MAIS IMPOSTOS E MENOS GASTOS

MARTHA BECK

GERALDA DOCA

21/07/2017

 

 

Para cobrir rombo, governo aumenta tributos sobre combustíveis e corta R$ 5,9 bi em despesas

O forte aumento nas alíquotas do PIS/Cofins de gasolina, etanol e diesel, que renderá uma arrecadação de R$ 10,4 bilhões este ano, não foi suficiente para cobrir o rombo das contas públicas. A equipe econômica anunciou ontem que, além de elevar imediatamente a carga tributária dos combustíveis, fará um contingenciamento adicional de R$ 5,9 bilhões no Orçamento de 2017 para assegurar o cumprimento da meta fiscal, de déficit primário de R$ 139 bilhões, ou 2,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Juntas, as medidas somam R$ 16,3 bilhões.

— Elas (as medidas) são necessárias pela queda da arrecadação em função da recessão, que afetou o resultado das empresas e do setor financeiro e refletiu os prejuízos acumulados nos últimos dois anos. As medidas fazem com que o mais importante seja preservado, que é o ajuste e a garantia de que teremos uma trajetória de crescimento. O Brasil vai recuperar o crescimento no segundo semestre, e já vemos uma queda do desemprego — disse ontem o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para justificar o aperto extra.

O governo relutou em aumentar impostos, especialmente em um momento de baixa popularidade e fragilização política do presidente Michel Temer. Porém, diante do rombo, não viu outra alternativa. O Orçamento já está contingenciado em R$ 39 bilhões. Com a tesourada adicional, o aperto subirá para quase R$ 45 bilhões, o que impacta fortemente os investimentos e prejudica a prestação de serviços públicos. Esse valor corresponde, aproximadamente, a um Bolsa Família e meio, conforme o orçamento do programa previsto para este ano, de quase R$ 30 bilhões. Por falta de dinheiro, já houve atraso na emissão de passaportes e prejuízo no funcionamento de agências do INSS.

 

RECEITAS EXTRAS

Assim, a única forma de fechar as contas sem comprometer a meta fiscal era buscar receitas extras. E como a inflação está sob controle, há espaço para que o aumento dos combustíveis ocorra sem prejudicar a política monetária. Segundo um interlocutor do Planalto, Meirelles chegou a sugerir ao presidente subir outros tributos para reforçar as contas e evitar cortes adicionais, mas Temer aceitou elevar apenas o PIS/Cofins sobre combustíveis porque este setor está tendo queda nos preços.

A alíquota para gasolina subirá de R$ 0,3816 para R$ 0,7925 por litro, uma alta de R$ 0,41, que dará uma receita extra de R$ 5,191 bilhões. No caso do diesel, o aumento será de R$ 0,2480 para R$ 0,4615 por litro (R$ 0,21), com arrecadação de R$ 3,962 bilhões. Para o etanol, haverá aumentos diferenciados para produtores e distribuidores. No primeiro grupo, a alíquota do PIS/Cofins subirá de R$ 0,12 para R$ 0,1309, dando uma arrecadação adicional de R$ 114,9 milhões. Já para os distribuidores, ela sairá de zero para R$ 0,1964, o que garantirá um reforço adicional de R$ 1,152 bilhão aos cofres públicos. O aumento foi criticado pelas principais federações das indústrias.

 

‘CORTOU NO LIMITE, NO OSSO’

Pelas contas do governo, o aumento do PIS/Cofins, cujo decreto deve ser publicado hoje no Diário Oficial, deve resultar em uma alta de 7% para os consumidores. O ajuste nos tributos terá um impacto na inflação que, segundo especialistas, será de 0,5 ponto percentual.

O governo também chegou a debater se seria o caso de mudar a meta fiscal do ano para permitir um rombo maior nas contas públicas diante da forte queda na arrecadação. No entanto, a conclusão foi que uma alteração do compromisso fiscal seria um retrocesso em termos de credibilidade, contou uma fonte.

— Cortou no limite, no osso. Mas o governo tem que trabalhar com o que tem. Se a arrecadação melhorar nos próximos meses, poderá haver alguma flexibilização. Tudo vai depender do fluxo de receitas — comentou um assessor do Planalto.

Por meio de nota, os ministérios do Planejamento e da Fazenda fizeram questão de informar que o novo contingenciamento é temporário e será compensado “por receitas extraordinárias que ocorrerão ainda este ano”.

Segundo interlocutores da equipe econômica, o governo tentou até o último minuto não cortar despesas, especialmente porque vários ministérios estão com pagamentos atrasados e reclamam da falta de recursos. Para isso, havia a previsão de incluir no novo relatório de avaliação fiscal, que será apresentado hoje, algumas receitas não tributárias, como depósitos judiciais da Caixa Econômica, que renderão R$ 2 bilhões. Isso, no entanto, não foi possível por questões técnicas. No caso da Caixa, o banco tem que fazer uma auditoria nos valores antes que eles possam ser usados pelo governo.

— O governo tentou colocar esses valores no relatório, mas não foi possível. Assim que forem liberados, os valores vão permitir a liberação do contingenciamento — disse um técnico.

Sobre o aumento do PIS/Cofins, Fazenda e Planejamento informaram que ele é “absolutamente necessário tendo em vista a preservação do ajuste fiscal e a manutenção da trajetória de recuperação da economia brasileira”.

O globo, n.30664 , 21/07/2017.ECONOMIA, p. 19