Temer aposta fichas em decisão do STF

Murillo Camarotto e Luísa Martins

20/05/2017

 

 

Levada ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), a decisão sobre o pedido de suspensão do inquérito contra o presidenteMichel Temer, na próxima quarta-feira, vai ajudar a definir o destino do governo. Apegado aos indícios de adulteração do áudio que flagrou sua conversa com o empresário Joesley Batista, o presidente deposita as fichas em uma interpretação favorável da maioria dos integrantes do STF.

Interlocutor frequente de Temer, o ministro Gilmar Mendes é considerado pela própria acusação como um voto favorável à suspensão do inquérito. Desde que a crise eclodiu, entretanto, ele ainda não se manifestou. Nos bastidores, a Procuradoria-Geral da República (PGR) contabiliza pelo menos quatro votos pró-Temer: Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e José Antonio Dias Toffoli, além de Gilmar.

A PGR ainda considera imprevisível o posicionamento do decano do Supremo, ministro Celso de Mello, informalmente chamado na procuradoria de "swing state", em referência aos estados americanos que não mantêm uma posição clara entre os partidos Republicano e Democrata.

Outra dúvida é a presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, cujo nome aparece entre os possíveis candidatos a presidentetampão em caso de saída de Temer. A expectativa, no entanto, é que ela acompanhe o relator do caso, ministro Edson Fachin, responsável pelos processos da Lava-Jato. Ele deve defender a manutenção do inquérito contra o presidente.

O ministro Marco Aurélio Mello disse ao que ainda não tem avaliação formada sobre o caso. "Quero ouvir o relator. Como juiz, devo ter muita paciência em ouvir", disse ontem ao Valor. Não há indicações muito claras sobre a posição dos demais integrantes do Supremo: Rosa Weber, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.

Apesar do cenário apertado, a PGR considerou positivo o encaminhamento da decisão para o plenário do Supremo. A avaliação interna é de que a manifestação do colegiado, formado por 11 ministros, emprestará ainda mais credibilidade do inquérito.

Em sua sustentação oral no plenário do Supremo, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pretende manifestar a confiança total do órgão nas provas colhidas. Dirá, ainda, que mesmo que o áudio contestado não existisse, o restante do acervo probatório é mais do que suficiente para a instauração do inquérito.

Fachin determinou no sábado que a perícia no áudio seja feita "imediatamente" pelo Instituto Nacional de Criminalística. Ontem, tanto a PGR quanto a defesa de Temer encaminharam as perguntas que gostariam que fossem respondidas na perícia. Após esta etapa, as partes serão notificadas para se manifestar em 24 horas. A expectativa dos investigadores é de que tudo esteja pronto antes do julgamento.

Caso a perícia revele que o áudio foi manipulado, o plenário do STF deve decidir se suspende ou não o inquérito contra opresidente. Se a gravação estiver intacta, os ministros irão avaliar se realmente há indícios do crime de corrupção passiva, já que um dos argumentos da defesa de Temer é de que o suposto recebimento de propina teria ocorrido antes do mandato depresidente.

Ontem, a Polícia Federal confirmou o recebimento do áudio e das perguntas das partes. Salientou, entretanto, que o gravador não foi entregue, motivo pelo qual um ofício foi enviado à PGR. Não há prazo estipulado para a conclusão do trabalho pericial.

Na hipótese da perícia não ser finalizada até quarta-feira, os ministros do Supremo discutem se é realmente necessária a interrupção do inquérito até que isso aconteça, uma vez que a análise das gravações faz parte do próprio processo investigatório. No despacho em que autoriza a instauração do inquérito, Fachin argumenta que a fase ainda é de apurações, não recaindo, por ora, qualquer responsabilização sobre o presidente da República.

A linha é parecida com a defendida pela PGR. A equipe de Rodrigo Janot sustenta que o inquérito serve justamente para averiguar os fatos narrados, não podendo ser interpretado como condenação antecipada do presidente a das autoridades citadas.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4259, 20/05/2017. Política, p. A7.