Lei da Repatriação entra na mira da Operação Lava Jato

Luiz Vassallo, Julia Affonso e Fausto Macedo

05/05/2017

 

 

Na 40ª fase, força-tarefa prende ex-gerente da Petrobrás, suspeito de resgatar dinheiro sujo do exterior por meio da nova legislação

 

 

Um ex-gerente da Petrobrás é suspeito de ter usado a Lei da Repatriação para lavar dinheiro oriundo do pagamento de propina. De acordo com investigadores da Operação Lava Jato, será preciso “abrir a caixa-preta” do programa federal, que, em janeiro do ano passado, permitiu a brasileiros declarar bens até então ocultos no exterior.

Deflagrada ontem, a Operação Asfixia – 40.ª fase da forçatarefa – prendeu temporariamente os ex-gerentes da estatal Márcio de Almeida Ferreira e Maurício de Oliveira Guedes e preventivamente os empresários Paulo Roberto Gomes Fernandes e Marivaldo do Rozário Escalfoni. Em São Paulo, Minas e Rio, foram cumpridos cinco mandados de condução coercitiva e 16 de busca e apreensão.

O grupo é suspeito de ter desviado R$ 100 milhões em contratos da Diretoria de Gás e Energia da Petrobrás. Segundo os investigadores de Curitiba, dinheiro em espécie era operado em empresas de fachada. Além de apontar a “ousadia” de Ferreira de usar o programa federal, a força-tarefa identificou que o esquema perdurou até julho de 2016. Um dos pré-requisitos da repatriação era que o patrimônio não poderia ter origem ilícita.

“Isso vai além da anistia da sonegação fiscal e da evasão de divisas que o governo permitiu com a repatriação. Isso é legalizar a corrupção. Precisamos abrir a caixa-preta da Lei da Repatriação”, afirmou o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima. “Nada garante que tenhamos hoje, realmente, uma empresa limpa de toda a corrupção.” O procurador Diogo Castor Mattos afirmou que os investigados “esquentaram” dinheiro de origem de propina. Ferreira, por exemplo, tinha patrimônio de R$ 7 milhões no Brasil e R$ 48 milhões no exterior. “Em tese, essas pessoas estão com recursos lícitos, o que gera um risco à sociedade. Isso gera uma nova linha de investigação. A Lava Jato deve abrir a caixa-preta dessa lei de regularização cambial e verificar de que forma está se dando esse procedimento”, afirmou.

Explicação. Na decisão em que autorizou a operação, o juiz federal Sérgio Moro destacou que Ferreira recolheu R$ 14 milhões em tributos e multas no dia 5 de dezembro do ano passado para regularizar os recursos depositados em uma offshore nas Bahamas. Em 2013, porém, o patrimônio era de R$ 8,7 milhões. Para Moro, “não há explicação para esse salto, nem mesmo nas declarações retificadas”. Nenhum dos detidos trabalha mais na Petrobrás. “Eles continuavam a receber mesmo após suas saídas, como se tivessem um saldo de propinas a receber”, disse a delegada federal Renata da Silva Domingues.

O esquema. Os contratos investigados foram firmados com a Petrobrás pelas companhias Liderroll e Akyzo, suspeitas de atuar como empresas de fachada, e envolveram R$ 5 bilhões em obras como o Gasoduto Campinas-Rio, Terminal de Angra dos Reis e Terminal de Regaseificação Baía da Guanabara, entre outras. Os investigados responderão por corrupção, fraude em licitações, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. / COLABOROU JULIO CESAR LIMA, ESPECIAL PARA O ESTADO

 

PARA ENTENDER

Regra recolhe 30% do valor

Promulgada pela então presidente Dilma Rousseff no dia 13 de janeiro de 2016, a Lei 13.254 criou o regime especial de repatriação de recursos de brasileiros no exterior não declarados à Receita Federal. Pela norma, quem opta por fazer a declaração voluntária de recursos paga 30% sobre o valor, sendo 15% de multa e 15% de Imposto de Renda. Segundo dados da Receita, o programa gerou arrecadação de R$ 50,9 bilhões de impostos e multas pagos pelos contribuintes, no ano passado. Os ativos não declarados no exterior chegavam a R$ 169,9 bilhões e mais de 25 mil pessoas aderiram.

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Receita vai cortar benefício de ex-gerente da Petrobrás

 Adriana Fernandes

 

05/05/2017

 

 

Órgão federal também fará pente-fino para identificar contribuinte que repatriou dinheiro sujo por meio de lei

 

 

 

A Receita Federal vai excluir do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) o ex-gerente da Petrobrás que aderiu ao programa de repatriação para legalizar dinheiro de propina de corrupção. Os auditores da Receita estão trabalhando na identificação dos contribuintes que aderiram ao programa para repatriação de dinheiro sujo. Todo o contribuinte optante do programa que não comprovar a origem lícita de recursos será excluído da repatriação e ficará exposto à sanção tributária e penal. Quando a Receita identifica a prova do ilícito, é efetuada a exclusão.

Os processos de revisão serão efetuados pontualmente, sobretudo após o encerramento da segunda fase da repatriação quando haverá uma consolidação dos dados. “Se o recurso é ilícito, o contribuinte é excluído. Não há como regularizar recursos oriundos da corrupção”, explicou uma fonte da área econômica.

O Estado apurou que esse pente-fino não impede a análise de casos individuais identificados durante as investigações da Operação Lava Jato. Na 40.ª fase, deflagrada ontem, a Polícia Federal prendeu dois ex-gerentes da Diretoria de Gás e Energia da Petrobrás suspeitos de receber mais de R$ 100 milhões em propinas de empreiteiras que mantinham contratos com a petrolífera. Segundo os investigadores, os valores eram operados por meio de dinheiro em espécie e empresas de fachada.

Batizada de Asfixia, essa etapa da Lava Jato identificou que um dos ex-gerente da Petrobrás aderiu, em 2016, ao programa para regularizar o dinheiro da corrupção. Os procedimentos de verificação das informações prestadas à Receita serão objeto de análise com base em gestão de risco.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45125, 05/05/2017. Política, p. A6.