UTC DEVE PAGAR R$ 574 MILHÕES EM LENIÊNCIA

Renata Mariz

11/07/2017

 

 

Empreiteira, a primeira que fecha acordo com a União, terá 22 anos para ressarcir prejuízos

 

A Advocacia-Geral da União (AGU) e o Ministério da Transparência e Controladoria Geral da União (CGU) deram à UTC Engenharia, em acordo de leniência fechado ontem, 22 anos de prazo para pagar R$ 574 milhões como ressarcimento aos cofres públicos por fraudes praticadas em licitações de Petrobras, Eletrobras e Valec. É a primeira empresa investigada na Operação Lava-Jato a fechar leniência com o governo federal.

O dono da UTC, Ricardo Pessoa, foi afastado da direção da empresa em função do acordo, que prevê o desligamento ou afastamento de dirigentes envolvidos nas irregularidades. Os termos da leniência fechada pela construtora com o governo se referem a 29 contratos públicos obtidos de forma ilícita, incluindo o de Angra 3.

Dos R$ 574 milhões definidos no acordo, R$ 110 milhões representam o dano causado pela construtora com práticas como pagamento de propina, cerca de R$ 400 milhões se referem a 70% do lucro auferido com os contratos irregulares e o restante é decorrente da multa aplicada com base na Lei Anticorrupção.

Entre os benefícios obtidos pela empresa com o acordo está o desconto no valor da multa e dos lucros obtidos por meio de irregularidades que terão de ser devolvidos. A contratação com a administração pública federal ainda depende, na prática, de aval do Tribunal de Contas da União (TCU), que havia declarado a UTC inidônea por conta de fraudes em Angra 3. A construtora está liberada para participar de licitações com estados e municípios.

 

EM PARALELO, ACORDOS COM O MPF

O acordo da UTC é o primeiro fechado com o governo federal, permitindo que a empresa possa voltar a participar de licitações. Até agora, empreiteiras como Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez já tinham fechado acordos com o Ministério Público Federal, ficando livres de ações penais, mas sem a garantia da retomada do direito de contratação pelo governo federal. O salvo conduto para voltar a disputar concorrências do Poder Executivo só vem após o aval do próprio governo. AGU e CGU são os órgãos com poder para fazer essas negociações. O Tribunal de Contas da União também precisa ser consultado.

As empresas que fecharam acordo com MPF já procuraram o governo para também negociar novos acordos de leniência com o Executivo. Os processos tramitam em sigilo. O da UTC era o mais avançado e se tornou o primeiro a ser fechado. Segundo a CGU, em breve um segundo acordo pode ser fechado. O nome da empreiteira ainda não foi revelado.

Os ministros da AGU, Grace Mendonça, e da CGU, Wagner Rosário, negaram qualquer conflito com o TCU, onde prevalece o entendimento de que é preciso uma espécie de autorização da corte de Contas para todas as fases dos acordos de leniência com o governo federal. No entanto, Grace assinalou que a lei estabelece apenas que se dê ciência ao TCU da negociação dos acordos, o que, segundo ela, foi feito.

— Se o TCU eventualmente questionar uma outra outra cláusula, nós estaremos preparados para os esclarecimentos devidos, porque temos a plena convicção que esse acordo de leniência foi celebrado com bases sólidas — afirmou a ministra.

Os valores e o prazo de pagamento foram defendidos por Grace e Rosário. Eles disseram que a capacidade de pagamento da empresa e os danos confessados e apurados pelo quadro técnico do governo serviram de base para chegar aos termos. Grace assinalou que a correção da dívida será feita pela taxa Selic, o que resultaria num pagamento de R$ 3,1 bilhões ao fim dos 22 anos.

— Qualquer valor cobrado a mais ou num prazo menor praticamente poderia inviabilizar o acordo — disse Rosário.

Uma das cláusulas da leniência prevê, no entanto, que a UTC poderá adiantar os pagamentos se tiver condições financeiras. Para isso, foi estabelecida como parâmetro a receita bruta da construtora.

O globo, n.30654 , 11/07/2017. PAÍS, p. 6