Empresas de energia e petróleo temem pelo andamento da agenda do setor

André Ramalho, Rodrigo Polito, Cláudia Schüffner e Camila Maia

23/05/2017

 

 

As incertezas trazidas pela crise política têm deixado as indústrias de óleo e gás e de energia elétrica apreensivas quanto à retomada de investimentos no país e das agendas que estavam em andamento. Entre as petroleiras, a percepção é que o calendário de leilões anunciado pela atual gestão do Ministério de Minas e Energia (MME) reacendeu o ânimo pelo Brasil, mas que a crise institucional podem prejudicar o trâmite da extensão do Repetro (regime aduaneiro especial do setor de óleo e gás), de acordo com fontes consultadas pelo Valor.

A prorrogação do Repetro preocupa porque depende da articulação entre diferentes frentes do governo, como o MME, Fazenda (incluindo a Receita Federal) e a assinatura do próprio presidente Michel Temer. Executivos consideram pouco provável que as medidas já anunciadas pelo governo, como o calendário de leilões e a redução dos índices de conteúdo local, sejam revogadas numa eventual saída de Temer. Na avaliação das fontes, porém, os leilões deste ano têm "pouca chance de êxito" sem a extensão do Repetro.

"O Brasil voltou a entrar no centro das atenções das grandes companhias mundiais. Acredito que as mudanças regulatórias vieram para ficar e que o pré-sal é atrativo, mas a não renovação do Repetro, antes dos leilões, isso sim, afugentaria investimentos", destaca o presidente de uma petroleira com atuação no pré-sal brasileiro.

O presidente de uma multinacional da cadeia fornecedora de óleo e gás reiterou que a extensão do regime especial é uma "condição sine qua non" para que as petroleiras assumam compromissos de investimentos no longo prazo.

Uma fonte de uma petroleira multinacional citou, ainda, que os executivos da empresa no Brasil têm mantido contato constante com a matriz, mas "nada muito diferente" da atenção que o país tem despertado desde as primeiras articulações em torno do impeachment da ex-presidente Dilma Roussef, em 2015.

A percepção entre executivos é que, independente do governo, o Brasil precisa dos leilões deste ano para reduzir seu déficit fiscal. A expectativa de arrecadação só com os dois leilões de partilha do pré-sal é de R$ 7,75 bilhões.

O diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Décio Oddone, disse que os próximos leilões já estão autorizados pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), e que a ANP tem mecanismos legais para conduzir os processos.

"A situação particular do Brasil, a recessão brasileira, por exemplo, e o ritmo de crescimento da economia têm muito pouco impacto nos planos das companhias. Elas [petroleiras] não vão explorar petróleo para atender o mercado brasileiro, a dinâmica desse mercado é outra, e isso tudo afasta um pouco o investidor do petróleo dessa crise", ponderou Oddone, que cumpriu agenda com investidores na semana passada, em Londres.

Já no setor de energia, a preocupação gira em torno da medida provisória da reforma do setor elétrico, que estava em elaboração no ministério. Entre as elétricas, é praticamente consenso que uma saída do ministro Fernando Coelho Filho do MME neste momento poderia significar uma descontinuidade na política setorial. O ministro é elogiado pelo setor por tentar solucionar problemas complexos, como o déficit de geração hídrica das geradoras, a sobrecontratação das distribuidoras e a inadimplência na liquidação do mercado e curto prazo de energia.

Para André Dorf, presidente da CPFL Energia, o setor fez avanços "monumentais" nos últimos meses e, independentemente da permanência de Coelho Filho no comando da pasta, é preciso manter a agenda de curto e longo prazo. "O setor fez um enorme avanço, pela primeira vez temos diálogo totalmente aberto com a equipe, secretários, presidentes de estatais, empresa de planejamento", disse.

Coelho participou ontem de reunião com representantes de associações do setor elétrico, e embora uma fonte tenha avaliado que ele não indicou definição sobre sua permanência, o presidente da Abraceel (associação das comercializadoras), Reginaldo Medeiros, afirmou que o ministro disse que vai ficar no cargo enquanto o presidente Temer permanecer, independentemente da decisão de seu partido, o PSB. Segundo ele, o ministro disse que permanecerá até que se decida a questão da presidência. "O mais importante é a direção que ele [ministro] tem dado para o setor, com muito diálogo", afirmou Medeiros, acrescentando que o encontro, com 20 associações, foi em um astral positivo, de continuidade dos trabalhos.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4260, 23/05/2017. Brasil, p. A2.