Aécio tentou barrar Lava-Jato, diz PGR

André Guilherme Vieira

24/05/2017

 

 

Ao requerer a prisão preventiva do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), o procurador-geral da República Rodrigo Janot afirmou que o tucano é um dos "protagonistas" da estratégia para barrar a Lava-Jato, e mencionou telefonemas do parlamentar com os também senadores Romero Jucá (PMDB-RR) e José Serra (PSDB-SP), interceptados pela Polícia Federal (PF) com autorização judicial.

No pedido de prisão feito ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), Janot diz que "Aécio Neves fala que a estratégia para justificar a aprovação do projeto de abuso de autoridade é usar os supostos erros da Operação Carne Fraca [que investiga as indicações políticas de fiscais para o Ministério da Agricultura], escondendo o real objetivo de que, de fato, seria para impedir ou embaraçar a 'Operação Lava-Jato'".

Para Janot, Aécio "se apresenta como um dos protagonistas dessa estratégia [parar a Lava-Jato], afirmando que, nesta agenda, 'estou mergulhado nisso, minha vida é isso, minha vida virou um inferno'''.

No entendimento do procurador-geral da República, "o relato dessa estratégia coincide com aquela discutida entre Romero Jucá e o colaborador Sergio Machado, em março de 2016, em conversa a respeito de um grande acordo envolvendo o PSDB, o PMDB e o próprio PT para barrar a Lava-Jato". Machado foi diretor da Transpetro indicado por Renan Calheiros (PMDB-AL), segundo a Lava-Jato. Ele gravou vários políticos do PMDB, como o próprio Renan e Jucá, além do ex-presidente José Sarney (PMDB-MA).

No documento, é transcrita ligação telefônica que Aécio Neves fez a Jucá no dia 13 de abril deste ano. De acordo com Janot, "de forma dissimulada", ambos tratam da "junção de esforços de vários políticos para colocar um limite na Operação Lava-Jato".

No telefonema, o tucano e o pemedebista falam em marcar uma reunião com outros parlamentares. Jucá diz que o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) chega à Brasília na semana seguinte e Aécio conta que esteve com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) no dia anterior.

"Também eu acho que é agora ou nunca, né?", pergunta Aécio. "Não, (...) passou do limite, p..., já devia ter sido", responde Jucá.

"Agora vamos discutir tudo isso, né? Tá? É importante", indaga Jucá, ao que Aécio responde: "Você vê... mas vê condições?". Jucá responde afirmativamente.

"Também vejo", diz Aécio. "Também acho que... essa forma como está sendo feito isso aí... essa banalização da política", fala o tucano. "Vejo...vejo... é", responde Jucá.

Em outra ligação telefônica, de 19 de abril de 2017, Aécio e o senador e ex-ministro das Relações Exteriores de Temer, José Serra (PSDB-SP), "tratam da necessidade de se colocar um ministro da Justiça forte" no governo, segundo Janot. O ministro da Justiça é o chefe da Polícia Federal (PF), que é subordinada ao Executivo.

A escuta telefônica autorizada pelo ministro Fachin mostra Serra ligando para Aécio. "Deixa eu te falar uma coisa, cara. Eu tô preocupado... olhando do ponto de vista macro [econômico] né? Da política, eu acho que precisa ter um ministro da Justiça forte, viu Aécio?", diz José Serra.

"Eu também acho, sempre achei", responde Aécio.

Serra então diz achar que o nome para ocupar a Pasta não precisa ser da área. "Alguém como o [Raul] Jungmann [atual ministro da Defesa] daria, entende? Bem assessorado, tal. O fato é que tem que por alguém com força. Não para fazer nada arbitrário, mas para que as coisas tenham um caminho, né? De desenvolvimento, de tudo".

Aécio então pede a Serra "vamos falar pessoalmente, tá bom?".

Serra insiste. "É. Mas se você tiver oportunidade, sem mencionar que eu te falei, porque eu tinha ficado de falar com ele [Michel Temer]. Podia mencionar isso para o presidente", sugere.

Serra então repete que "precisa ter um ministro forte".

Aécio concorda; Serra fala que o atual ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR) "foi um bom deputado, acho mesmo... pode ir para outro ministério, tal, mas as condições iniciais [para o ministério da Justiça] ele não teve".

O senador afastado volta a pedir para que os dois conversem pessoalmente, e diz "tá entendido".

Serra indaga se Aécio concorda com a ideia e o senador mineiro diz que sim, "há muito tempo já".

Em nota, José Serra disse que tem "numerosas conversas sobre política diariamente" e que não se lembra "dessa conversa rápida com o senador Aécio Neves".

Ainda segundo Serra, "em todo caso, conforme se verifica nos diálogos transcritos, nada que não fosse republicano foi tratado. Pelo contrário, há até uma ressalva de que a sugestão se deu sob o ponto de vista exclusivamente político".

Procurada, a assessoria de Romero Jucá não respondeu até o fechamento desta edição.

Em vídeo postado ontem na internet por sua assessoria, Aécio disse que "errou por se deixar envolver em uma trama montada por um criminoso".

Na manifestação a Fachin, Janot conclui, comparando a conversa de Aécio com Joesley Batista (gravada pelo empresário) e o telefonema do senador mineiro com Serra, que "vê-se que a 'firmeza' que se espera do ministro da Justiça é no sentido de colocar um freio de arrumação na Polícia Federal".

Janot diz que a ligação de Serra demonstra "a grande proximidade entre o senador Aécio Neves e o presidente Michel Temer, maior ainda do que a mantida entre este e José Serra, em que pese ter sido ministro na sua gestão".

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4261, 24/05/2017. Política, p. A7.