‘Lava-Jato está sendo sufocada’, diz Deltan

Gustavo Schmitt

29/07/2017

 

 

CRISE SEM TRÉGUA - Procurador afirma que ministro da Justiça é responsável e cobra mais do que ‘palavras vazias’

 

 O procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato em Curitiba, disse ontem que o ministro da Justiça, Torquato Jardim, tem responsabilidade direta na redução dos quadros da operação e, por isso, precisaria demonstrar apoio com mais do que apenas “palavras vazias". Para Dallagnol, há um enfraquecimento dos trabalhos da força-tarefa diante de cortes orçamentários na Polícia Federal, que, diz ele, está “sem fôlego" para avançar nas investigações.

Palavras sem atitude correspondente, ou até mesmo contrárias, são palavras vazias — disse o procurador ao GLOBO.

Torquato havia admitido que a redução no orçamento da PF poderia afetar novas operações. Para Dallagnol, o ministro tem a responsabilidade de recompor os quadros.

— A Lava-Jato está sendo sufocada. Ele (Torquato) tem poder e responsabilidade de recompor (os quadros). As palavras dele são desmentidas pelos fatos — disse o procurador.

O procurador afirmou que a falta de pessoal atinge a PF, que hoje investiga “muito menos". Lembrou que o fim do grupo de trabalho da PF exclusivo da Lava-Jato em Curitiba, em 6 de julho, é um dos sintomas do enfraquecimento. A PF nega e tem dito que a medida teve caráter apenas administrativo.

— A PF está afundada na burocracia de inquéritos policiais, sem capacidade, sem fôlego para avançar nas investigações. Nas últimas sete fases, seis foram pedidas pelo MP. Se a polícia tivesse mantido o pessoal, teríamos pelo menos 12 fases: seis da PF e seis do MP.

Ao se referir à votação da denúncia do presidente Michel Temer na Câmara dos Deputados na próxima quarta-feira, Dallagnol centrou fogo no governo do peemedebista e afirmou que acredita que o país não quer ter como representante máximo uma pessoa sobre a qual pesam fortes evidências de corrupção.

— A questão da votação no Congresso é diretamente relacionada à autoimagem do brasileiro. Nós queremos nos identificar como um povo representado pela corrupção? Acredito que a resposta é não. E o Congresso, se refletir a vontade popular, vai autorizar que Temer tenha sua responsabilidade avaliada pelo STF.

 

EM BUSCA DE PROTEÇÃO

Na avaliação de Dallagnol, o governo se movimenta para se proteger das investigações. Para ele, Temer busca se blindar no discurso de estabilidade econômica.

— Todos querem estabilidade, para que o país se recupere economicamente. Mas essa estabilidade que o governo vende está colocada sobre alicerces corroídos. O presidente cercouse de diversas pessoas que, dia após dia, caíram em razão do envolvimento em corrupção. Ou até mesmo chegaram a ser presas, como é o caso do Geddel Vieira Lima (ex-ministro).

 

Ação

Fim do grupo de trabalho exclusivo da Operação Lava-Jato em Curitiba

 

“Nada foi retirado da capacidade operacional da Polícia Federal para investigar a Lava-Jato”

Torquato Jardim

 

"Contingenciamento de R$ 400 milhões do orçamento da Polícia Federal

 

“Isso poderá implicar um processo seletivo de ações, não se realizar todas as operações necessárias”

Torquato Jardim

 

Reação

Procuradores da força-tarefa da Lava-Jato no Paraná protestam contra cortes

 

“A redução do número de delegados a menos de metade prejudica as investigações da Lava-Jato”

Nota dos procuradores

 

Coordenador da força-tarefa diz que falta de dinheiro já compromete investigações

 

“O que acontece de fato é uma redução dos quadros da Lava-Jato, é um sufocamento da Lava-Jato”

Deltan Dallagnol

 

O globo, n.30672 , 29/07/2017. PAÍS, p.6