CATARINA ALENCASTRO
CRISTIANE JUNGBLUT
“É preciso apurar o envolvimento do presidente Temer no suposto recebimento de R$ 500 mil”
Sergio Zveiter
Deputado Federal
Ao proferir seu voto, o relator disse que há indícios suficientes “de autoria e materialidade” para o recebimento da denúncia. Zveiter ressaltou que a Câmara faz uma avaliação política, mas também analisa o aspecto jurídico.
— Por ora, temos indícios que são, por si só, suficientes para ensejar o recebimento da denúncia. Estamos diante de indícios suficientes de materialidade. Não é fantasiosa a acusação, é o que temos e deve ser investigada — disse o deputado Sergio Zveiter, concluindo adiante. — Tenho convicção de que o arquivamento sumário das graves acusações feitas pela Procuradoria-Geral da República e das graves revelações feitas no inquérito, sem que sejam devidamente aprofundadas, não restabeleceria ao governo o vigor necessário para sairmos desta crise.
Após o voto do relator, o advogado de Temer, Antônio Mariz de Oliveira, atacou a denúncia e o relatório do peemedebista. Um pedido de vista coletivo adiou para amanhã a retomada do debate, quando os membros da comissão poderão se revezar para defender a autorização ou arquivamento da denúncia. Agora, aliados de Temer apostam nos votos em separado que serão apresentados. Há a expectativa de que pelo menos três pareceres contra o recebimento da denúncia sejam apresentados. E já há candidatos para apadrinhar esses relatórios: Fausto Pinato (PP-SP), Lelo Coimbra (PMDB-ES) e Hildo Rocha (PMDB-MA).
Com as trocas de integrantes já efetivadas, em sua maior parte dentro de partidos do centrão — PMDB, PR, PTB, SD, PSD e PRB —, o governo diz contabilizar pelo menos 38 dos 66 votos. São necessários 34 para barrar o relatório a favor da denúncia.
‘IN DUBIO, PRO SOCIETATE’
Enquanto a oposição promete esgotar as mais de 40 horas previstas para o debate, o governo vai orientar brevidade no falatório dos aliados. Temer quer encerrar o assunto na comissão na sexta-feira, a tempo de o processo ser votado também pelo plenário antes do recesso legislativo, que começa na semana que vem. A interlocutores, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deu sinais de que, se não fechar o trâmite na CCJ ainda esta semana, acha difícil votar no plenário antes do recesso. Cabe a ele decidir sobre isso. Maia tem dito que só vai colocar a matéria em votação se houver 342 deputados em plenário. Em cenário difícil, já que, no recesso, os parlamentares costumam viajar.
Zveiter já vinha indicando que votaria a favor da denúncia, pois acentuou que prepararia um documento de forma independente e em consonância com os preceitos jurídicos. Advogado de formação, o deputado presidiu por dois mandatos a Ordem dos Advogados do Brasil no Rio. Ao justificar seu parecer, Zveiter disse depois da sessão que votou de acordo com sua consciência, como deputado eleito “livremente”.
Durante 59 minutos, o relator justificou seu voto. Nesse período, recorreu reiteradamente ao princípio do in dubio, pro societate (do latim: na dúvida, em prol da sociedade). Ele explicou que, na análise penal, quando se trata da fase de investigação, inverte-se o princípio de in dubio pro reu (na dúvida, em favor do réu). Ele também tentou desconstruir um dos principais argumentos da defesa, de que as provas da denúncia — os áudios gravados pelo dono da JBS, Joesley Batista — foram conseguidos de forma ilícita e, por isso, deveriam ser desprezados. O relator afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF) vem convalidando escutas ambientais feitas sem conhecimento do outro há 20 anos.
— Em determinada fase do processo penal, como o oferecimento da denúncia, o princípio do in dubio pro societat nos ensina que deve-se inverter a lógica de que a dúvida deve favorecer o réu. Em havendo dúvida e havendo indícios mínimos, devemos deferir o pedido de autorização. Não podemos mais ignorar o papel da sociedade e o direito de defesa desta — votou Zveiter.
TRECHOS DO RELATÓRIO
JUÍZO POLÍTICO:
“A Câmara dos Deputados realiza um juízo predominantemente político de admissibilidade da acusação, enquanto compete ao Supremo Tribunal Federal um juízo técnico- jurídico. O juízo político a ser efetivado pela Câmara dos Deputados deve preceder à análise jurídica por parte do Supremo Tribunal Federal”.
AUTORIZAÇÃO:
“Por ora, o que temos são indícios de autoria, o que, a meu sentir, enseja o deferimento de autorização”.
R$ 500 MIL:
“É preciso apurar o envolvimento do presidente Temer no suposto recebimento de R$ 500 mil, com envolvimento do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, também denunciado no mesmo inquérito que o presidente. Outro indício!”
ABISMO.
“Impedir o avanço das investigações e seu devido julgamento seria ampliar perigosamente o abismo entre a sociedade e as instituições”.
GRAVAÇÕES.
“O STF já decidiu desde 1997 (...) que é licita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro”.
‘INDÍCIOS SÉRIOS’.
“Da gravação é preciso descortinar se o seu conteúdo, e os diálogos que ela contém, são verídicos, para que possam se transformar em provas concretas. Por ora temos indícios, que são sérios o suficiente para ensejar o recebimento da denúncia”.
O globo, n.30654 , 11/07/2017. PAÍS, p. 3