Lava Jato agora avalia ação contra Lula por obstrução 

Ricardo Brant 

15/05/2017

 

 

Justiça. Investigadores de Curitiba veem supostos pedidos de destruição de provas e intimidação de autoridades como elementos para abrir novo processo contra petista

O depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao juiz federal Sérgio Moro reforçou os indícios reunidos por investigadores da Operação Lava Jato, em Curitiba, de atuação do petista em atos de obstrução à Justiça e embaraço à força-tarefa que apura o maior escândalo de corrupção do País. As suspeitas devem provocar a abertura de novo inquérito contra Lula, na capital do Paraná, e resultar em mais um processo criminal.

A força-tarefa avalia existir elementos de que Lula, ao longo dos três anos de investigações ostensivas, buscou obstruir o trabalho da Justiça, com episódios que envolvem suposta destruição de provas e intimidação de autoridades. A defesa do ex-presidente afirma que a Lava Jato abriu “uma nova linha de ataque” contra o petista .

O ex-presidente já é réu em cinco ações penais, duas delas abertas por Moro. Na 10.ª Vara Federal do Distrito Federal, o petista é réu, desde julho de 2016, acusado de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, o que também teria caracterizado o crime de obstrução à Justiça.

Em quase cinco horas de interrogatório, em Curitiba, na quarta-feira passada, Lula confirmou ter se reunido com três alvos da Lava Jato – um deles delator e outros dois em negociação de acordo –, em 2014, quando as investigações já haviam sido deflagradas. O petista, no entanto, negou irregularidades.

O ex-presidente narrou encontros com o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque e com o ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro. Os dois, também réus da Lava Jato e já condenados, contaram que Lula teria pedido para que provas fossem destruídas.

Para três investigadores da força-tarefa ouvidos pelo Estado, sob a condição de não ter os nomes revelados, o ato de buscar informações sobre provas de crimes confirma a acusação de que Lula não era alheio ao esquema de corrupção na Petrobrás. Procuradores e policiais federais dizem que esses indícios fornecem elementos para aprofundar apurações de novos crimes.

Indícios. O principal episódio contra Lula refere-se ao caso do triplex do Guarujá, que o petista nega ser seu, e foi revelado a Moro por Pinheiro. “Eu tive um encontro com o presidente em junho (de 2014). Bom, isso tenho anotado na minha agenda”, afirmou o empreiteiro. “‘Léo, você fez algum pagamento ao João Vaccari (Neto, ex-tesoureiro do PT) no exterior?’ Eu disse: ‘não, presidente, eu nunca fiz pagamento dessas contas que temos com Vaccari no exterior’.”

Pinheiro reconheceu ter feito pagamentos por meio de caixa 2 a Vaccari. Segundo ele, Lula deu uma ordem: “Você tem algum registro de encontro de contas, de alguma coisa feita com Vaccari com você? Se tiver, destrua!”. Lula negou a Moro o conteúdo da conversa.

Já Duque, indicação do PT na Petrobrás, disse a Moro que encontrou Lula em junho de 2014 no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. O ex-diretor, condenado a 57 anos e 7 meses de prisão, atribuiu a Lula a frase:

“Olha, presta atenção no que vou te dizer: se tiver alguma coisa não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome entendeu?”. Segundo Duque, Lula o questionou sobre a existência de contas do ex-diretor na Suíça.

Também está na mira da Lava Jato o encontro que Lula confirmou ter ocorrido com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em 3 de junho de 2014, uma hora antes de se encontrar com Pinheiro, na sede do Instituto Lula, em São Paulo.

Machado virou delator e abalou a cúpula do PMDB ao gravar conversas sobre um “acordão”, interpretado como uma tentativa de “estancar” a Lava Jato.

Em março daquele ano, a Lava Jato havia chegado a Lula. Segundo o ex-presidente, Machado o convidara para a inauguração de um navio.

Ameaça.Nos 15 minutos finais do interrogatório de Lula, Moro também advertiu o ex-presidente sobre sua conduta “inadequada” de tentar intimidar autoridades. Em declarações públicas, o petista disse que poderia um dia “mandar prender” os procuradores da República que o investigam, “lembraria dos delegados” que o conduziram coercitivamente, em março de 2016, e que só ele poderia “brigar” com a Lava Jato.

No processo do triplex, Lula é réu sob a acusação dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro – a pena pode chegar a 22 anos de prisão. Ele supostamente teria recebido R$ 3,7 milhões da OAS por meio do triplex e do armazenamento do acervo presidencial.

Acusações. Lula é réu em 5 ações e responde por tentar comprar o silêncio de Cerveró

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Nova defesa de Palocci nega 'exigências' da Lava Jato para delação 

Rafael Moraes Moura e Fausto Macedo

15/05/2017

 

 

Escritório de Curitiba afirma que troca de advogados foi escolha ‘livre e espontânea’ do ex-ministro petista

Os novos advogados do ex-ministro Antonio Palocci informaram ontem que a força-tarefa da Lava Jato não fez “qualquer exigência, nem sequer mínima alusão” para que o ex-ministro (Fazenda e Casa Civil dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff) trocasse de defesa como condição para negociar uma delação premiada.

Palocci trocou seu quadro de defensores na sexta-feira. Desde o início da Lava Jato ele era representado pelo criminalista José Roberto Batochio. O ex-ministro decidiu buscar um acordo e abriu mão de Batochio.

Palocci contratou o advogado Adriano Bretas, defensor de alvos da Lava Jato que fizeram delação. A mudança teria sido uma exigência do Ministério Público Federal para iniciar a negociação. Os procuradores também teriam recomendado ao ex-ministro que desistisse do habeas corpus.

Em nota divulgada ontem, o Bretas Advogados, estabelecido em Curitiba, afirmou que “tal escolha (troca de advogados) foi feita por livre e espontânea vontade do sr. Antonio Palocci Filho”. O texto é subscrito pelos advogados Adriano Bretas, Tracy Reinaldet, André Pontarolli e Matteus Macedo.

A nova defesa também negou versão sobre eventual desistência do pedido de habeas corpus. “Desistir ou prosseguir no habeas corpus é escolha livre e exclusiva da defesa, sem qualquer interferência, muito menos ‘exigência’, do Ministério Público Federal, da Polícia Federal ou de quem quer que seja.”

Réu. Preso desde setembro de 2016, o ex-ministro já é réu em duas ações penais, uma delas sobre propina de R$ 128 milhões que teria recebido da Odebrecht – parte do valor supostamente repassado para o PT. Em março, o ex-ministro acenou ao juiz Sérgio Moro com a disposição de colaborar. Disse, na ocasião, que teria informações que fariam esticar a Lava Jato por mais um ano, pelo menos. / RAFAEL MORAES MOURA  e FAUSTO MACEDO

Detido. Palocci está preso há quase 8 meses

 

O Estado de São Paulo, n. 45135, 15/05/2017. Política, p. A4