prioridade é bloquear apenas dinheiro.

Além disso, especialistas alegam que é difícil estabelecer o que é capital de giro. “Fica pior para a Fazenda Nacional”, avalia Oliveira, do PVG.

Outra emenda aumenta a parte que a União deve repartir com Estados e municípios da multa arrecadada com o programa de repatriação, que passa de 46% para 49%, seguindo critérios previstos na Constituição.

Também foi incluída mudança na legislação do Carf que perdoa empresas de pagarem multas quando há empate na decisão do conselho. Como o órgão tem metade dos conselheiros indicados pela Fazenda e outra metade por representante de contribuintes, são comuns empates.

A mudança beneficiará grandes devedores, entre eles empresas ligadas a parlamentares.

O QUE MUDA NO NOVO REFIS

Data de corte

Antes: 30 de novembro de 2016

Como fica: 31 de março de 2017

Modalidades

(1) Antes: Pagamento de 20% à vista e liquidação do restante com créditos tributários.

Sem desconto para multas.

Como fica: Pagamento total à vista. Desconto de 90% das multas.

(2) Antes: Pagamento de 24% da dívida em 24 parcelas e liquidação do restante com créditos tributários. Sem desconto para multas.

Como fica: Pagamento de 5% em cinco prestações e liquidação do restante em 150 parcelas (12 anos e meio). Desconto de 85% da multas.

(3) Antes: Pagamento de 20% à vista e liquidação do restante em 96 prestações (8 anos). Sem desconto para multas.

Como fica: Pagamento de 10% em dez prestações e liquidação do restante em 180 parcelas (15 anos). Desconto de 80% das multas.

(4) Antes: Pagamento em até 120 prestações que crescem ao longo do tempo (10 anos). Sem desconto para multas.

Como fica: Pagamento de 20% em 20 prestações e liquidação do restante em 240 parcelas (20 anos). Desconto de 75% das multas.

Nova modalidade

Pagamento sem limite de parcelas, com prestações entre 0,3% e 1,5% do débito, calculadas pelo tipo de tributação do devedor. Desconto de 70% das multas.

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Setor de bebidas questiona inclusão na MP

Dayanne Sousa e Eduardo Rodrigues

10/05/2017

 

 

Presidente da Ambev discute tema em reunião com Rodrigo Maia; pequenos fabricantes defendem medida

O presidente da Ambev, Bernardo Paiva, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, se reuniram ontem, por conta da reação do setor de bebidas contrário à inclusão no Novo Refis de medida que limita o uso de créditos tributários relacionados ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) por fabricantes instalados na Zona Franca de Manaus.

Procurada, a Ambev não descartou que a pauta do encontro envolvia o “jabuti”, como são chamados temas incluídos em medida provisória sem relação com assunto principal. A companhia evitou dar detalhes e disse que também foram discutidos temas relacionados às expectativas da empresa para o ano depois de a fabricante ter divulgado seus resultados do primeiro trimestre de 2017.

Desde a semana passada, parlamentares da bancada do Amazonas na Câmara e no Senado têm prometido derrubar a emenda que prejudica a produção de extratos para refrigerantes na Zona Franca.

Eles já teriam em mãos requerimentos para a retirada do “jabuti”, mas acreditam que o presidente da Câmara, possa eliminar o artigo – de ofício – para seguir o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que questões alheias ao tema de uma medida provisória (MP) não podem ser “contrabandeadas” para dentro de uma MP.

Na Câmara, o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) já adiantou que combaterá a emenda que deflagrou a “guerra do refrigerante”. Do Senado, o ex-ministro Eduardo Braga (PMDB-AM) já enviou um pedido à mesa diretora do Congresso para a retirada dos três artigos que tratam da tributação das bebidas.

Críticas ao tema da chamada “compensação cruzada” de créditos tributários pelo setor de bebidas têm sido levantados por pequenos produtores.

Eles alegam que a indústria de bebidas carece de isonomia porque grandes fabricantes usam créditos gerados na produção de concentrado para refrigerantes na Zona Franca para abater impostos relacionados a outros produtos que não refrigerantes: caso das cervejas ou sucos.

Do lado da defesa da inclusão do tema na medida provisória está a Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (Afrebrás), que reúne pequenos fabricantes e promete brigar pela manutenção do item na pauta. A entidade afirma que a renúncia fiscal das multinacionais de concentrado localizadas na Zona Franca de Manaus foi de R$ 9,6 bilhões no ano de 2015.

’Jabuti’

Medida limitando o uso de créditos tributários relacionados ao IPI por fabricantes na Zona Franca de Manaus tem sido chamada de ‘jabuti’ por não estar relacionada com assunto principal da MP.

 

O Estado de São Paulo, n. 45130, 10/05/2017. Economia, p. B3