Valor econômico, v. 18, n. 4257, 18/05/2017. Política, p. A10

Delação de Funaro na Justiça de Distrito Federal perde razão de ser

 

Vanessa Adachi


Lúcio Bolonha Funaro passou de potencial delator a delatado. Preso há quase um ano no presídio da Papuda, em Brasília, Funaro era a grande esperança dos procuradores do Ministério Público no Distrito Federal para conseguir colocar as mãos definitivamente sobre o empresário Joesley Batista e os negócios do grupo J&F.

A expectativa era que, se ele delatasse tudo o que sabe, não restariam dúvidas de que os Batista pagaram propinas a políticos para obter recursos em condições vantajosas em bancos públicos e fundos de pensão de estatais.

Em conversas com procuradores da força-tarefa formada para dar conta das operações Sépsis, Greenfield e Cui Bono?, Funaro chegou a dizer que Joesley Batista era seu maior cliente e que, por essa razão, não o denunciaria. Agora, sabe-se pelo conteúdo da delação de Joesley Batista que Funaro vinha sendo remunerado para manter o silêncio. Nos últimos meses havia rumores de que ele poderia, finalmente, falar. Mas não houve tempo. O doleiro virou dano colateral na estratégia dos irmãos Batista de reduzir o impacto das investigações sobre o grupo.

O advogado de Lúcio Funaro, Fernando Guimarães, disse na noite de ontem ao Valor que foi surpreendido pela delação dos irmãos Batista. De acordo com ele, não estava em pauta com seu cliente a possibilidade de um acordo de delação. "Estive ontem [terça-feira] com o Lúcio e falamos de outras coisas, de um habeas corpus". Ele também disse desconhecer qualquer pagamento dos Batista a Funaro. "Nem sei o que ele [Lúcio] teria para delatar", disse.

Para os procuradores do MP-DF, o principal indício de que o grupo J&F tinha negócios escusos com Funaro era um contrato guarda-chuva que a holding mantinha com a Viscaya, empresa do doleiro, no valor de R$ 100 milhões. Sob esse contrato, o grupo emitia toda sorte de notas fiscais para Funaro. Até mesmo a Eldorado Celulose, empresa de celulose do grupo, fez pagamentos à empresa de Funaro. Segundo a empresa, o pagamento foi feito para honrar uma obrigação da holding J&F.

Apontado como operador de propina do ex-deputado Eduardo Cunha, Lúcio Funaro foi preso em 1 de julho do ano passado, na Operação Sépsis, um desdobramento da Lava-Jato, que investiga pagamentos de propinas para liberar recursos do FI-FGTS, gerido pela Caixa. Funaro entrou na mira do MP depois que Fábio Cleto, ex-presidente da Caixa apontado por Cunha, o indicou em sua delação como o operador da propina entre grupos empresariais e o ex-deputado.

Ao embasar o pedido de prisão de Funaro, o procurador geral da República, Rodrigo Janot, disse que o doleiro tinha o crime como "modus vivendi". "Apareceu no escândalo do Bancoop, afirmando que o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, cobrava propina para intermediar negócios com fundos de pensão em favor do partido. Funaro também foi envolvido no caso Banestado e na Operação Satiagraha, na qual chegou a ser preso.

Da mesma forma, Funaro foi diretamente envolvido no caso mensalão, responsável por repassar valores da SMP&B (empresa de Marcos Valério) "ao antigo Partido Liberal, em especial a Waldemar da Costa Neto, por intermédio de sua corretora Guaranhuns", escreveu Janot no documento.

Ao ser questionado se seu cliente virara "dano colateral", o advogado Fernando Guimarães respondeu que "amanhã é outro dia".

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Governo estuda acelerar MP da mineração

 

Daniel Rittner
Raphael Di Cunto
 

Em troca de apoio à reforma da Previdência, o governo estuda antecipar uma medida provisória que eleva os royalties da mineração e tem sido esperada pelo mercado há meses. O pedido de aceleração da MP foi feito pelo coordenador da bancada de Minas Gerais, deputado Fábio Ramalho (PMDB), que almoçou ontem com o presidente Michel Temer e insistiu na importância de aumento imediato da Contribuição Financeira para a Exploração dos Recursos Minerais (Cfem).

Um ministro com gabinete no Palácio do Planalto disse ao Valor que a mudança nos royalties pode sair antes da votação da reforma na Câmara e depende apenas de um pente-fino dentro do governo, mas não existem divergências relevantes. Os royalties para o minério de ferro vão ser elevados de 2% para até 4%, com alíquotas móveis que seguem uma "banda" de preços, conforme os altos e baixos da commodity no mercado internacional.

De acordo com Ramalho, o projeto vai gerar receita para os municípios sem criar despesa para o governo federal. O pedido é para que a MP saia antes da votação da reforma, o que o Palácio do Planalto pretende que ocorra em duas a três semanas. Para o pemedebista, que ocupa a vice-presidência da Câmara, será preciso esperar mais de um mês para a votação. "Pedi para sair antes da Previdência. Não é troca. É uma forma de juntar mais gente a favor da reforma", afirmou. O presidente encarou a sugestão, que também agrada aos deputados do Pará, como positiva, segundo Ramalho.

Duas ou três MPs já vinham sendo elaboradas ao longo dos últimos meses. Os textos preliminares saíram na terça-feira do Ministério de Minas e Energia e foram remetidos para análise de outras duas pastas - Fazenda e Planejamento - que precisam dar aval. Em seguida, caberá à Casa Civil a última revisão e o encaminhamento para assinatura de Temer.

O assunto tem forte apelo nos municípios detentores de jazidas porque eles ficam com 65% da arrecadação com a Cfem. Em 2016, as receitas totais atingiram R$ 1,8 bilhão - os Estados mineradores se apropriam de 23% e 12% vão para os cofres da União. Além da mudança nas alíquotas, os royalties serão cobrados sobre o faturamento bruto, não sobre o líquido. Com isso, a perspectiva é praticamente dobrar a arrecadação.

Ao contrário da reforma do código de mineração enviado ao Congresso Nacional pela ex-presidente Dilma Rousseff, que concentrava todas as mudanças em um único projeto de lei, a decisão do governo agora é fatiar o novo marco regulatório do setor. Uma MP tratará especificamente dos royalties. Outra focará a transformação do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em agência reguladora, com mandatos por tempo definido.

A única indefinição gira em torno de aproximadamente 20 alterações nas regras do setor, como o tempo para pesquisa e a exploração de jazidas, que podem sair por uma terceira MP ou serem encaixadas em uma das duas medidas provisórias. O objetivo do fatiamento é minimizar resistências dos parlamentares a pontos específicos da reforma durante a tramitação no Congresso.

Outra diferença crucial na comparação com o projeto assinado por Dilma em 2013 é que, desta vez, as novas alíquotas da Cfem serão incluídas na lei. A ex-presidente queria apenas um aumento do teto dos royalties, mas definindo as alíquotas por decreto. Isso foi mal visto pelo setor, já que dava maior imprevisibilidade em torno do pagamento feito pelas mineradoras. O projeto costurado pelo governo anterior ficou parado no Congresso e nunca foi submetido a votação.

No mês passado, uma comitiva de sete prefeitos da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig) levou ao ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, pedido de urgência para a publicação da MP sobre os royalties. De acordo com a associação, o ministro sinalizou positivamente à demanda. A Amig acrescenta que outros países com grande produção de minérios, como o Canadá e a Austrália, já praticam alíquotas superiores a 10% atualmente.

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Senado quer votar reforma trabalhista em junho

 

Fabio Murakawa

 

Em reunião ontem no Palácio do Planalto, o presidente Michel Temer e um grupo de senadores definiram um calendário para a tramitação da reforma trabalhista no Senado. No encontro, eles acertaram também algumas das mudanças que serão incluídas em uma medida provisória a ser editada para fazer ajustes no texto, evitando assim que ele retorne à apreciação da Câmara dos Deputados.

Ficou acertado que o fim da contribuição sindical obrigatória permanecerá e sem um período de transição, como pleiteiam as centrais sindicais. Mas o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), ainda articula para tentar reverter essa medida e atenuar vários pontos da reforma, se possível no plenário do Senado.

Participaram do encontro no Planalto o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), que acumula a relatoria da matéria nas comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Assuntos Sociais (CAS); o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado e relator da reforma na Comissão de Constituição e Justiça; os presidentes da CAE, Tasso Jereissati (PSDB-CE), e da CAS, Marta Suplicy (PMDB-SP); e Antonio Anastasia (PSDB-MG), primeiro vice-presidente da CCJ.

Pelo calendário estipulado, a votação da reforma em plenário deve ocorrer entre os dias 12 e 15 de junho. Ferraço marcou a leitura de seu parecer na CAE para o dia 23 de maio. A votação, ali, ocorrerá no dia 30. Na CAS, a leitura ocorrerá em 31 de maio, com votação em 7 de junho. Não foi definido um calendário para a CCJ, mas leitura e votação devem ocorrer antes de 15 de junho.

Ferraço explicou que incluirá as mudanças que forem acertadas entre os senadores ao projeto oriundo da Câmara no texto introdutório de seu parecer, não promovendo nenhuma mudança ou supressão nos artigos da reforma.

Evita-se, assim, que o projeto retorne à Câmara. Segundo ele, Temer se comprometeu a contemplar as alterações em uma medida provisória (MP).

Por enquanto, foram acertadas com o presidente quatro alterações. Mas segundo Ferraço, mais mudanças poderão ser incluídas na MP, desde que pactuadas entre Senado e Planalto.

As mudanças acertadas até o momento são: 1) veto ao artigo que permite o trabalho de gestantes e lactantes em local de trabalho insalubre; 2) manutenção do intervalo de 15 minutos, para as mulheres, entre a jornada normal e a hora extra, que o texto advindo da Câmara havia eliminado; 3) restringir a jornada intermitente para os setores de comércio e serviços; 4) estabelecer que a jornada de 12 horas por 36 de descanso só pode ser estipulada por meio de acordo coletivo (o texto atual permite que ocorra por acordo individual).

Renan Calheiros, entretanto, ainda defende que as mudanças devem ser feitas pelos senadores no texto da reforma. E também que novas mudanças sejam introduzidas na reforma.

"A estratégia tem que ser debater a reforma como um todo", disse Renan. "Correr para entregar uma reforma ruim não é um encaminhamento inteligente."

Ontem, Renan voltou a receber líderes de centrais sindicais para debater a reforma. Na ocasião, o deputado federal e presidente da Força Sindical Paulinho da Força (SD-SP), apresentou uma contraproposta à reforma trabalhista.

O contraprojeto altera vários pontos do texto relatado pelo deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), que modifica mais de cem artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Dentre outras coisas, a proposta, elaborada pelo gabinete de Paulinho com a ajuda de técnicos do Dieese, estabelece um período de transição para o fim da contribuição sindical obrigatória e reduz a previsão de acordos individuais entre patrões e empregados em detrimento dos acordos coletivos - sempre com participação dos sindicatos. Também restabelece o papel dos sindicatos na homologação da demissão do trabalhador.

Mais tarde, Renan disse que debateria as mudanças com Ferraço e com o presidente Michel Temer, com quem vinha se desentendendo por conta das reformas. Kátia Abreu, por sua vez, recomendou moderação aos sindicalistas. "O melhor jeito de não mexer em nada é querer tudo", disse.