Reformas impõem desafios a sindicatos 

Cleide Silva, Márcia De Chiara e Ricardo Galhardo

01/05/2017

 

 

Mudanças como fim do imposto sindical e negociações diretas nas empresas devem obrigar sindicalismo a buscar novos caminhos

O movimento sindical comemora hoje (dia 1º) o 1.º de Maio, data ícone para as organizações de trabalhadores, tendo de rever seu papel na sociedade brasileira. Após mais de uma década de atuação praticamente sem grandes mobilizações, até porque havia um alinhamento com o governo do PT, as centrais sindicais agora estão acuadas.

A reforma trabalhista pode minar o poder de atuação das entidades sindicais ao acabar com o imposto sindical e estabelecer negociações por meio de representantes internos nas empresas com mais de 200 funcionários. A reforma da Previdência é outra dor de cabeça. Além disso, há número recorde de 14,2 milhões de desempregados no País.

“O sindicalismo vai passar por um momento extremamente delicado porque vai estar fragilizado em todas as suas forças”, diz o procurador geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury. Para ele, as duas maiores ameaças às entidades são a possibilidade de extinção do imposto sindical e a criação de comissões de negociação sem a participação dos sindicatos.

Para Fleury, antes da reforma trabalhista, o governo deveria fazer uma reforma na estrutura sindical. “Vai haver uma diluição do poder de negociação. Uma mudança possível seria acabar com a unicidade sindical. Se uma entidade não tem concorrência, vai correr atrás do trabalhador para quê?”

Na opinião do diretor técnico do Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, desde os anos 2000 o movimento sindical não tinha esse tipo de ataque. Nos últimos anos houve redução de desemprego, ganho de renda e o Congresso não se debruçou em temas que afetavam diretamente a classe trabalhadora.

Com as reformas em curso, Lúcio acredita que o movimento sindical terá de se recolocar e sair da situação de certo conforto, pois não estava sendo atacado. “O que se tem hoje é o movimento sindical se reposicionando para uma situação de desemprego crescente e ataque do Estado, por meio do governo, a um padrão civilizatório de relações sociais. É uma mudança.”

Lobby. Com o fim do imposto obrigatório, José Marcio Camargo, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio, avalia que sindicatos e centrais terão de se voltar para suas bases e prestarem melhor atendimento aos trabalhadores para, assim, angariarem mais filiados que possam ajudar a manter suas estruturas.

“Eles terão de se voltar mais para as atividades sindicais e deixarem de se ocupar em fazer lobby junto aos deputados para aprovar ou não determinadas leis”, afirma Camargo. “Vai precisar ter mais o componente de luta sindical de verdade do que interesses políticos.” Para ele, entidades fortes vão prevalecer, mas, com o fim do imposto sindical, “os sindicatos pelegos e de fachada vão acabar”.

Na avaliação de analistas, durante os governos Lula e boa parte do governo Dilma, as centrais, em especial a CUT, ficaram à mercê das administrações, inclusive com sindicalistas ocupando cargos estratégicos. “O papel a partir de agora volta a ser mais para o lado econômico, de questões como condições de trabalho e salários, por exemplo”, diz Tiago Barreira, pesquisador do Ibre/FGV.

O professor da Escola de Economia da FGV-SP, André Portela, avalia que “dar mais peso às negociações pode fortalecer os sindicatos, mas, sem arrecadar imposto sindical, num primeiro momento todos vão enfraquecer, até mesmo os grandes.”

Vulnerabilidade

“O sindicalismo vai passar por um momento extremamente delicado porque vai estar fragilizado em todas suas forças.”

Ronaldo Curado Fleury

PROCURADOR GERAL DO TRABALHO

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Centrais discutem os próximos passos para barrar reformas

Cleide Silva, Márcia De Chiara e Ricardo Galhardo

01/05/2017

 

 

Pressão direta sobre senadores, marcha a Brasília e uma nova greve geral de dois dias são as opções de luta

As tradicionais comemorações do Dia do Trabalho, em São Paulo, devem trazer mais uma mostra da postura mais agressiva das centrais sindicais em relação ao governo. Essa linha de confronto já tinha ficado clara na sexta-feira, com a convocação de uma greve geral contra as reformas trabalhista e previdenciária.

As centrais CUT, CTB e Intersindical realizam seu evento hoje em dois pontos: haverá um ato político na Avenida Paulista e shows de artistas na Praça da República. Já o evento da Força Sindical, com shows e sorteios de carros, será realizado na Praça Campo de Bagatelle.

As centrais também já começaram a discutir os próximos passos em relação às reformas propostas pelo governo. O primeiro será pressionar os senadores, tanto em Brasília quanto nas suas bases eleitorais, para barrar a reforma trabalhista, que ainda tem de passar pelo Senado. Se não for suficiente, as entidades avaliam promover uma grande marcha a Brasília e nova greve geral, desta vez com dois dias de duração.

Mas, caso as reformas não sejam derrubadas, o caminho deve ser a política eleitoral. “Se não conseguirmos (derrubar as reformas), a via é eleger em 2018 um governo que revogue as reformas, na linha do que tem sido feito em alguns países da Europa”, diz o diretor executivo da CUT, Julio Turra. Ele avalia que a extinção do imposto sindical não é uma ameaça real e foi incluída no texto da reforma para, depois, servir de moeda de troca na negociação com as centrais alinhadas ao governo. “O próprio Paulinho (Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical) disse que o Temer vai vetar”, afirma Turra. Fonte da direção da Força que participa de reuniões com o presidente Temer confirma, sob condição de anonimato, que o fim do imposto sindical pode ser apenas uma moeda de troca do governo.

Receita. Segundo Paulinho, 95% da receita da Força vem da parte que cabe à entidade do imposto sindical. Em 2016, foram arrecadados com o imposto R$ 3,5 bilhões, de trabalhadores e empresas. O dinheiro é dividido entre sindicatos de trabalhadores e patronais, federações, confederações, centrais e Ministério do Trabalho.

A festa do 1º de Maio da Força, que este ano sorteia 19 carros, “é totalmente patrocinada e não usa dinheiro da central”, diz Paulinho. A CUT não informa quanto de sua receita vem do imposto e diz que sempre foi contra sua cobrança. A entidade defende uma contribuição a ser aprovada pelos trabalhadores.

Para o Presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, este mês haverá outras greves. “Com certeza, o governo vai ficar numa posição de insustentabilidade daqui a pouco, porque a população não vai permitir que se tire direitos”, alerta.

Essa também é a avaliação do presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araujo. “Depois da greve, novas greves, novas lutas.” Patah acredita que a reforma trabalhista não passe no Senado e deposita as fichas na posição mais equilibrada dos senadores, ao contrário do estrelismo, segundo ele, visto na votação da Câmara/ C.S., M.C. e R.G.

 

O Estado de São Paulo, n. 45121, 01/05/2017. Economia, p. B4